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O não pagamento das bolsas CAPES não é fato isolado. É política do governo

Temos que nos mobilizar para garantir que os responsáveis pelo contingenciamento sejam denunciados, julgados e responsabilizados

A Capes é uma fundação ligada ao Ministério da Educação. Foto: Divulgação
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Por Camila D’Ottaviano

Inicio este texto explicando que escrevo a partir de três lugares distintos: como orientadora de Mestrado e Doutorado, como docente de um Programa de Pós-graduação da USP/Universidade de São Paulo e como presidente da ANPUR/Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional, associação que congrega 69 programas de pós-graduação nas áreas CAPES/Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior de Planejamento Urbano e Regional, Arquitetura e Urbanismo e Design, Geografia, Economia, Ciências Sociais e Interdisciplinar.

Como orientadora, posso garantir que o não pagamento das bolsas de meus orientandos (são três!) e seus colegas é fonte da mais absoluta indignação e sensação de impotência. Como ajudá-los? Que mobilização podemos fazer que surta efeito imediato? No Coletivo USP pela Democracia, colegas estão realizando contribuições individuais para auxiliar nossos pós-graduandos. Mas sabemos que isso sequer resolve as demandas urgentes. Somos poucos docentes e são muitos os estudantes sem bolsa. 

Como docente de um Programa de Pós-graduação da Universidade de São Paulo, já tivemos o posicionamento da Pró-reitoria de Pós-Graduação, que em conjunto com os pró-reitores das demais universidades estaduais paulistas – Unicamp e UNESP -, está em tratativas junto à CAPES para a retoma do pagamento das bolsas ainda neste mês de dezembro. Além disso, como uma primeira ação mitigadora, a Reitoria da USP acaba de garantir o oferecimento gratuito de café da manhã, almoço e jantar a todos os bolsistas CAPES nos restaurantes universitários.

Por outro lado, como presidente da ANPUR, tenho tido a possibilidade de acompanhar toda a mobilização e desdobramentos tanto junto aos nossos programas filiados quando junto às demais associações e articulações nacionais, em especial o FCHSSALLA/Fórum das Ciências Humanas, Sociais Aplicadas, Linguística, Letras e Artes e a SBPC/Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Gostaria de destacar que participei, representando a ANPUR na reunião do Grupo Temático de Ciência, Tecnologia e Inovação do Gabinete de Transição, realizada no último dia 25 de novembro de 2022. Na reunião, a proposta da ANPUR de iniciativa emergencial para os 100 primeiros dias de governo foi justamente o aumento do valor e da quantidade de bolsas de Mestrado e Doutorado, como indicação inequívoca da valorização do nosso Sistema Nacional de Pós-graduação.

A partir desse olhar mais abrangente e mesmo sem querer me estender, antes de tratar diretamente do não-pagamento das bolsas, é importante relembrar, ao menos em parte, os vários retrocessos e ações de má-fé que temos (docentes, estudantes, programas, associações) enfrentado junto à CAPES durante todo o desgoverno Bolsonaro (2019-2022).

Primeiro cabe lembrar que em abril de 2021 foi nomeada como presidente da CAPES a professora Claudia Queda de Toledo, professora sem qualquer experiência reconhecida com gestão de cursos de pós-graduação e sem qualquer relevância acadêmica. Pelo contrario, sua qualificação era ser dona de uma faculdade privada onde havia estudado o então Ministro da Educação Milton Ribeiro. Vale lembrar que o curso de pós-graduação em direito da referida faculdade tinha nota 3 da CAPES. 

Temos enfrentando problemas relativos às avaliações quadrienais dos programas de pós-graduação, congelamento dos valores das bolsas, e várias manifestações de desagravo da comunidade acadêmica, inclusive dos membros do Conselho Técnico Científico do Ensino Superior (CTC-ES).

No último mês de novembro foi feita a nomeação dos novos coordenadores de Áreas de Avaliação da CAPES (Portaria Nº 265, de 25 de novembro de 2022) após consulta realizada de forma urgente e com pouco tempo hábil para articulação entre os vários representantes. 

As indicações têm causado dois tipos de problema principais: vários dos indicados não foram os de fato escolhido por seus pares e alguns nomes, apesar da dita representação nacional, têm pouco experiência para coordenar uma Área de Avaliação CAPES. Em levantamento realizado pela ANPUR e também pelo FCHSSALLA identificamos vários indicados que não foram os mais votados. Apenas no âmbito das áreas de avaliação com representação na ANPUR, os indicados das áreas de Planejamento Urbano e Regional e de Geografia não foram mais votados. Já no caso da área de Arquitetura, Urbanismo e Design, o indicado é docente de programa de pós-graduação que possui apenas Mestrado Profissional, sem qualquer experiência em programas de Mestrado ou Doutorado Acadêmicos.

Existe neste momento um grande movimento no âmbito das áreas vinculas ao FCHSSALLA no sentido de questionar as indicações. Neste caso, no entanto, a solução é bastante simples: basta que os indicados tenham um posicionamento ético em relação ao coletivo e não aceitem as indicações, solicitando formalmente que os mais votados sejam os efetivamente indicados. Este é o posicionamento da diretoria da ANPUR.

Agora o cancelamento do pagamento das bolsas CAPES.

Neste momento, dia 08 de dezembro de 2022, o quadro de paralisia criminosa do governo federal é total e atinge todas as áreas essenciais: Educação, Saúde, programas sociais, pagamento de aposentadorias e pensões. As Universidades e Institutos Federais estão com suas contas bloqueadas, sem condições de pagar contas básicas, como água e luz. A título de exemplo: a Universidade Federal de Uberlândia (UFU) tinha ontem em sua conta corrente a inacreditável quantia de R$ 71,00. Isto mesmo: setenta e um reais, para pagar todas as contas do mês de dezembro, que incluem as bolsas de permanência estudantil, auxílio alimentação e auxílio transporte, para os estudantes de graduação e pós-graduação.

O não pagamento das bolsas de Pós-graduação pela CAPES não é fato isolado. É a política definida por um governo criminoso!

Temos que nos mobilizar para garantir que os responsáveis pelo contingenciamento sejam denunciados, julgados e responsabilizados enquanto agentes públicos.

Chega de impunidade.

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