Justiça
Nova decisão de Dino reforça que Magnitsky contra Moraes não tem efeito imediato no Brasil
O ministro assinou mais um despacho nesta terça-feira 19 para tratar de ordens de tribunais internacionais


O ministro do Supremo Tribunal Federal Flávio Dino expediu, nesta terça-feira 19, uma nova decisão a fim de esclarecer seu despacho da véspera em que afastou a validade imediata de determinações judiciais, leis, decretos e ordens executivas de outros países.
Embora não tenha em momento algum mencionado a Lei Magnistsky, é devido a ela que Dino resolveu se pronunciar. Na segunda-feira 18, o ministro falou em “fortalecimento de ondas de imposição de força de algumas Nações sobre outras”. Segundo ele, “diferentes tipos de protecionismos e de neocolonialismos são utilizados contra os povos mais frágeis, sem diálogos bilaterais adequados ou submissão a instâncias supranacionais”.
No fim de julho, o governo de Donald Trump anunciou uma sanção contra o ministro Alexandre de Moraes com base na Magnistsky. Uma consequência prática seria o bloqueio de todos os bens ou investimentos do magistrado nos Estados Unidos — o que o Moraes, segundo informações preliminares, não possui.
Em 18 de julho, o Departamento de Estado já havia revogado o visto do ministro e de seus familiares. Um efeito indireto da Magnitsky, contudo, poderia ser o cancelamento de cartões de crédito de bandeira norte-americana. Isso depende de como as instituições financeiras no Brasil se dispõem a observar a ordem norte-americana — e de até onde a Casa Branca está disposta a avançar para fazer valer a retaliação.
Na decisão desta terça, Dino reforça que decisões de tribunais internacionais cuja jurisdição tenha sido reconhecida pelo Brasil continuam a ter efeito imediato no País. A ressalva da segunda-feira, explicou, fixa limites à eficácia de ordens emanadas de tribunais estrangeiros que exigem homologação ou adoção de cooperação internacional para produzirem consequências internas.
O argumento de Dino é que tribunais internacionais cujas competências já estão definidas em tratados incorporados ao direito brasileiro não se inserem no conceito de tribunais estrangeiros — estes seriam os órgãos do Judiciário de Estados estrangeiros, enquanto tribunais internacionais seriam instâncias supranacionais.
Um exemplo: em 2002, o Brasil reconheceu a competência da Corte Interamericana de Direitos Humanos para julgar casos de violações de direitos humanos ocorridas em seu território. O País ratificou a convenção sobre a jurisdição obrigatória na Corte e, portanto, não necessidade de homologar as decisões da Corte IDH para que elas tenham efeito jurídico no Brasil.
Diz o novo despacho: “Em relação aos aspectos atinentes a leis estrangeiras e demais atos jurídicos estrangeiros, nada há a adicionar a título de esclarecimento, permanecendo íntegra a decisão proferida em 18 de agosto”.
Ou seja: em relação à Lei Magnitsky, não há mudança. Conforme a conclusão de Dino, portanto, a sanção contra Moraes não tem validade automática no Brasil.
Dino assinou seus despachos no âmbito de uma ação do Instituto Brasileiro de Mineração que contesta a legalidade de municípios brasileiros ajuizarem processos no exterior em busca de indenização por danos causados no Brasil.
As ordens do relator valem para esse caso concreto, mas sua base se estende a todos os processos semelhantes.
Reação
Em postagens no X, a Embaixada norte-americana em Brasília e o Escritório de Assuntos do Hemisfério Ocidental reforçaram nesta segunda-feira o alcance das medidas contra Moraes e elevaram o tom contra aliados do juiz.
No texto, os representantes de Washington afirmam que Moraes é “tóxico para todas as empresas legítimas e indivíduos que buscam acesso aos Estados Unidos e seus mercados”.
As mensagens também rebatem de forma indireta a decisão de Dino. Segundo a nota, “nenhum tribunal estrangeiro pode anular as sanções impostas pelos EUA ou proteger alguém das severas consequências de descumpri-las”.
Leia a íntegra da decisão de Flávio Dino nesta terça-feira:
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