Justiça
Kassio barra associação em processo sobre imposição de bíblias em bibliotecas públicas
Após Alexandre de Moraes liberar os autos, a Corte retomará o julgamento
O ministro Kassio Nunes Marques rejeitou o ingresso da Associação Movimento Brasil Laico no processo em que o Supremo Tribunal Federal decidirá se valida ou não a lei do Rio Grande do Norte que determina a inclusão da Bíblia nos acervos das bibliotecas públicas.
A entidade pediu para se juntar ao caso como amicus curiae (amigo da Corte). É uma expressão utilizada para designar uma terceira parte que ingressa no processo para fornecer subsídios ao julgador.
Kassio afirmou, porém, que não cabe a participação de amicus curiae após a liberação do caso para julgamento. A votação já começou, mas foi interrompida por um pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes — que liberou os autos nesta semana.
“Na espécie, o pedido de participação do amicus curiae é extemporâneo, porquanto posterior à liberação do feito para julgamento de mérito”, decidiu Kassio, relator da ação.
Moraes havia pedido mais tempo para estudar os autos em 7 de maio. A decisão ocorreu após o ministro Flávio Dino votar por validar a lei, desde que se respeite a inclusão de outras obras religiosas e se observe a razoabilidade na fixação do número de exemplares.
Ainda não há no sistema do STF uma data definida para a continuação da análise do caso, que ocorrerá no plenário virtual.
Kassio votou por considerar a lei inconstitucional e foi acompanhado por Moraes — que, apesar de votar, optou por interromper o julgamento.
“Ao Estado não compete privilegiar, interferir ou curvar-se aos dogmas de nenhuma denominação, mas, antes, franquear a todas, indistintamente, livre atuação”, sustentou Kassio. “A colaboração entre Estado e Igreja é, inclusive, desejável, desde que em favor do interesse público.”
Para Dino, porém, a lei do RN não exclui a disponibilização de outras obras consideradas sagradas, nem impõe a leitura da Bíblia. Ele considerou inconstitucional apenas o trecho que estabelece o mínimo de dez exemplares, quatro deles em braile.
“Fica fixado o número mínimo de 2 por biblioteca, sendo uma em Braile para atender às pessoas com deficiência”, propôs Dino em seu voto divergente. “Acresço a ressalva de que, obviamente, outros livros religiosos podem e devem ser adquiridos, não havendo exclusividade para a Bíblia Sagrada.”
Em casos semelhantes, o STF já endossou a vedação ao uso de recursos públicos para promover livros religiosos específicos em Mato Grosso do Sul, Amazonas e Rondônia.
Kassio reforçou a aplicação da conclusão do tribunal segundo a qual houve, nesses episódios, ofensa aos princípios de liberdade religiosa, isonomia e laicidade estatal.
A ação da Procuradoria-Geral da República chegou ao Supremo em 2015 — à época, quem chefiava o órgão era Rodrigo Janot. “O princípio da laicidade lhe impede de fazer, por atos administrativos, legislativos ou judiciais, juízos sobre o grau de correção e verdade de uma crença, ou de conceder tratamentos privilegiados de uma religiosidade em detrimento de outras”, diz a peça da PGR.
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