Política
Chefe da Funai sob Bolsonaro é condenado à prisão por coação de índigenas e servidores
A denúncia acusou Marcelo Xavier de abrir inquérito para pressionar pela liberação de megaempreendimento que atravessaria terra índigena


Marcelo Xavier, presidente da Fundação Nacional dos Povos Índigenas durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), foi condenado a dez anos de prisão por perseguir servidores do órgão e lideranças indígenas e pressionar pela liberação do Linhão de Tucuruí (RR). A sentença, assinada nesta quarta-feira 15 pelo juiz federal Thadeu José Piragibe Afonso, também determina o pagamento de multa e a perda de cargo público.
Delegado da Polícia Federal, Xavier recebeu a sentença em uma ação do Ministério Público Federal que o enquadrou no crime denunciação caluniosa. O caso envolve a suposta atuação dele na tentativa de destravar a licença ambiental para erguer uma rede de transmissão de energia de 122 quilômetros para ligar o estado de Roraima ao sistema nacional. O empreendimento atravessaria a reserva Waimiri Atroari, cuja população enfrentou um histórico de violência durante a construção da BR-174.
Em nota à reportagem, a defesa do ex-chefe da Funai afirmou ter recebido a decisão com “perplexidade e indignação”, por considerar que os atos de Xavier em sua gestão “basearam-se em estrito cumprimento do exercício legal” e visavam a “resguardar os interesses dos Waimiri-Atroari”. Além disso, disse confiar no Judiciário e prometeu questionar a sentença com recursos.
De acordo com a denúncia, Xavier articulou a abertura de um inquérito na PF contra funcionários e indígenas contrários ao empreendimento, em 2020. O procedimento foi posteriormente arquivado. Xavier, então, protocolou uma representação criminal na Procuradoria-Geral da República contra o procurador Igor Spínola, que havia tomado essa decisão.
Para o MPF, o ex-presidente da Funai agiu por motivações ideológicas e sem fundamentos reais. O juiz do caso afirma que essa atuação causou “danos concretos à reputação e à psique das vítimas, tanto individuais (servidores e procurador) quanto coletivos (povo Waimiri Atroari)”. Além do procurador, nove servidores da Funai e dois líderes de associações locais são apontados como vítimas de Xavier.
“O acusado se valeu do uso indevido do cargo de presidente da Funai e do fato de ser delegado federal e possuir acesso a informações de inteligência consideradas classificadas para determinar a instauração de inquérito policial como meio de intimidação contra servidores públicos que sabia inocentes“, sustentou Afonso, em decisão com mais de 60 páginas.
Marcelo Xavier esteve à frente da Funai entre 2019 e 2022. Ele também responde a outros processos sobre desmonte da Funai e foi indiciado pela PF sob suspeita de homicídio com dolo eventual (quando alguém não tem a intenção de atingir um resultado, mas assume esse risco) no caso dos assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips.
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