Sustentabilidade

ONGs ocupam lacuna deixada por governo brasileiro na COP 25

Entidades da sociedade civil ocuparam lacuna deixada pelo governo, que sequer organizou um estande oficial do país no evento

Delegação indígena participa de evento no estande Brazil Climate Action Hub, durante a COP 25 - Foto: Instituto Clima e Sociedade/Divulgação
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As organizações não-governamentais (ONGs) que atuam nas questões ambientais no Brasil desfrutam de um protagonismo raro na Conferência do Clima de Madri, a COP 25. A lacuna deixada pelo governo brasileiro no evento, que sequer organizou um estande oficial do país, é ocupada pelas entidades da sociedade civil.

O papel das organizações, especialistas e observadores sempre foi crucial nas COPs, mas, desta vez, tem ainda mais relevância. A delegação brasileira é chefiada pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que até agora não realizou coletiva de imprensa sobre o andamento das negociações da COP, nem autorizou a equipe técnica que o acompanha a se pronunciar. Nas conferências anteriores, os chamados briefings à imprensa ocorriam praticamente todos os dias do evento, durante duas semanas.

Carlos Rittl é um dos especialistas mais reconhecidos do Brasil neste complexo assunto que são as negociações climáticas, acompanhadas por ele há 14 anos. O secretário-executivo do Observatório do Clima nota que, desta vez, Brasília cortou as credenciais de participantes que costumavam ser oferecidas a especialistas externos ao governo.

“A sociedade civil criou o próprio espaço para debate e diálogo, que em outras COPs era oferecido pelo Brasil: uma sala de seminários onde você debate assuntos relacionados às negociações e outras agendas das políticas domésticas, como florestas, energia e onde o Brasil está progredindo em ação climática”, afirma Carlos. “Na ausência de ação, de espaço e de diálogo, a sociedade civil – que é parte deste processo e reconhecida como tal pela Convenção e as Nações Unidas – está aqui.”

Indígenas respondem pela proteção da Amazônia

Por conta do desmatamento na Amazônia, que tomou as manchetes do mundo por semanas, as cobranças ao Brasil não são poucas nesta conferência. Do lado de fora da plenária, tem cabido às entidades responder aos questionamentos sobre as políticas ambientais do país – com um viés nada favorável ao governo.

Os indígenas circulam a caráter pelos corredores da COP 25 e recebem atenção especial da imprensa internacional. A presidente da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira, Nara Baré, trouxe um discurso firme contra Brasília.

“Estamos aqui para fazer um alerta para todos os que estão na COP, levar a nossa voz a todo o mundo e mostrar a real situação do que os povos indígenas do Brasil estão vivenciando hoje. Há um genocídio institucionalizado, que está matando os povos indígenas”, acusou. “Nós aqui reafirmamos: ao contrário do que disse o governo, a Amazônia é nosso patrimônio sim, é um bem comum de todos que ajuda a manter o equilíbrio do clima em todo o planeta.”

Mercado de carbono: Brasil na mira

Além da Amazônia, a palavra brasileira também está no foco das atenções por seu posicionamento no assunto mais controverso desta COP: a definição dos mecanismos para a comercialização de créditos de carbono. Na COP de 2018, na Polônia, o país bloqueou um acordo sobre o tema, ao defender um sistema que resultaria em dupla contagem de redução de emissões de gases de efeito estufa, tanto pelo país que compra como pelo que vende os créditos.

Em Madri, Brasília também quer que créditos adquiridos na última década possam ser utilizados no futuro – um projeto que enfraqueceria ainda mais o esforço global por reduzir as emissões. É por isso que os ambientalistas pressionam para que essas propostas sejam barradas, como explica Carlos Rittl.

“A gente já está numa trajetória de emissões completamente incompatível com os objetivos de longo prazo do Acordo de Paris. Se a gente trouxer essa redução por créditos de carbono, que representam alguns bilhões de toneladas de gases de efeito estufa já contabilizados no passado, corremos o risco seríssimo de não apenas jamais conseguirmos atingir o objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5°C até o fim do século”, analisa.

As ONGs estão impacientes com o andamento da conferência: na véspera do fim das negociações, os sinais de avanços até o momento são fracos. A ativista sueca Greta Thunberg, escolhida personalidade do ano pela revista Time, conclamou a sociedade civil a não esperar mais pela ação dos políticos.

“As mudanças necessárias ainda estão ausentes. As políticas necessárias ainda não existem hoje, apesar do que ouvimos dos nossos líderes”, declarou, em um discurso na quarta-feira 11. “Na verdade, todas as grandes mudanças do mundo vieram das pessoas. Não temos que esperar. Podemos começar as mudanças agora mesmo. Nós, as pessoas.”

A COP 25 se encerra oficialmente nesta sexta-feira 13, mas a prolongação das negociações por mais um ou dois dias, já é dada como certa, para a conclusão de um acordo. A próxima conferênia será em Glasgow, na Escócia.

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