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Com cheiro de sertão e de livros

Como o filho de um vaqueiro e uma costureira transformou-se em um dos principais editores Brasil

Plinio começou sua trajetória na Perspectiva – Imagem: Cecília Bastos/USP Imagens
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“Biografia ou história de vida?”, pergunta-se, no início de Plinio Martins Filho, Editor de Seu Tempo, Ulisses Capozzoli. Jornalista e doutor em Ciência pela USP, Capozzoli, ao mesmo tempo que carrega em si a ideia de procedimento científico, viu-se, como biógrafo, diante de uma vida que se encaixa à perfeição no conceito de jornada do herói.

E foi assim, por essas duas trilhas, a do rigor da pesquisa e a da emoção das trajetórias humanas, que se ergueu esta narrativa sobre o universo editorial e sobre Plinio Martins Filho, integrante do panteão dos editores brasileiros.

O livro, na primeira parte, remete ao estilo memorialístico de Pedro Nava, no qual cheiros, sabores ou uma mera caligrafia são descritos com vagar a paciência. Aqui, é como se o relato espelhasse o sertão de onde veio o personagem.

Plinio nasceu em 1951, numa fazenda de Goiás, em uma família de sete filhos. Viveu no campo até a mãe tomar coragem de migrar para a cidade em busca do que, para ela, era a herança a ser deixada: o estudo.

O relato abriga a história da urbanização e da ocupação do Brasil Central, na década de 1970, e da luta que era, para as famílias de origem rural, manter os filhos na escola. Nas primeiras cem páginas da biografia é difícil intuir como aquele jovem, filho de um vaqueiro e de uma costureira, se tornará o famoso editor. A virada se dá quando seu irmão mais velho deixa uma cidade-satélite do Distrito Federal para ir trabalhar no depósito da Editora Perspectiva, de Jacó Ginsburg, em São Paulo. Não demora para que Plinio consiga uma vaga no mesmo depósito.

PLINIO MARTINS FILHO, EDITOR DO SEU TEMPO. Ulisses Capozzoli. WMF Martins Fontes (352 págs., 119,90 reais) – Compre na Amazon

“Plinio Martins Filho chegou em São Paulo em fevereiro de 1971, com 20 anos e o primeiro ano colegial. Achou a cidade “muito feia” e teve dificuldade para se localizar”, descreve o autor. Plinio passou fome, frio, dormiu pouco e mal e viveu em cortiço. A narrativa, no entanto, não dá mais ênfase a isso do que, por exemplo, aos encantos do ofício tipográfico, da composição a quente ou ao trabalho de preparação de texto.

A trajetória do funcionário do depósito que passou à revisão enquanto tentava concluir o Ensino Médio – sofrendo debruçado sobre os enigmas de Derrida e Bourdieu – e tornou-se gerente de produção da Perspectiva, diretor da Edusp e fundador da Ateliê Editorial é espantosa.

Ela não sombreia, porém, a outra história narrada nesse fascinante volume: aquela da produção dos livros. Esse universo inclui outros editores, autores e dezenas de profissionais que buscam, juntos, e não sem desacertos, tornar disponível para cada um de nós no mundo esse objeto que deve ser, nas palavras de Plinio, “bom e, simultaneamente, belo”. •

Publicado na edição n° 1289 de CartaCapital, em 13 de dezembro de 2023.

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