Diálogos da Fé

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As igrejas e o enfrentamento da violência sexual e de gênero

É hora de superar tabus e romper o silêncio que beneficia os abusos

Marcha das Mulheres Negras (Foto: ABr)
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Nesta semana em que o Dia Internacional da Mulher, 8 de março, é recordado, não como data celebrativa, mas como oportunidade de reafirmar a causa da justiça de gênero, reproduzo neste espaço a Declaração sobre violência sexual e baseada em gênero e o Prêmio Nobel da Paz 2018, publicada em novembro passado pelo Conselho Mundial de Igrejas.

Ela é importante afirmação sobre a dimensão cristã da justiça que deve ser feita às mulheres e um chamado ao enfrentamento da violência sexual e de gênero. Seguem destaques do texto (tradução livre).

Não há judeu nem grego, escravo ou livre, homem ou mulher, pois todos são UM em Cristo Jesus (Gálatas 3.28).

(…) O objetivo desta declaração é um chamado do CMI para novos compromissos e contribuições para dar fim, prevenir e responder à violência sexual e de gênero.

Este apelo para abordar a violência sexual e de gênero baseia-se nos resultados de uma recente Consulta que marcou o 20º aniversário da Década Ecumênica das Igrejas em Solidariedade com as Mulheres (1988-1998), realizada em Kingston, Jamaica, de 1º a 6 de outubro de 2018.

Também se inspira na concessão do Prêmio Nobel da Paz de 2018 ao Dr. Denis Mukwege e à Sra. Nadia Murad, cujo trabalho incorpora as mesmas questões que foram enfatizadas na consulta e abordadas durante a própria Década Ecumênica.

Ao ouvirmos os testemunhos dolorosos e as histórias inspiradoras de mulheres sobreviventes de relações sexuais e de violência baseada em gênero, somos encorajados e desafiados a afirmar a dignidade, os direitos e as necessidades de todas as mulheres, crianças e outros que são vulneráveis – ou tornados vulneráveis – a tal violência.

Leia também: "Os direitos das mulheres são os primeiros a serem negociados, sempre"

Reconhecemos que a violência sexual e de gênero é evidente em muitos contextos diferentes e frequentemente ocultados, incluindo abuso conjugal e “casamento infantil”, e que os seus riscos e impactos são compostos por estigma, discriminação racial, divisões socioeconômicas, pobreza, abuso, conflito armado e falta de acesso a cuidados de saúde reprodutiva de qualidade.

Questões relacionadas ao comportamento sexual humano e às relações de gênero dentro da família são tabus em muitas igrejas e em comunidades de igrejas, impedindo-as de serem um lugar seguro e de proteção para mulheres vítimas ou ameaçadas de violência sexual e de gênero. A Igreja deve contribuir ativamente para a eliminação de tal violência e abuso.

A meta 5.3 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU pede a erradicação do “casamento infantil” e da mutilação genital feminina até 2030.

Estima-se que 20 milhões de meninas e mulheres ainda não têm acesso à educação abrangente em saúde sexual e reprodutiva e a serviços.

Prêmio Nobel

É imperativo que a Igreja, em parceria com a sociedade civil, parceiros governamentais e intergovernamentais, tomem as medidas necessárias para quebrar a cultura do silêncio e abordar as questões que impactam mulheres e meninas, famílias e comunidades no mundo.

Leia também: O islã, em sua origem e fundamentos, é contra a opressão às mulheres

O Prêmio Nobel da Paz de 2018 concedido a Denis Mukwege e Nadia Murad é um encorajamento para todos aqueles que trabalham para acabar com o uso da violência sexual como arma de guerra.

Denis Mukwege é um médico que ajudou milhares de vítimas de violência sexual na República Democrática do Congo e condenou o uso da violência sexual contra as mulheres como estratégia e arma de guerra.

Nadia Murad é uma sobrevivente de crimes de guerra que foi sequestrada, repetidamente violentada e abusada pelo chamado “Estado Islâmico”, combatentes que atacaram sua comunidade Yazidi no norte do Iraque em 2014 com intento genocida.

Desde que escapou, ela fala sobre sua experiência e se tornou a primeira Embaixadora da Boa Vontade da ONU pela Dignidade dos Sobreviventes do Tráfico Humano em 2016.

(…) Recordamos a declaração pública de 2009 do CMI condenando a violência contra as mulheres na RDC, e reconhecemos o trabalho feito pelo CMI para promover a coesão social no Iraque e para promover e proteger os direitos das comunidades minoritárias religiosas nesse país.

(…) A Década das Igrejas em Solidariedade com as Mulheres levantou histórias semelhantes de violência sexual e baseada em gênero há 30 anos.

A realidade atual parece ainda mais brutal, com tantas meninas em campos de refugiados “casadas” como “proteção” contra a violência sexual; estupro e violência sexual continuando a ser usados como arma de guerra; tantas vidas perdidas ou arruinadas devido à discriminação baseada em gênero, raça, pobreza ou sexualidade humana; e instituições sociais e políticas – incluindo a Igreja – continuando a demonstrar misoginia, impunidade e discriminação, apesar das lutas duras de tantas pessoas por equidade e por libertação.

Portanto, o Comitê Executivo do CMI, reunido em Uppsala, Suécia, de 2 a 8 de novembro de 2018:

Insta as igrejas-membros do CMI e os parceiros ecumênicos a condenar ou reiterar sua condenação à violência sexual e de gênero e a qualquer forma de violência contra mulheres, crianças e pessoas vulneráveis; declarar tal violência um pecado; e empreender esforços construtivos para superar as atitudes que predispõem a tal violência (…).

A íntegra do documento pode ser acessada aqui.

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