CartaCapital
Fim de governo/ A hora da xepa
Bolsonaro acelera nomeações de aliados e dá consulado a auxiliar de Michelle


O capitão segue recluso e em silêncio, mas ainda está com a caneta na mão e corre para nomear aliados na administração federal antes de desocupar o Palácio do Planalto. Jair Bolsonaro acaba de designar, por exemplo, o ministro da Secretaria de Governo, Célio Faria Junior, e o advogado João Henrique Nascimento de Freitas, chefe de sua Assessoria Especial, para integrar a Comissão de Ética Pública da Presidência. Com mandato de três anos, eles vão fiscalizar a gestão de Lula e não podem ser demitidos pelo novo presidente.
Bolsonaro indicou ainda sete diretores e cinco ouvidores de agências reguladoras, como a Anatel (telecomunicações) e Aneel (energia elétrica), além de nomear diplomatas bolsonaristas para embaixadas e consulados estratégicos. Após costurar um acordo com líderes do Senado, a quem cabe referendar as nomeações, o PT conseguiu barrar os embaixadores apontados para Argentina, Itália e Vaticano. Mas o vice-consulado em Orlando deve mesmo ser entregue a Marcela Braga, assessora da primeira-dama Michelle Bolsonaro. Recentemente, ela foi promovida pela atual cúpula do Itamaraty, passando à frente de colegas mais experientes. Até 31 de dezembro, a caneta do capitão pode causar muitos estragos.
Sem lenço nem documento
O Supremo Tribunal Federal determinou o cancelamento do passaporte do blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, que vive nos EUA, foragido da Justiça brasileira. Sem o documento, ele terá dificuldades para deixar o território norte-americano e dar entrada em processos burocráticos no país. Em caso de flagrante, pode, inclusive, ser deportado para o Brasil. Investigado em dois inquéritos conduzidos pelo STF, o das milícias digitais e o da organização de atos antidemocráticos, Santos teve a prisão preventiva decretada pelo ministro Alexandre de Moraes em outubro do ano passado. O Ministério das Relações Exteriores confirmou, na segunda-feira 21, ter recebido o ofício da Corte.
Paraná/ Contabilidade lavajatista
Parecer técnico do TRE recomenda reprovação de contas de Moro
O ex-juiz não esclareceu as inconsistências identificadas – Imagem: Agência PT
No início de novembro, a área técnica do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná apontou uma série de irregularidades nas contas de campanha de Sergio Moro, senador eleito pelo União Brasil. À época, o ex-juiz prometeu complementar a documentação e aclarar as inconsistências. Agora, em parecer conclusivo, Christiana Tosin Mercer, da Seção de Contas Eleitorais da Corte, e Paulo Sérgio Esteves, da Coordenadoria de Contas Eleitorais e Partidárias, recomendam a reprovação das contas.
Entre as irregularidades mantidas no parecer figuram divergências entre os valores de despesas declaradas e os que constam em notas fiscais, gastos com agências de viagem em data posterior ao fim da eleição e pagamentos sem instrumento contratual ou por valores superiores ao contratado por atividades de militância e mobilização nas ruas.
A campanha de Moro arrecadou 5,1 milhões de reais, a maior parte proveniente do fundo partidário. Os maiores gastos foram com um escritório de advocacia, 800 mil reais, e com táxi aéreo, 426 mil. Responsável pela derrocada da Operação Lava Jato, por conta de sua atuação inquisitorial e à margem da lei, Moro parece não estar mesmo acostumado a prestar contas de seus atos.
Obituário 1/ Lutadora infatigável
Hebe de Bonafini, líder das Mães da Praça de Maio, morre aos 93 anos
A ativista seguiu atuante mesmo após o fim da ditadura – Imagem: Laura Szenkierman/Tecnópolis Argentina
Hebe de Bonafini, a histórica líder das Mães da Praça de Maio, associação de mulheres criada para denunciar os crimes da ditadura que governou a Argentina de 1976 a 1983, faleceu no domingo 20, aos 93 anos. Ao decretar luto oficial de três dias, o presidente Alberto Fernández despediu-se com “profunda dor e respeito da lutadora incansável pelos direitos humanos”. O papa Francisco também manifestou pesar pela morte da ativista. “Com sua audácia e sua coragem, nos momentos em que o silêncio prevalecia, impeliu e depois manteve viva a busca da verdade, da memória e da justiça”, escreveu o pontífice.
Com dois filhos e uma nora desaparecidos nos anos de chumbo, Bonafini foi uma das fundadoras do famoso grupo de mães que, em 1977, começou a se reunir na Praça de Maio, diante da sede de governo em Buenos Aires, para exigir informações sobre o paradeiro de seus familiares. Com o decorrer do tempo, elas passaram a se identificar com um lenço branco na cabeça, que rapidamente virou um poderoso símbolo da organização. Mesmo após a queda do ditador Reynaldo Bignone, a entidade seguiu ativa, na exitosa luta pelo restabelecimento da verdade e pela punição dos agentes da repressão. Bonafini tornou-se, ainda, uma das mais mordazes críticas do neoliberalismo no país.
A despedida do Gigante Gentil
O cantor e compositor Erasmo Carlos morreu na terça-feira 22, aos 81 anos. Pioneiro do rock no Brasil e um dos ícones da Jovem Guarda, estava internado no Hospital Barra D’Or, no Rio de Janeiro, parar tratar uma paniculite, inflamação da camada de gordura embaixo da pele, agravada por uma sepse de origem cutânea. Ao longo da trajetória musical de 50 anos, o Tremendão, como ficou conhecido, compôs mais de 500 canções, várias delas em parceria com Roberto Carlos, a exemplo dos hits Além do Horizonte e É Preciso Saber Viver. Em seu círculo de amizade mais próximo, também era chamado de Gigante Gentil, um apelido literal, conquistado pela afetividade e pela estatura de 1,93 metro. Cinco dias antes de falecer, ganhou o Grammy Latino de “Melhor Álbum de Rock ou de Música Alternativa em Língua Portuguesa”, com O Futuro Pertence à… Jovem Guarda. Bem ao seu modo, dedicou o prêmio aos fãs.
Obituário 2/ A voz de uma certa Cuba
Pablo Milanés morreu na terça-feira 22, na Espanha
O artista, de 79 anos, teve fortes laços com a música brasileira – Imagem: Redes sociais
O cubano Pablo Milanés, morto aos 79 anos, esta semana, em Madri, tornou-se conhecido no Brasil, sobretudo, pela forte proximidade que tivera com artistas da MPB ao longo das décadas de 1970 e 1980. Uma das canções de Milanés tornadas mais famosas por aqui foi Yolanda, adaptada para o português por Chico Buarque e cantada em duo, por ambos, em 1983, no Canecão. No ano seguinte, a música seria gravada por Simone.
Milanés, cujo talento fora descoberto quando ele tinha apenas 6 anos, em um concurso radiofônico em Havana, foi um dos mais célebres integrantes do movimento Nueva Trova, que reunia músicos que apoiavam o regime de Fidel Castro e incorporavam a suas letras temáticas sociais e políticas.
E foi justamente a política que o aproximou de Chico, Milton Nascimento, Fagner e Diana Pequeno. Com Milton, ele gravou, no álbum Clube da Esquina 2 (1978), a célebre Canción por la Unidad Latino-Americana. Fagner, por sua vez, gravara Años (1978) em parceria com Mercedes Sosa. Em 1984, viria o álbum Pablo Milanés ao Vivo no Brasil, com canções dele próprio e de compositores brasileiros.
PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1236 DE CARTACAPITAL, EM 30 DE NOVEMBRO DE 2022.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “A Semana”
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