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DPU aponta redução de direitos de povos tradicionais e pede a revogação de decreto de Zema
O governo do estado criou condicionantes para que indígenas e quilombolas sejam consultados, indo contra o previsto na Constituição Federal e em Convenção da OIT


A Defensoria Pública da União manifestou repúdio ao decreto do estado de Minas Gerais que cria novas condições para que os povos indígenas, quilombolas e as comunidades tradicionais participem de Consulta Prévia, Livre e Informada em casos de projetos de licenciamento ambiental.
Um dos artigos do novo decreto estabelece que o licenciamento ambiental no estado de Minas Gerais ensejará a realização de CPLI quando afetar, na data de sua formalização, povos indígenas, comunidades quilombolas ou demais povos e comunidades tradicionais.
A DPU destacou que o texto busca uma forma de regulamentar a CPLI de maneira restritiva, na contramão do que prevê a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho, ratificada pelo Brasil em 2002. O texto determina que os povos indígenas e comunidades tradicionais devem ser consultados de forma livre, prévia e informada sempre que medidas legislativas ou administrativas possam afetá-los diretamente.
“O objetivo é garantir a participação efetiva desses grupos em decisões que impactem suas terras, culturas e modos de vida, respeitando suas especificidades socioculturais e assegurando que suas vozes sejam ouvidas e consideradas”, destacou o órgão.
Para além da restrição do direito à consulta, a DPU elencou outras críticas do decreto, tais como:
- usurpação de competência da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, ao retirar do órgão a responsabilidade de coordenar a CLPI em processos que afetam povos indígenas, o que contraria a legislação federal;
- dispensa indevida da CLPI, ao considerar que a consulta não precisa ser realizada em áreas urbanas consolidadas ou quando as comunidades já tenham sido consultadas anteriormente, o que não possui respaldo legal e viola o princípio de consulta a cada nova medida que possa afetá-las;
- falta de clareza nos procedimentos, uma vez que o decreto apresenta ambiguidades sobre os procedimentos para comprovar a realização da CLPI, gerando insegurança jurídica;
- responsabilidade indevida ao empreendedor, atribuindo ao próprio empreendedor a condução da consulta em projetos da iniciativa privada, o que pode comprometer a imparcialidade e pressionar as comunidades afetadas.
Em manifestação publicada nesta quarta-feira 18, a DPU solicita a imediata revogação do Decreto, pelo entendimento de que o normativo apresenta inconsistências e irregularidades frente à Constituição Federal e à Convenção nº 169 da OIT.
“É dever do Estado proteger e valorizar a diversidade étnica que marca o Brasil, considerando a contribuição desses povos para o processo civilizatório nacional”, registraram , em nota, a defensora nacional de direitos humanos, Carolina Castelliano, juntamente com os defensores Célio Alexandre John, Diana Freitas de Andrade, Raphael Santoro, João Márcio Simões e Carlos Maia Fonseca.
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