Justiça

Orientadas por Bolsonaro, Forças Armadas agiram para levantar desconfiança na eleição, diz Barroso

O novo presidente do STF concordou com a decisão do TSE de retirar os militares da fiscalização dos pleitos

Orientadas por Bolsonaro, Forças Armadas agiram para levantar desconfiança na eleição, diz Barroso
Orientadas por Bolsonaro, Forças Armadas agiram para levantar desconfiança na eleição, diz Barroso
O presidente do STF, Luís Roberto Barroso. Foto: Rômulo Serpa/Ag. CNJ
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O novo presidente do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, afirmou nesta sexta-feira 29 ser “perfeitamente razoável” a decisão do Tribunal Superior Eleitoral, tomada nesta semana, de retirar as Forças Armadas da lista de entidades fiscalizadoras do processo eleitoral.

A Corte alterou, assim, a resolução 23.673, de 14 de dezembro de 2021, a dispor sobre os procedimentos de fiscalização e auditoria do sistema eletrônico de votação. Barroso não faz parte da atual composição do TSE.

O ministro, ex-presidente da Corte eleitoral, disse ter incluído em sua gestão as Forças Armadas na Comissão de Transparência Eleitoral. Barroso ainda fez críticas indiretas ao ex-presidente Jair Bolsonaro, cujo governo foi marcado, entre outros pontos, pelo incentivo ao golpismo e pela divulgação de notícias falsas sobre o sistema eletrônico de votação.

“Lamentavelmente as coisas não passaram bem ali. O desejo era que contribuíssem para transparência e segurança, mas, seguindo orientações do comandante em chefe [Bolsonaro], trabalharam para levantar desconfianças. Foi uma pena”, afirmou, em coletiva de imprensa.

Barroso declarou, ainda, que o relatório final dos militares sobre o processo eleitoral “constatou que não acharam fraude, porque não há fraude”.

“No fundo, foi legitimador das eleições, porque, orientadas [as Forças Armadas] a levantar suspeitas, procuraram tudo o que podiam e não acharam. De modo que a consequência não foi ruim.”

O julgamento

O TSE decidiu na última terça-feira 26, por unanimidade, excluir as Forças Armadas da relação de entidades fiscalizadoras do processo eleitoral.

Segundo o relator, Alexandre de Moraes, “não se mostrou necessária, razoável e eficiente a participação das Forças Armadas”.

“Demonstrou ser absolutamente incompatível com as funções constitucionais e legais das Forças Armadas”, prosseguiu o presidente do TSE. Segundo ele, porém, os militares continuarão a participar do processo eleitoral em atividades como a garantia da segurança de locais de votação e o apoio logístico, como no transporte de urnas eletrônicas.

Além das Forças Armadas, o TSE retirou o STF da lista de entidades fiscalizadoras. Um dos motivos apontados é o fato de o tribunal ser um órgão responsável por julgar eventuais recursos propostos a partir de decisões da Justiça Eleitoral.

Permanecem na relação:

  • partidos políticos, federações e coligações;
  • Ordem dos Advogados do Brasil;
  • Ministério Público;
  • Congresso Nacional;
  • Controladoria-Geral da União;
  • Polícia Federal;
  • Sociedade Brasileira de Computação;
  • Conselho Federal de Engenharia e Agronomia;
  • Conselho Nacional de Justiça;
  • Conselho Nacional do Ministério Público;
  • Tribunal de Contas da União;
  • Confederação Nacional da Indústria, demais integrantes do Sistema Indústria e entidades corporativas pertencentes ao Sistema S;
  • entidades privadas sem fins lucrativos, com notória atuação em fiscalização e transparência da gestão pública, credenciadas junto ao TSE; e
  • departamentos de tecnologia da informação de universidades credenciadas no TSE.

O que concluíram os militares?

O hacker Walter Delgatti afirmou em agosto, em depoimento à CPMI do 8 de Janeiro, ter “orientado” a produção do relatório do Ministério da Defesa sobe as urnas eletrônicas. O documento foi entregue ao TSE em novembro de 2022.

“Tudo isso que eu repassei a eles consta no relatório que foi entregue ao TSE. Eu posso dizer hoje que, de forma integral, aquele relatório tem exatamente o que eu disse, não tem nada menos e nada mais“, disse o depoente.

Ele afirmou não ter escrito o texto, mas formulado as conclusões e transmitido o conteúdo aos técnicos do Ministério da Defesa, à época chefiado pelo general Paulo Sergio Nogueira de Oliveira, ex-comandante do Exército.

Em 9 de novembro passado, o Ministério da Defesa encaminhou o documento ao TSE. A auditoria dos militares não identificou qualquer fraude no pleito, mas, ao contrário do monitoramento de outras entidades, levantou especulações e apresentou uma série de recomendações.

O relatório alega, por exemplo, que a partir dos testes de funcionalidade, realizados por meio do teste de integridade e do projeto-piloto com biometria, “não é possível afirmar que o sistema eletrônico de votação está isento da influência de um eventual código malicioso que possa alterar o seu funcionamento”.

A auditoria também é dúbia ao mencionar suposta limitação na abertura oferecida pela Justiça Eleitoral. Diz, em um dos trechos, que “as ferramentas e os procedimentos disponibilizados pela equipe técnica do TSE para o trabalho das entidades fiscalizadoras não foram suficientes para uma análise técnica mais completa”.

Ao fiscalizar a totalização dos votos, a auditoria constatou “conformidade” entre os boletins de urna impressos e os dados disponibilizados pelo TSE, o que contraria uma das principais teorias conspiracionistas disseminadas por apoiadores de Jair Bolsonaro (PL).

O documento apresenta, por fim, “sugestões” para as próximas eleições, como a ampliação da participação de eleitores no projeto-piloto, o aumento no número de urnas selecionadas e uma “análise minuciosa dos códigos binários que efetivamente foram executados nas urnas”.

Em nota divulgada logo após obter acesso ao documento, o TSE afirmou ter recebido “com satisfação o relatório final do Ministério da Defesa, que, assim como todas as demais entidades fiscalizadoras, não apontou a existência de nenhuma fraude ou inconsistência nas urnas eletrônicas e no processo eleitoral de 2022”.

“As sugestões encaminhadas para aperfeiçoamento do sistema serão oportunamente analisadas”, prosseguiu a corte. “O TSE reafirma que as urnas eletrônicas são motivo de orgulho nacional, e que as Eleições de 2022 comprovam a eficácia, a lisura e a total transparência da apuração e da totalização dos votos.”

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