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Destino nas urnas: como será o amanhã na Bolívia?

Força do MAS é mais do que um sinal de resistência do povo boliviano

Bolívia
Apoiadores de Luis Arce. Foto: Aizar Raldes/AFP Apoiadores de Luis Arce. Foto: Aizar Raldes/AFP
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* Renata Peixoto de Oliveira

Diante das mudanças políticas que afastaram a Onda Rosa na região e inauguraram um novo período marcado pela ascensão de governos conservadores de direita, a Bolívia parecia ser a exceção, o baluarte das experiências progressistas, bem-sucedidas, estáveis e legítimas. Um governo reconhecido internacionalmente pelos avanços de ordem socioeconômica e pelas mudanças proporcionadas por um ordenamento jurídico pautado no plurinacionalismo.

 

De repente, o cenário eleitoral de 2019, um ano já turbulento na América do Sul, parecia contradizer aquela imagem modelo. Ou sinalizar que a crise regional não poderia ser vista como reação à reconfiguração do neoliberalismo ou sua manutenção na região, e que, no caso da Bolívia, a queda de Evo Morales era sinal do esgotamento do bolivarianismo radical, isolando ainda mais a Venezuela na região Andina.

Logo, a busca por explicações e falhas que teriam levado ao desgaste do governo. O declive dos preços das commodities, a concentração política, o avanço de um modelo extrativista e a falta de renovação política foram alguns dos elementos apontados como responsáveis pelo fim da era Morales.

O episódio das eleições de 2019 pretendia dar o tom de qual seria o legado histórico do presidente do Movimiento Al Socialismo, a vergonhosa derrocada pela atestada e reconhecida tentativa de fraudar eleições para manter-se no poder, assim como seu regime corrupto e autoritário. Mas a saída de Morales gerou forte reação dos setores populares e, em especial, dos movimentos indígenas. O aparente verniz institucional não logrou êxito: a presidenta interina e outros personagens da direita, como Camacho, se tornaram uma triste caricatura da elite sedenta em retomar o poder.

O novo governo careceu de legitimidade, e a manobra política para a derrubada do projeto bolivariano evidenciou-se como um golpe.

Evo Morales acompanha desde o exílio a conformação de um novo pleito, o primeiro, desde 2006, sem a sua participação. Seu partido, o MAS, se preparou com Luis Arce, ex-ministro de seu governo para a disputa cujo principal adversário é o ex-presidente Carlos Mesa, de centro-direita e que disputou a eleição de 2019.

Os resultados sinalizam, desde a boca de urna até as primeiras contagens, que a vitória no primeiro turno será uma realidade.

O partido de Evo Morales segue forte, e o candidato apoiado pelo ex-presidente é o franco favorito para vencer as eleições, justamente quando se aproxima o aniversário daquele fatídico 20 de novembro.

Os desdobramentos da eleição anulada demonstram, de maneira evidente, que a direita boliviana sacrificou sua própria democracia para tentar emplacar, como em outros países, uma fórmula política que associa entreguismo, fanatismo religioso, liberalização econômica, associada a uma empreitada neocolonizadora, que no caso boliviano, significava restaurar o poder para uma elite pretensamente branca.

A força do MAS, quinze anos após aquela histórica vitória do ex-líder cocaleiro, é um sinal, não apenas da resistência do povo boliviano, que enfrentou até a truculência policial nos postos de votação em meio à pandemia para exercer seu direito ao voto, mas a resposta mais convincente para qualquer um que ainda se perguntasse: afinal, foi ou não foi golpe?

* Doutora em Ciência Política pela UFMG, professora do curso de Relações Internacionais e Integração e dos mestrados em Integração Contemporânea da América Latina (PPGICAL) e de Políticas Públicas e Desenvolvimento ( PPGPPD) da UNILA. É membro do grupo DALC-ALACIP e líder do grupo CESPI-América do SUL

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