Justiça
Como Jair Bolsonaro quer controlar oposição mesmo preso domiciliarmente
O ex-presidente tem a autorização de receber poucos aliados e não pode falar ao telefone, mas visitas são estratégicas para definir pautas


Preso em casa desde 4 de agosto por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, Jair Bolsonaro (PL) mantém ativa a articulação política com seus aliados mais próximos. A medida, determinada após reiteradas violações de restrições judiciais, como uso indireto das redes sociais e contato com investigados, impôs ao ex-presidente um regime de isolamento rigoroso: ele não pode sair de casa, falar ao telefone, aparecer em fotos ou vídeos e só recebe visitas autorizadas previamente pelo STF.
Mesmo assim, Bolsonaro se tornou, nos últimos dias, o centro nervoso de uma operação política para reagir à própria prisão. Até a noite de 8 de agosto, ao menos 21 pedidos de visita haviam sido registrados no sistema da Corte. A maioria parte de deputados e senadores que lideraram o motim no Congresso Nacional, ocupando as mesas diretoras da Câmara e do Senado em protesto contra a decisão de Moraes.
O STF afirma que os pedidos são avaliados por ordem de chegada. Moraes já autorizou dez visitas, vetou uma – a do deputado Gustavo Gayer (PL-GO), investigado em inquérito ligado aos atos de 8 de Janeiro –, e ainda analisa os demais requerimentos. Entre os autorizados estão figuras centrais do bolsonarismo: o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que já esteve no endereço no Jardim Botânico no dia 7; os deputados Marcel van Hattem (Novo-RS), Marcelo Moraes (PL-RS), Zucco (PL-RS), Capitão Alden (PL-BA) e Júlia Zanatta (PL-SC), além da vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão (PP).
A movimentação coincide com a intensificação da crise política. Em 5 de agosto, os bolsonaristas ocuparam os plenários das duas Casas. O grupo pressiona os presidentes Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União-AP) a pautarem imediatamente o chamado “pacote da paz”, um conjunto de propostas que inclui:
- anistia ampla e irrestrita a todos os envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, incluindo o próprio Bolsonaro;
- impeachment do ministro Alexandre de Moraes;
- fim do foro privilegiado, medida que poderia transferir processos contra políticos, como o do ex-presidente, para a primeira instância.
A ocupação paralisou sessões ordinárias, gerou embates entre governistas e oposição e foi acompanhada de transmissões ao vivo, discursos inflamados e revezamentos nas cadeiras presidenciais.
Para aliados, as visitas a Bolsonaro têm dupla função: manter a moral da tropa alta e alinhar pessoalmente a estratégia de enfrentamento ao STF. Embora os pedidos sejam apresentados como “humanitários” ou “institucionais”, interlocutores reconhecem que, no contexto atual, qualquer conversa com o ex-presidente é carregada de significado político.
Mesmo sob vigilância judicial, Bolsonaro continua influenciando a agenda de seu grupo. Sua casa, no Jardim Botânico, começa a assumir ares de gabinete paralelo, um ponto de encontro reservado onde se planeja a resistência contra o Supremo e se discute o próximo passo da oposição.
No centro dessa articulação estão nomes que, do plenário do Congresso ao portão da residência do ex-presidente, operam para transformar a prisão domiciliar de Bolsonaro não em um freio, mas em um catalisador da crise institucional.
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