O modelo de produção capitalista, voltado ao lucro, é oposto à lógica de igualdade social. Neste cenário, quase sempre são os movimentos sociais que atuam como única reação ao sistema de exploração humana, buscando a promoção de direitos que, quando não espontâneos, são frutos das lutas sociais.
Foram as péssimas condições de trabalho e a ausência de direitos no pós-revolução industrial europeu o ponto de partida para que os trabalhadores passassem a entender a importância da movimentação coletiva para a busca e a realização de direitos comuns. Já no Brasil, a resposta aos movimentos de luta de trabalhadores ganhou um contorno paternal e voltado à resolução de conflitos entre patrão e empregado, mas sem se aprofundar na responsabilidade social que as instituições do Estado haveriam de ter.
Cabe analisar, nesse sentido, o papel da Justiça do Trabalho.
Ao traçar um percurso histórico de sua atuação, é possível observar um perfil ambivalente e camaleônico da Justiça do Trabalho perante a defesa dos trabalhadores, transformando-se de acordo com a conjuntura política brasileira e atendendo às finalidades socioeconômicas de seu tempo.
Criado pela Constituição Varguista de 1934, o então “Judiciário” Trabalhista buscava acalmar os ânimos do movimento sindical em formação, impondo uma conciliação entre as classes pela coerção estatal. Daí surge uma das características que apenas viria a ser abolida pelo Constituinte de 1988: a formação paritária.
Veja-se que a sua instituição e o controle pelo Poder Administrativo são paralelos à criação dos sindicatos, também relegados ao reconhecimento e legitimidade unicamente pela chancela do Ministério do Trabalho – prática obrigatória até a presente data.
Nesse sentido, o contexto embrionário da Justiça Laboral visou atender aos anseios patronais, primando pela conciliação de interesses antagônicos e, ao mesmo tempo, fragilizando as reivindicações populares, sobretudo as sindicais.
Por outro lado, a Justiça do Trabalho passou a representar, paulatinamente, um meio de solução de controvérsias legítimo, respondendo também às demandas oriundas dos movimentos sociais para a melhoria da condição social da classe trabalhadora – algo que somente cresceu a partir da Constituição cidadã.
Com a progressão do neoliberalismo global, bem como diante do consequente desmonte da Consolidação das Leis do Trabalho, o órgão passou a se ver numa função contraposta à originalmente idealizada, freando as tendências ultraconservadoras do Legislativo e impondo restrições ao cerceamento de direitos – inclusive aqueles que objetivavam a própria extinção desta Justiça.
Os últimos anos, marcados pelo desmonte de direitos sociais e crises, provocaram novos questionamentos sobre o protagonismo da Justiça do Trabalho e dos movimentos de luta no cenário de empobrecimento e precarização das relações laborais do capitalismo tecnológico.
Certamente, as próximas décadas marcarão novos e aprofundados desafios aos movimentos sociais de trabalhadores, exigindo não apenas uma pauta, mas, sobretudo, uma estrutura consolidada – inclusive jurídica – que garanta resistência e pressão sobre o Estado Democrático e suas instituições.
Portanto, tão importante quanto as lutas que estão por vir, será o caminho que a Justiça do Trabalho irá trilhar na defesa dos direitos sociais.
Para proteger e incentivar discussões produtivas, os comentários são exclusivos para assinantes de CartaCapital.
Já é assinante? Faça login