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Ainda sobre a escalada de poder da Bancada Evangélica

A expansão se acelera a partir dos anos 2000 e do projeto político da Universal e da Assembleia de Deus

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No último artigo tentei responder à pergunta sobre a escalada de poder da Bancada Evangélica no Congresso, com um olhar sobre as articulações recentes que o construíram. Agora vamos recuperar a recente trajetória dos evangélicos que permitiu estas conjunções de poder político.

A referência para se abordar a consolidação da presença evangélica na política institucional no Brasil são as eleições para o Congresso Constituinte, em 1986. O marco para os evangélicos é o expressivo número de 32 parlamentares eleitos e a formação da primeira Bancada Evangélica da história.

Aquelas eleições se tornam ainda mais significativas se considerado o número total de evangélicos na Câmara Federal de 1933 (quando foi eleito o primeiro, o pastor metodista Guaracy Silveira) a 1985. Foram 50 nas nove legislaturas.

Os evangélicos pentecostais foram os responsáveis por esta guinada numérica: de três representantes nas legislaturas anteriores a 1987 passaram a ter 18 dos 32 eleitos para o Congresso Constituinte.

Depois de altos e baixos numéricos, decorrentes de casos de corrupção e fisiologismo nas legislaturas pós-Congresso Constituinte, a Bancada Evangélica se consolidou como força a partir dos anos 2000, chegando a alcançar 92 parlamentares (88 deputados e 4 senadores) em 2014. Nas eleições deste ano foram 94 (85 deputados e 9 senadores), sendo os pentecostais uma força hegemônica.

Esta potência se solidifica na última década e meia com base em alguns fatores:

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(1) Uma aproximação maior dos políticos evangélicos com o governo federal a partir do governo de Luís Inácio Lula da Silva, em 2002, dadas as alianças com partidos a que os religiosos estavam predominantemente ligados.

(2) Duas igrejas evangélicas concretizam, no período, projetos de ocupação da política institucional do País: as Assembleias de Deus e a Igreja Universal do Reino de Deus. Ambas passaram a ocupar, depois de 2003, espaços plenos de poder em partidos (respectivamente o PSC e o PRB) e maior quantidade de deputados e senadores no Congresso.

Conquistaram também cargos públicos, como as nomeações dos ministros de Dilma Rousseff, os bispos da IURD Marcelo Crivella (PRB, Pesca) e George Hilton (PRB, Esportes), e de Michel Temer, o bispo da IURD Marcos Pereira (PRB, Indústria, Comércio Exterior e Serviços) e Ronaldo Nogueira (PTB, Trabalho, AD).

Dois candidatos à Presidência da República, Marina Silva (2010, 2014 e 2018) e o Pastor Everaldo (2014), são vinculados à AD. A IURD conseguiu ainda eleger o bispo, senador e ex-ministro Marcelo Crivella como prefeito do Rio de Janeiro (2016). Estes elementos dão o tom da força política alcançada por estas duas denominações evangélicas.

(3) A partir de 2010, o tema dos direitos das mulheres e da população LGBTI passa a se destacar nas campanhas eleitorais e nos projetos debatidos no Congresso Nacional, com reações negativas entre políticos evangélicos.

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Em 2013, a nomeação do deputado Marco Feliciano para a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara culminou no revigoramento de campanhas por legislação pautada pela moralidade sexual religiosa, sob o rótulo “Defesa da Família Tradicional”, contra movimentos feministas e LGBTI, em aliança com a Bancada Católica.

Estas pautas encontram eco na população conservadora não-religiosa, e reforçam movimentos reacionários às conquistas de direitos alcançadas nas últimas duas décadas.

(4) As mídias passam a dar visibilidade e a alimentar as ênfases temáticas e as dinâmicas em torno das pautas sobre a moralidade sexual religiosa, com destaque na “guerra” entre políticos evangélicos e militantes de movimentos feministas e LGBTI. Estes temas ganham destaque em campanhas eleitorais e em discursos de lideranças das igrejas.

(5) A eleição do deputado federal evangélico Eduardo Cunha à presidência da Câmara dos Deputados, em 2015, representou um poder sem precedentes à Bancada Evangélica e facilitou tanto a defesa das pautas descritas acima quanto a abertura à concessão de privilégios a igrejas no espaço público.

(6) A Bancada Evangélica amplifica o poder político por meio de alianças com parlamentares e frentes conservadoras para a revisão de temas sociais como a redução da maioridade penal e o fim do Estatuto do Desarmamento.

A articulação denominada BBB (Bala/Segurança, Boi/Ruralista e Bíblia/Evangélica) tornou este processo visível assim como favoreceu o apoio de evangélicos à candidatura, e consequente vitória, do deputado Jair Bolsonaro, à presidência.

(7) O presidente recém-eleito foi o primeiro candidato com um discurso identificado como cristão, marcadamente evangélico. Neste contexto, a bancada evangélica se fortalece ainda mais como interlocutora do novo governo, conforme avaliado no artigo anterior.

Estes elementos compõem o quadro que hoje coloca os evangélicos como grupo religioso protagonista no processo político em curso no Brasil e chama a atenção para avaliações responsáveis de quem se preocupa com justiça na política.

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