Justiça

Ramagem nega uso da Abin para espionar autoridades e diz que anotações sobre urnas eram ‘pessoais’

O deputado federal, ex-chefe da Abin, é o segundo réu da ação do golpe a ser interrogado no STF

Ramagem nega uso da Abin para espionar autoridades e diz que anotações sobre urnas eram ‘pessoais’
Ramagem nega uso da Abin para espionar autoridades e diz que anotações sobre urnas eram ‘pessoais’
Interrogatórios dos réus da Ação Penal (AP) 2668. Foto: Gustavo Moreno/STF
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Segundo réu a ser interrogado na ação do golpe, o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) afirmou ao Supremo Tribunal Federal, nesta segunda-feira 9, que não enviou a Jair Bolsonaro (PL) um documento em que colocava sob suspeita o resultado das urnas em 2022. De acordo com o parlamentar, o arquivo era de cunho pessoal.

A oitiva foi conduzida pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do caso na Corte. O magistrado questionou Ramagem sobre um trecho do documento que indica ter sido direcionado a Bolsonaro. O réu, porém, alegou que a suposição decorre do seu estilo de escrita, que segue uma estrutura de dialógo interno para “concatenar as ideias”.

Segundo o deputado, o documento em questão reunia anotações sequenciais e exclusivas. Apenas um dos contéudos teria sido compartilhado com o ex-presidente: o trecho de um vídeo de audiência no STF sobre testes de segurança nas urnas. “Essa foi a única mensagem que enviei a alguém. O restante do documento é composto por coisas particulares.”

Ele também negou ter agido para disseminar desinformação sobre o processo eleitoral brasileiro, já que o vídeo repassado a Bolsonaro era público e não passou por edições.

Ramagem, que comandou a Agência Brasileira de Inteligência sob Bolsonaro, é acusado de ter usado a estrutura da Abin para monitorar ilegalmente autoridades e produzir relatórios paralelos em apoio à estratégia golpista. Ele nega as acusações.

Questionado sobre publicações nas redes sociais em que tratava do voto impresso, Ramagem afirmou que as postagens não representam seu posicionamento pessoal sobre as urnas. Segundo ele, os posts não devem ser interpretados como críticas ao sistema eletrônico de votação, mas como parte do debate legislativo em torno da proposta que estava em discussão no Congresso.

Depois que a proposta foi rejeitada pelos parlamentares, em 2021, ele relatou nunca mais ter “tocado no assunto”. Ramagem também chegou a admitir que pensou em criar um grupo de trabalho sobre o sistema de votação, mas a ideia não avançou por falta de tempo hábil. Também negou ter utilizado a estrutura da Abin para buscar fraudes nas urnas ou monitorar autoridades.

Investigações da Polícia Federal indicam que o órgão foi usado para a produção de notícias falsas e o monitoramento ilegal de ministros do STF e jornalistas, por meio do software israelense First Mile. O deputado negou as acusações ao STF, alegando não ter renovado o contrato de uso da ferramenta e determinado um “pente-fino” na agência assim que assumiu o comando.

O deputado ainda foi questionado sobre as mensagens de uma assessora do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos) pedindo “ajuda” para obter informações sobre investigações que envolveriam o “PR [presidente da República] e 3 filhos”. “Eu não respondi, não consultei, não pedi para ninguém consultar, não foi feito nada. Apenas uma pessoa que mandou uma mensagem desavisada”, disse o parlamentar.

Após as perguntas de Moraes, o procurador-geral da República Paulo Gonet questionou se Ramagem reafirmava não ter enviado os documentos a Bolsonaro. Em resposta, o parlamentar alegou que a denúncia do MPF pinça “comentários e anotações privadas” e que o fato de haver as informações não significa que ele falou com o presidente. Nenhum advogado fez perguntas ao ex-chefe da Abin.

O interrogatório terminou logo em seguida. A Primeira Turma do STF retomará a rodada de depoimentos dos réus nesta terça-feira 10, com a oitiva do almirante Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha, a partir das 9h.

O primeiro a depor foi o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, por ter fechado um acordo de delação premiada com a Polícia Federal no final de 2023. O militar confirmou a existência da chamada minuta do golpe e relatou omissões e pressões do ex-presidente após a eleição em busca de uma fraude que pudesse reverter a vitória de Lula (PT).

Além de Cid e Ramagem, o STF deve ouvir nos próximos dias os demais réus na ação. Eles respondem por crimes como organização criminosa, tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Veja quem são:

  • Almir Garnier;
  • Anderson Torres;
  • Augusto Heleno;
  • Jair Bolsonaro;
  • Paulo Sérgio Nogueira;
  • e Walter Braga Netto (ele deporá de forma virtual por estar preso no Rio de Janeiro).

Todos os réus podem optar por ficar em silêncio e essa decisão não pode ser utilizada para prejudicar eles. O réu também pode escolher responder algumas perguntas e outras não, ou responder somente os questionamentos elaborados pelo seu advogado.

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