CartaCapital
Escândalo/ De Rolex e diamantes
Bolsonaro recebeu e se apropriou de um terceiro conjunto de joias sauditas


“Estou sendo acusado de um presente que eu não pedi, nem recebi. Não existe qualquer ilegalidade”, justificou-se Jair Bolsonaro, em entrevista à CNN Brasil, no início de março. À época, todos os olhares estavam voltados para um pacote de luxo confiscado pela Receita Federal no Aeroporto de Guarulhos, a incluir um colar, um anel, um relógio e um par de brincos de diamantes avaliados em 3 milhões de euros (16,5 milhões reais).
As joias foram trazidas, sem declaração ao Fisco, na mochila de um assessor do almirante Bento Alburquerque, ministro de Minas e Energia de Bolsonaro. Os militares foram surpreendidos pelos fiscais da Receita ao retornar de viagem oficial à Arábia Saudita, em outubro de 2021. Ao tentar desembaraçar as peças, o ministro confidenciou: “É para a primeira-dama”. Michelle Bolsonaro disse desconhecer a existência das joias e, em depoimento à PF, o almirante retificou-se: seria um “presente de Estado”.
Surge, então, a revelação de um segundo pacote de joias sauditas, a incluir relógio, caneta, anel, abotoaduras e um masbaha (espécie de rosário islâmico), todos da marca suíça Chopard. Em poder das peças, Bolsonaro viu-se obrigado a entregá-las para o Tribunal de Contas da União, assim como um fuzil e uma pistola presenteadas pelo governo dos Emirados Árabes. As armas foram acauteladas pela Polícia Federal, ao passo que as joias acabaram depositadas em um cofre da Caixa Econômica Federal.
Agora, quem poderia imaginar, apareceram os rastros de um terceiro kit de joias sauditas ainda em poder de Bolsonaro. O caso foi revelado pelo O Estado de S. Paulo na terça-feira 28. Segundo o jornal, o conjunto inclui um relógio da marca Rolex, fabricado em ouro-branco e cravejado de diamantes, uma caneta da marca Chopard prateada e um par de abotoaduras também em ouro-branco, com um brilhante cravejado no centro e outros diamantes ao redor. Os regalos foram avaliados em perto de 560 mil reais.
Está claro que Bolsonaro mentiu ao negar os presentinhos da monarquia saudita. O que permanece um mistério é o motivo que levou o rei Salman Al Saud a ser tão generoso com o ex-capitão e sua esposa.
Deus dá, Deus tira
Às vésperas da campanha de 2022, a Receita Federal ampliou a isenção tributária a pastores evangélicos, um dos principais núcleos de apoio ao então candidato à reeleição Jair Bolsonaro. Após a derrota do ex-capitão e a posse de Lula, o Ato Declaratório Interpretativo nº 1, de 29 de julho de 2022, foi considerado atípico por auditores fiscais e passa por uma reavaliação no Fisco, além de também estar na mira do Tribunal de Contas da União. Uma das irregularidades detectadas é que o ato não passou pela avaliação técnica da Subsecretaria de Tributação da Receita, como seria o procedimento-padrão. A peça foi assinada por Júlio César Vieira Gomes, então chefe da Receita.
Ditadura/ Camarão na rede
Justiça reverte a absolvição sumária de carcereiro da Casa da Morte
O sargento vai responder pelo sequestro e tortura de presa política – Imagem: MJSP/RJ
O Tribunal Regional Federal da 2ª Região determinou que o sargento reformado Antônio Waneir Pinheiro de Souza responda uma ação penal pelo sequestro e estupro de uma presa política durante a ditadura. Conhecido pelo codinome Camarão, ele era um dos agentes do Centro de Informações do Exército, responsável pela vigia da chamada Casa da Morte, em Petrópolis, um dos numerosos centros de detenção clandestinos do regime militar.
Camarão foi reconhecido pela única presa a sair viva do local, Inês Etienne Romeu, militante da Vanguarda Popular Revolucionária, presa, torturada e estuprada por mais de três meses em 1971. O sargento havia sido absolvido sumariamente na primeira instância pelo juiz bolsonarista Alcir Luiz Lopes Coelho, da 1ª Vara Federal de Petrópolis, em dezembro de 2021.
Na avaliação do magistrado, os crimes estavam prescritos e cobertos pela Lei da Anistia, de 1979, contrariando decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que considera imprescritíveis crimes contra a humanidade. Em 2017, Coelho rejeitou outra denúncia do Ministério Público Federal com os mesmos argumentos. Na sentença, ele chegou a citar Olavo de Carvalho, ex-astrólogo e um dos gurus do bolsonarismo.
700 mil vítimas da negação à ciência
Três anos após a primeira morte por Covid-19, o Brasil alcançou, na terça-feira 28, a tenebrosa marca de 700 mil óbitos pela doença. De acordo com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde, o Conass, o número de mortes confirmadas chegou a 700.239. O legado da gestão negacionista de Jair Bolsonaro não poderia ser mais pernicioso. Ao todo, 37,2 milhões de casos da doença foram dentificados desde o início da pandemia, em 2020. O Brasil é a segunda nação com mais mortes causadas pelo Coronavírus, em números absolutos, atrás apenas dos EUA. Com 2,7% da população mundial, o País concentra mais de 10% do total de óbitos por Covid em todo o planeta.
São Paulo/ Ecos de Columbine
Ataque a faca mata professora idosa e fere cinco em escola pública
Elisabete realizou o sonho de lecionar aos 60 anos de idade – Imagem: Fernando Frazão/ABR
Um adolescente de 13 anos matou a facadas uma professora de 71, na segunda-feira 27, na Escola Estadual Thomazia Montoro, em Vila Sônia, Zona Oeste da capital paulista. Elisabete Tenreiro era professora de Ciências, começou a lecionar aos 60 anos e foi golpeada pelas costas, sem chance de defesa. O agressor também feriu dois alunos e outras três professoras.
O crime foi premeditado. Segundo a polícia, o estudante anunciou o ataque em uma rede social, na qual escreveu ter aguardado a “vida inteira” por esse momento. Os ataques só cessaram após uma professora imobilizar o agressor e tomar a faca dele. “Se não fosse essa ação, a tragédia teria sido maior”, reconhece o secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite. Em entrevista ao canal de CartaCapital no YouTube, o educador e cientista político Daniel Cara observa que a maioria dos ataques em escolas é incentivada por grupos de extrema-direita que atuam na internet. “É uma situação grave e, infelizmente, o Poder Público tem varrido o problema para debaixo do tapete, acreditando que uma hora vai parar. Não se trata mais de ‘se’ vai acontecer um novo ataque, mas de ‘quando’ ele vai ocorrer.”
Rússia/ Rosa radioativa
Putin instalará armas nucleares táticas na Bielorrússia
Putin e Lukashenko, cada vez mais unidos na ofensiva à Ucrânia – Imagem: Presidência da Rússia
A Rússia instalará armas nucleares táticas na Bielorrússia, anunciou o presidente russo, Vladimir Putin, no sábado 25. O Kremlin disse ter chegado a um acordo sobre o tema com o presidente bielorrusso, Alexander Lukashenko, seu aliado mais próximo. É a primeira vez, desde meados da década de 1990, que o governo russo vai instalar armas fora de seu território.
O anúncio aumenta o temor de um conflito com armas nucleares no Leste Europeu. Recentemente, Moscou decidiu sair unilateralmente do pacto New Start, voltado para a redução do arsenal nuclear de EUA e Rússia.
As armas nucleares táticas utilizam ogivas menores e foram projetadas para destruir alvos específicos em uma batalha. Elas podem ser acionadas pelo sistema de lançamento de mísseis Iskander, já utilizado pela Rússia em alvos de curto alcance na Ucrânia. As armas nucleares estratégicas, por sua vez, cruzam continentes e têm capacidade para devastar uma cidade inteira.
Netanyahu no cabresto
O premier israelense, Benjamin Netanyahu, decidiu adiar, na segunda-feira 27, a controversa reforma judicial que gerou uma onda de protestos em várias cidades e arrastou o país para a mais grave crise política dos últimos anos. Pela proposta, o Legislativo poderia reverter decisões da Suprema Corte por maioria simples – inclusive as eventuais condenações que Netanyahu venha a sofrer em seus processos por corrupção, fraude e abuso de confiança. “Quando há uma chance de impedir uma guerra civil através do diálogo, como primeiro-ministro eu faço uma pausa”, recuou o premier. Ele teme que os distúrbios possam resultar em uma ruptura na coalizão governista, composta de extremistas de direita e grupos religiosos radicais.
Alemanha/ Sem luta não há conquista
Maior greve em três décadas exige reparação de perda inflacionária
Os trabalhadores alemães cobram aumentos de pelo menos 10,5% – Imagem: Thomas Kienzle/AFP
Maior economia da Europa, a Alemanha amanheceu na segunda-feira 27 ao som dos piquetes e barricadas, com boa parte do comércio fechada. Pudera, a greve convocada pelos dois maiores sindicatos do país conseguiu interromper completamente a circulação de trens, ônibus, aviões e embarcações nos principais centros urbanos do país.
O Sindicato dos Ferroviários e o Sindicato do Setor Público (Verdi), que, juntos, possuem mais de 2 milhões de filiados, convocaram uma greve conjunta para reivindicar melhorias salariais. As organizações exigem aumentos de pelo menos 10,5%, devido à alta histórica na inflação alemã, que levou a um aumento expressivo do custo de vida. Nas rodadas anteriores de negociação, reajustes de 5% e ofertas de bônus únicos foram rejeitados.
Os portos bloqueados, os voos cancelados e as linhas de trem paralisadas geraram prejuízos de até 181 milhões de euros, estima Klaus Wohlrabe, especialista do Instituto de Pesquisa Econômica da Alemanha.
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