Justiça

Prefeitura em Sergipe pagou R$ 220 mil por programa de videomonitoramento gratuito, diz CGU

A investigação ocorreu por determinação do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal

Prefeitura em Sergipe pagou R$ 220 mil por programa de videomonitoramento gratuito, diz CGU
Prefeitura em Sergipe pagou R$ 220 mil por programa de videomonitoramento gratuito, diz CGU
Foto: Reprodução/Controladoria-Geral da União
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A prefeitura de Itabaiana, no agreste sergipano, pagou 220 mil reais pela licença de um software de videomonitoramento que, na verdade, é gratuito, segundo documentação do próprio fabricante. A conclusão consta de relatório produzido por técnicos da Controladoria-Geral da União, ao qual CartaCapital teve acesso.

O pagamento foi feito no bojo de um convênio de cooperação técnica firmado com a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, com o objetivo de implantar um sistema de cercamento eletrônico no município (distante 56 km de Aracaju). 

A investigação da CGU ocorreu por determinação do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, que determinou que o órgão auditasse convênios de ONGs e entidades do terceiro setor custeados com emendas parlamentares. No caso sergipano, o arranjo foi bancado com 1 milhão de reais enviado pelo senador Alessandro Vieira (MDB) em 2021. O restante, 378 mil, saiu dos cofres municipais.

A empresa responsável pela implementação do sistema de monitoramento na cidade foi a Elisys Soluções Inteligentes e Ecológicas, com sede em Teresina (PI), que apresentou o menor preço no certame conduzido pela agência.

Entre os itens listados na proposta da Elisys estava o programa Uniview/Ezstation 3.0, utilizado para operar as câmeras do tipo PTZ, com indicativo de que se tratava de um software gratuito – a mesma informação disponível no site do seu fabricante. Mas, ainda assim, a prefeitura desembolsou 220 mil pela suposta licença. O uso do sistema foi constatado pelos técnicos da CGU durante uma vistoria na sala de operação da Guarda Civil Municipal.

Por meio de um ofício enviado aos auditores, a empresa argumentou que, embora exista uma versão gratuita do software, o valor gasto “refere-se à implantação completa de uma solução integrada, que extrapola a simples licença” do programa. Alegou ainda que “os serviços envolvidos na aquisição de software podem abranger instalação, treinamento e suporte, que são componentes essenciais para a entrega de um sistema funcional”.

No entanto, a CGU considerou que os custos de instalação e treinamento estavam previstos em outro item da licitação e concluiu ter havido “superfaturamento” na aquisição do software, uma vez que a empresa não “apresentou detalhes ou documentação sobre essa solução e os custos envolvidos” na formação do preço gasto.

A aquisição do programa ocorreu em 2022, sob a gestão de Adailton Sousa (Podemos). Hoje, a cidade é administrada por Valmir de Francisquinho (PL), que está no terceiro mandato e negocia sua filiação ao Podemos. 

A equipe da Controladoria também encontrou outro problema na execução dos recursos públicos. Isso porque o software de reconhecimento de placas automotivas Itscampro, da Pumatronix, contratado por 34 mil reais, não estava instalado nem operando no centro de videomonitoramento municipal. As câmeras OCR eram operadas por outro sistema – o Multiway/Sentry, também adquirido no mesmo pregão. Essa despesa também foi classificada como “superfaturamento” no relatório.

O acordo com a prefeitura de Itabaiana se deu na esteira do programa Cidades Inteligentes, uma iniciativa da ABDI voltada à implantação de tecnologias que a gestão pública em questões de segurança, mobilidade, gestão de tráfego, entre outros. Esse programa já havia sido implementado em outras cidades como Maceió (AL) e Campina Grande (PB) antes de chegar ao agreste de Sergipe.

Também há no documento críticas ao processo licitatório conduzido pela ABDI. Segundo a CGU, se a contratação tivesse ocorrido pelo critério de menor preço por item — e não por preço global — o custo total poderia ter sido reduzido quase pela metade, chegando a 618 mil, conforme os próprios valores apresentados pelas empresas concorrentes.

Outro lado

Procurada pela reportagem, a prefeitura de Itabaiana ainda não havia se manifestado. O espaço segue aberto. 

Já a ABDI explicou que o acordo foi firmado na gestão anterior do órgão (a agência era chefiada por Igor Calvet à época; Ricardo Cappeli é o atual presidente) e seguiu os princípios da administração pública, como moralidade, eficiência e economicidade. “A contratação observou o regramento próprio da ABDI, que é um serviço social autônomo e de direito privado, com práticas de mercado, razoabilidade dos valores, a competitividade do certame e a necessária compatibilidade entre o objeto contratado e a execução”, pontuou.

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