Política
Rio tem de reduzir letalidade policial em 66%, diz Fórum Brasileiro de Segurança Pública
Em 2023, o estado registrou uma taxa de 5,4 mortes por intervenções policiais para cada 100 mil habitantes, quase o dobro da média nacional


Para atingir níveis toleráveis de uso da força em uma sociedade democrática, as polícias do Rio de Janeiro precisam matar 66% menos que no ano passado. Essa é uma das recomendações feitas pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública em um estudo produzido para nortear o julgamento da ADPF das Favelas no Supremo Tribunal Federal.
A ação em questão foi movida pelo PSB no ápice da pandemia de Covid-19 em razão do alto índice de letalidade policial em comunidades do estado. Na ocasião, o ministro Edson Fachin, relator do caso, limitou as incursões nas favelas e determinou a apresentação de um plano para controlar o índice de violações de direitos humanos pelas forças de segurança.
Em 2023, o Rio de Janeiro registrou uma taxa de 5,4 mortes por intervenções policiais para cada 100 mil habitantes, quase o dobro da média nacional, de 3,1. Naquele ano, a posição mediana – valor no centro das taxas nacionais – era ocupada pela Paraíba, cuja taxa foi de 1,81 casos por 100 mil habitantes.
A redução média de 66% no número de óbitos causados por agentes do Estado, portanto, seria suficiente para que o estado chegasse próximo à mediana nacional. Os cálculos utilizados pelo Fórum para chegar a esse índice são os mesmos do Juntos Pela Segurança, programa da Secretaria de Segurança de Pernambuco.
Na avaliação de Samira Bueno, diretora-executiva da entidade, a meta é razoável ante a necessidade de reduzir os níveis de letalidade policial no Rio. Ela também rebateu os argumentos de que a ADPF das Favelas teria favorecido o crime organizado ou contribuído para o crescimento da criminalidade.
“Existem problemas graves de gestão da informação, no controle da atividade policial e de governança na área de segurança pública. O quadro atual é fruto da incompetência do Executivo do Rio de Janeiro em implementar uma política de segurança. Se o STF não agir por meio da ADPF 635, o crime vai dominar o estado por completo”, observa Bueno.
No documento, o Fórum ainda defendeu o fortalecimento do controle externo da atividade policial, por meio da retomada do Grupo de Atuação Especial de Segurança Pública, o Gaesp, órgão ligado ao Ministério Público extinto em 2021. O objetivo seria prevenir eventuais abusos em operações e responsabilizar policiais envolvidos em desvios.
Além disso, há uma recomendação ao estado para que melhore a qualidade dos dados de segurança. Hoje, o Instituto de Segurança Pública do Rio só contabiliza as mortes provocadas por intervenção policial. Ou seja: o órgão não indica se uma morte foi provocada pela ação de um policial civil ou policial militar, informação básica que a maioria dos estados registra.
Tampouco diferencia se a morte foi cometida por policiais em serviço ou de folga. Não é possível saber, portanto, se os agentes estão matando durante bicos de segurança particular para pequenos comércios ou no curso do policiamento realizado nas ruas, por exemplo.
Entre 2019 e 2023, depois que a ADPF das Favelas começou a tramitar, as mortes em ações policiais passaram de 1.814 para 871 no Rio, uma redução de 52%. Nesse mesmo período, caíram em 29% as mortes violentas, em 57% os roubos de carga e em 42% o roubo de celulares. Esse efeito colateral é comemorado por especialistas em segurança pública, embora a ação não tenha o objetivo específico de reduzir índices criminais, mas nortear a elaboração de uma política de segurança.
A ação foi movida como forma de cumprir a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos expedida em 2019. Naquele ano, pelo menos cinco crianças entre 8 e 12 anos foram mortas no Rio durante perseguição ou operação policial. O estado era governado por Wilson Witzel, que, assim que foi eleito, afirmou que a polícia iria “mirar na cabecinha e… fogo…”.
Fachin deve liberar o tema para julgamento ainda neste ano. Nas liminares que assinou, todas referendadas pelos colegas do Supremo, o magistrado determinou o uso de câmeras corporais e a instalação de câmeras nos carros da polícia fluminense. Além disso, ordenou que autoridades de saúde e educação fossem avisadas com antecedência sobre operações nas comunidades.
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