Justiça
Trama golpista: Moraes inicia voto e aponta a existência de organização criminosa liderada por Bolsonaro
O relator chamou a atenção para o tom de conversas de Ramagem e Bolsonaro: ‘não é uma mensagem de um delinquente do PCC para outro, é uma mensagem do diretor da Abin ao presidente’


O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, iniciou nesta terça-feira 9 seu voto no julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de aliados acusados de integrar o chamado núcleo crucial da trama golpista. O relator afirmou ser fundamental analisar o conjunto de condutas de uma organização criminosa sob a liderança de Bolsonaro, ativa de julho de 2021 até os atos golpistas de 8 de Janeiro de 2023.
Moraes, logo no início do voto, ressaltou que os crimes de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado Democrático de Direito são itens jurídicos distintos e autônomos. Enquanto o primeiro tem como alvo derrubar um governo legitimamente constituído, o segundo consiste em restringir, com grave ameaça, o funcionamento dos poderes da República e do sistema de freios e contrapesos.
O relator listou, em seguida, atos executórios praticados antes e depois das eleições de 2022, incluindo lives, entrevistas, a reunião ministerial de julho de 2022, a utilização das Forças Armadas para difundir desinformação sobre urnas eletrônicas, o monitoramento de autoridades, a elaboração da “minuta do golpe” e a apresentação do documento a comandantes militares. Também citou planos que previam sequestro e assassinato de autoridades, como o “Punhal Verde e Amarelo”, o “Copa 2022” e a “Operação Luneta”, além da tentativa de golpe em 8 de Janeiro.
Em sua exposição, com slides, Moraes apontou que a finalidade do grupo era “acabar com o sistema de freios e contrapesos, impedindo a ação do STF e da Justiça Eleitoral” e “jogar parcela da população contra a democracia”. O ministro destacou ainda a atuação da Abin, sob comando de Alexandre Ramagem, em operações de perseguição política e de descredibilização do sistema eleitoral.
Moraes, neste ponto, ironizou a defesa de Ramagem, que classificou memorandos de teor golpista como documentos de uso pessoal. “Uma espécie de diário, meu querido diário”, disse, lembrando que os textos eram redigidos em terceira pessoa e endereçados a Bolsonaro, além de fornecerem conteúdo usado em lives do então presidente.
O relator também mencionou a agenda do general Augusto Heleno, com anotações que incluíam ações contra o sistema eleitoral e até o código-fonte da Justiça Eleitoral. “Não é normal achar que um ministro de Estado tenha uma agenda golpista no século XXI”, afirmou.
Ao exibir mensagens enviadas por Ramagem a Bolsonaro, Moraes destacou a coincidência com falas públicas do ex-presidente. Em uma delas, Ramagem dizia que Bolsonaro havia vencido em 2018 no primeiro turno e que as urnas e os ministros do STF estavam “descredibilizados”. Neste trecho do julgamento, Moraes chamou a atenção para o tom das conversas: “Isso não é uma mensagem de um delinquente do PCC para outro, é uma mensagem do então diretor da Abin ao presidente da República”.
O julgamento prossegue na Primeira Turma do STF com o voto de Moraes, e ainda não há decisão sobre a condenação ou absolvição dos réus. Assista ao vivo:
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