Justiça

A importância da construção de redes de defesa da classe trabalhadora

Articulação de defesa de direitos trabalhistas resultou em vitórias importantes no STF recentemente

Trabalhadores da Ford participam de um protesto em frente à fábrica da Ford em Camaçari, na Bahia, Brasil (Foto: RAFAEL MARTINS/AFP)
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O Supremo Tribunal Federal decidiu, na última quarta-feira (20), que pessoas juridicamente pobres não terão que arcar com as despesas processuais, periciais e advocatícias caso percam ações trabalhistas. A Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.677, proposta pela Procuradoria-Geral da República em 2018, buscava o reconhecimento de que as alterações relativas à gratuidade da justiça trazidas pela Reforma Trabalhista estavam em contrariedade à Constituição Federal.

A deformação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) foi um dos principais projetos de retirada dos direitos da classe trabalhadora brasileira aprovados – a toque de caixa – durante o governo de Michel Temer, que prometia “modernizar o trabalho”. Após quatro anos da Reforma, o Brasil chegou a pior taxa de desemprego em 30 anos, contrariando todas as promessas de modernização defendidas pela classe idealizadora de tais mudanças.

Evidentemente, a contraofensiva vem demandando o mesmo nível de articulação, que conta com a construção dos movimentos sociais e de entidades representativas de vários setores que defendem os direitos trabalhistas e sociais. Associações vinculadas à magistratura, à advocacia e ao operariado vêm se posicionando firmemente na luta institucional, impondo presença imprescindível em espaços áridos e pouco afeitos aos tantos argumentos e dados constantemente apresentados.

A Rede Lado surge dessa necessidade de engrossar o caldo jurídico para a luta desde o golpe de estado em 2016: ao conectar mais de vinte escritórios de advocacia trabalhista sindical, profissionais que defendem os direitos sociais declaram que tem um LADO nessa batalha, que é o da trabalhadora e do trabalhador.

O judiciário trabalhista enfrenta, a duras penas, as mudanças feitas pelo capital e com ele a classe trabalhadora, que se viu cada dia mais desamparada pelas instituições ditas democráticas. José Eymard Loguercio, sócio da LBS Advogados e integrante da Rede Lado, ainda em 2018, sustentou no Supremo Tribunal Federal: “se o trabalhador entrar na justiça apenas quando tiver certeza de que irá ganhar, então não é justiça do trabalho”.

Entre a toga e a tribuna, Eymard, representando a Central Única dos Trabalhadores, nesse episódio atuante como “amiga da corte” (amicus curiae), evidencia a presença de toda uma coletividade que então se fez ser ouvida e, hoje, atendida.

É fato que o julgamento da ADI 5.677 inaugura uma vitória em tempos tão amargos. Por 6 votos a 4, o STF reconheceu que a Justiça, para que assim continue sendo chamada, não pode, a um só tempo, declarar a insuficiência financeira de uma pessoa e condená-la a arcar com os custos decorrentes de eventual perda do processo. Parece simples chegar a tal conclusão, mas à classe trabalhadora custou mais de três anos e muita construção coletiva para que se resgatasse o mínimo dos direitos, que é lutar por justiça.

Na reforma, afirmou-se que eram necessários tais dispositivos para que se diminuíssem as ações trabalhistas, dando o entendimento de que os trabalhadores entrariam na justiça apenas para tentar a sorte em “aventuras judiciais”.  Em nota, o escritório Mauro Menezes, integrante da Rede Lado, afirma: “se há muitas demandas na Justiça do Trabalho, com toda a subjetividade que essa premissa carrega, não é por ausência de estímulos à boa-fé processual, mas pela existência de grandes empregadores que violam, de modo contumaz, os direitos de quem já é desprovido de recursos”.

Inconstitucionais, os artigos 790-B, caput e § 4º, e 791-A, § 4º derrubados agora pelo STF, são fruto da luta coletiva de várias entidades sindicais, da magistratura e principalmente da classe trabalhadora, que tem de ser defendida, já que a lei nada mais deve ser do que uma garantia de direitos à sociedade e não à exclusão dos atores sociais que são os trabalhadores e trabalhadoras.

Em nome da “ponte para o futuro”, criou-se a promessa de mais empregos e mais rentabilidade. Hoje, temos um país faminto, com quase 15% de desempregados e mais de 600 mil mortos pela Covid-19.  A retomada dos direitos sociais e do trabalho como cerne principal da melhoria da qualidade de vida dos brasileiros deve ser o objetivo maior a ser alcançado. Somente a luta coletiva e a construção conjunta com os trabalhadores e as trabalhadoras podem nos levar ao outro lado.

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