Justiça
A importância da construção de redes de defesa da classe trabalhadora
Articulação de defesa de direitos trabalhistas resultou em vitórias importantes no STF recentemente
O Supremo Tribunal Federal decidiu, na última quarta-feira (20), que pessoas juridicamente pobres não terão que arcar com as despesas processuais, periciais e advocatícias caso percam ações trabalhistas. A Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.677, proposta pela Procuradoria-Geral da República em 2018, buscava o reconhecimento de que as alterações relativas à gratuidade da justiça trazidas pela Reforma Trabalhista estavam em contrariedade à Constituição Federal.
A deformação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) foi um dos principais projetos de retirada dos direitos da classe trabalhadora brasileira aprovados – a toque de caixa – durante o governo de Michel Temer, que prometia “modernizar o trabalho”. Após quatro anos da Reforma, o Brasil chegou a pior taxa de desemprego em 30 anos, contrariando todas as promessas de modernização defendidas pela classe idealizadora de tais mudanças.
Evidentemente, a contraofensiva vem demandando o mesmo nível de articulação, que conta com a construção dos movimentos sociais e de entidades representativas de vários setores que defendem os direitos trabalhistas e sociais. Associações vinculadas à magistratura, à advocacia e ao operariado vêm se posicionando firmemente na luta institucional, impondo presença imprescindível em espaços áridos e pouco afeitos aos tantos argumentos e dados constantemente apresentados.
A Rede Lado surge dessa necessidade de engrossar o caldo jurídico para a luta desde o golpe de estado em 2016: ao conectar mais de vinte escritórios de advocacia trabalhista sindical, profissionais que defendem os direitos sociais declaram que tem um LADO nessa batalha, que é o da trabalhadora e do trabalhador.
O judiciário trabalhista enfrenta, a duras penas, as mudanças feitas pelo capital e com ele a classe trabalhadora, que se viu cada dia mais desamparada pelas instituições ditas democráticas. José Eymard Loguercio, sócio da LBS Advogados e integrante da Rede Lado, ainda em 2018, sustentou no Supremo Tribunal Federal: “se o trabalhador entrar na justiça apenas quando tiver certeza de que irá ganhar, então não é justiça do trabalho”.
Entre a toga e a tribuna, Eymard, representando a Central Única dos Trabalhadores, nesse episódio atuante como “amiga da corte” (amicus curiae), evidencia a presença de toda uma coletividade que então se fez ser ouvida e, hoje, atendida.
É fato que o julgamento da ADI 5.677 inaugura uma vitória em tempos tão amargos. Por 6 votos a 4, o STF reconheceu que a Justiça, para que assim continue sendo chamada, não pode, a um só tempo, declarar a insuficiência financeira de uma pessoa e condená-la a arcar com os custos decorrentes de eventual perda do processo. Parece simples chegar a tal conclusão, mas à classe trabalhadora custou mais de três anos e muita construção coletiva para que se resgatasse o mínimo dos direitos, que é lutar por justiça.
Na reforma, afirmou-se que eram necessários tais dispositivos para que se diminuíssem as ações trabalhistas, dando o entendimento de que os trabalhadores entrariam na justiça apenas para tentar a sorte em “aventuras judiciais”. Em nota, o escritório Mauro Menezes, integrante da Rede Lado, afirma: “se há muitas demandas na Justiça do Trabalho, com toda a subjetividade que essa premissa carrega, não é por ausência de estímulos à boa-fé processual, mas pela existência de grandes empregadores que violam, de modo contumaz, os direitos de quem já é desprovido de recursos”.
Inconstitucionais, os artigos 790-B, caput e § 4º, e 791-A, § 4º derrubados agora pelo STF, são fruto da luta coletiva de várias entidades sindicais, da magistratura e principalmente da classe trabalhadora, que tem de ser defendida, já que a lei nada mais deve ser do que uma garantia de direitos à sociedade e não à exclusão dos atores sociais que são os trabalhadores e trabalhadoras.
Em nome da “ponte para o futuro”, criou-se a promessa de mais empregos e mais rentabilidade. Hoje, temos um país faminto, com quase 15% de desempregados e mais de 600 mil mortos pela Covid-19. A retomada dos direitos sociais e do trabalho como cerne principal da melhoria da qualidade de vida dos brasileiros deve ser o objetivo maior a ser alcançado. Somente a luta coletiva e a construção conjunta com os trabalhadores e as trabalhadoras podem nos levar ao outro lado.
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