Sustentabilidade

Mensagem do cacique Babau à ONU: ‘Abrir nossa terra para exploração é a morte nossa’

Entre os 64 países listados pela organização no ranking de assassinatos de defensores de direitos humanos, o Brasil ficou em segundo lugar

O cacique Babau Tupinambá (Foto: Conselho Indigenista Missionário/Divulgação)
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Na reunião nessa sexta-feira 5 de março, do conselho de Direitos Humanos da ONU, o Brasil foi citado diversas vezes entre os países que mais desrespeitam os direitos humanos no mundo e mais assassinam seus defensores. Entre os 64 países listados entre os que tiveram defensores assassinados, o Brasil ficou em segundo lugar, com 174 mortes, atras da Colômbia, onde contaram 397 assassinatos.

O assassinato de defensores, além da dor provocada a familiares, é também “uma tragédia para a construção de sociedades justas, um ataque gravíssimo ao espaço cívico e uma mancha indelével no compromisso do Governo pertinente de implementar a Declaração sobre os Defensores dos Direitos Humanos”.

Entre os casos mais graves de ameaças a defensores em curso, que foram destacados pela relatora das Nações Unidas, estão as constantes ameaças de morte cotra o cacique Babau, do povo Tupinambá, na Bahia. No tópico “ameaças de morte”, escreve a relatoria da ONU:

Em 29 de janeiro de 2019, Cacique Babau, líder indígena e defensor dos direitos humanos do Brasil, recebeu informação de uma fonte confidencial sobre um plano para assassiná-lo e pelo menos quatro de seus parentes, a saber, três irmãos e uma sobrinha. O plano teria sido desenvolvido em uma reunião com fazendeiros locais e representantes da polícia civil e militar. O Sr. Babau foi oficialmente incluído no programa de proteção dos defensores dos direitos humanos do governo. No entanto, ele parece continuar enfrentando sérias ameaças em sua comunidade e nenhuma investigação foi iniciada sobre as supostas ameaças de assassinato.”

O alerta da ONU, de que Babau descobriu um plano, e que continua recebendo ameaças de morte, é preciso. A situação piorou nas eleições de 2018, se intensificaram com o governo Bolsonaro, e agora está ainda pior, diante da implantação do que Bolsonaro vinha prometendo que iria fazer: uma política de extermínio contra os povos indígenas, e a explícita afronta à Constituição, prometendo, através de um governo que age como um Estado de Exceção, a não demarcar nenhuma terra indígena, e abrir as terras demarcadas para a exploração extrativa dos recursos naturais.

Antes da reunião, o cacique Tupinambá vestiu o Manto tupinambá, confecionado por sua irmã, a brilhante artista Gricelia Tupinambá, e proferiu a mensagem que divulgamos junto deste texto. Filmado por sua irmã Gricelia, o cacique manda a mensagem desde a Serra do Padeikro para a ONU, mas que é, também, para todos nos do Brasil. O governo Bolsonaro “é uma ameaça corrente”, diz ele: “para a fala dele, o povo de mal somos nós, que lutamos por nossos direitos ancestrais”.

Abaixo, a íntegra da fala de Babau:

Oi, eu sou o Cacique Babau, da aldeia Tupinambá Serra do Padeiro, vai aqui minha saudação a toda relatoria da ONU, do povo Tupinambá, e também da nação Tupi e de todos os povos indígenas do Brasil. Eu estou aqui na minha terra sagrada, na minha aldeia, onde nasci e todo meu povo viveu, nós sofremos ameaças constantemente. Estamos no programa de proteção. Mesmo esse programa de proteção não tem inibido as ameaças. O que resolveria de fato a parte das ameaças, ou as ameaças por inteiro, seria a demarcação de nosso território já. Pois aqui sempre vivemos, sempre moramos, e não é justo vivermos todos ameaçados. Pois vários parentes no Brasil inteiro tem morrido assassinado, porque estão lutando pelo seu território, pelo direito da natureza existir. Isso não é justo, senhores relatores. Não é justo o que está acontecendo com nós no Brasil. Pois o governante nosso, que se elegeu dizendo que não demarcaria um centímetro de terra para os povos indígenas, tem cumprido esse papel a risca, as terras que estavam em estudo, que estavam analisadas aqui no Brasil, estão paralisadas. Um retrocesso, e ele ainda disse que flexibilizaria as terras demarcadas, trazendo então uma intensa violência para esses povos, para todos nós. Isso faz com que os fazendeiros, grileiros e outros interessados em nossas terras, venham a nos ameaçar. E ele, o governante, tem dito no país inteiro que precisa armar o povo para defender o povo de bem. E, para a fala dele, o povo de mal somos nós, que lutamos por nossos direitos ancestrais. Agora mesmo flexibilizou o porte de arma no Brasil, e a compra de arma para caçadores. E caçadores não têm limite. Entram nas terras indígenas, invadem nossas terras. Então peço a toda composição da ONU que nos olhem, vejam o que está acontecendo. Abrir nossa terra para mineração, para exploração de agricultura externa, de grande escala: isso é a morte nossa. É uma ameaça corrente, e que está acontecendo. E não sei até onde podemos contar com o parlamento brasileiro. Pedimos desde já, em nome de Tupinambá, a nossa cultura, da nossa nação, apoio, ajuda aos senhores da ONU. Vocês podem fazer alguma coisa por nós. Desde já muito obrigada.”

Aproveito e publico também em francês e espanhol na esperança de que a mensagem do cacique chegue até à ONU, como ele pediu.

Hola, soy el Cacique Babau, de la aldea Tupinambá Serra do Padeiro. Saludo a todos los integrantes de la relatoría de la ONU, de parte de todo el pueblo Tupinambá, de la nación Tupi y de todos los pueblos indígenas de Brasil. Estoy aquí en mi tierra sagrada, en la aldea donde nací y donde todo mi pueblo vivió. Sufrimos amenazas constantes. Estamos en el programa de protección, pero este programa no ha inhibido las amenazas. Lo que realmente acabaría con parte de estas amenazas, o con todas ellas sería la demarcación de nuestro territorio inmediata. Porque siempre hemos vivido aquí, este siempre ha sido nuestro hogar, y no es justo que todos vivamos amenazados. Varios familiares en todo Brasil han sido asesinados porque luchan por su territorio, por el derecho de existir de la naturaleza. Esto no es justo, señores relatores. No es justo lo que nos está pasando en Brasil. Porque nuestro gobernante, que fue elegido diciendo que no demarcaría ni un centímetro de tierra para los pueblos indígenas, ha cumplido este papel al pie de la letra. Las tierras que estaban en estudio, que fueron analizadas para demarcación aquí en Brasil, están paralizadas. Un retroceso, e incluso dijo que flexibilizaría las tierras demarcadas, trayendo así una intensa violencia a estos pueblos, a todos nosotros. Esto hace que los grandes productores, acaparadores o traficantes de tierras y otros interesados ​​en nuestras tierras vengan acá a amenazarnos. Y él, el gobernante, ha dicho en todo el país que necesita armar al pueblo para defender al “pueblo de bien”. Y, en su discurso, nosotros somos el pueblo del mal, que luchamos por nuestros derechos ancestrales. Recientemente facilitó la posesión de armas en Brasil y la compra de armas para cazadores. Y los cazadores no tienen límite, entran en tierras indígenas, invaden nuestras tierras. Así que le pido a toda la composición de la ONU que mire para nosotros, vean lo que está ocurriendo. Abrir nuestra tierra para la minería, para la explotación de la agricultura a gran escala es nuestra muerte. Es una amenaza actual, está sucediendo. Y no sé hasta dónde podemos contar con el parlamento brasileño. Pedimos desde ya, en nombre del pueblo Tupinambá, de nuestra cultura y la de nuestra nación, apoyo, ayuda, señores de la ONU. Ustedes pueden hacer algunas cosa por nosotros. Gracias de antemano.”

E a mensagem em francês:

« Je suis le cacique Babau de la communauté Tupinamba de la Serra do Padeiro (Bahia – Brésil), j’envoie ici mes salutations à tous les conseillers de l’ONU, celles du peuple Tupinamba, de la nation Tupi et des peuples autochtones du Brésil. Je suis ici, sur ma terre sacrée, dans ma communauté, où je suis né et où vit tout mon peuple. Nous y subissons des menaces constantes. Nous sommes intégrés au Programme de Protection , mais même ce Programme de Protection ne parvient à empêcher les menaces. Ce qui résoudrait de fait les menaces ou une grande partie d’entre elles, serait la démarcation immédiate de notre territoire. Parce que c’est ici que nous vivons depuis toujours, que nous habitons depuis toujours, et il n’est pas juste que nous vivions tous menacés. De nombreux parents autochtones dans le Brésil tout entier, sont morts assassinés pour avoir lutté pour les droits de leurs territoires, pour le droit d’existence de la Nature. Ceci n’est pas juste, messieurs les conseillers. Ce n’est pas juste, ce qui nous arrive au Brésil. Le gouvernement qui a été élu en disant qu’il ne démarquerait pas un centimètre carré de territoires pour les peuples indigènes, suit rigoureusement cette règle. Les territoires qui étaient à l’étude, dont le processus de régulation était terminé, sont tous paralysés. Un retour en arrière. Et il prétendait aussi qu’il ouvrirait les territoires démarqués, introduisant ainsi une violence extrême contre ces peuples, contre nous tous. Cela fait que les propriétaires terriens, les envahisseurs et d’autres, intéressés par nos terres, viennent nous menacer. Et de plus, le gouvernement vient dire au pays tout entier, qu’il est nécessaire d’armer la population pour défendre les gens de bien. Et dans ses mots, les gens mauvais, ce sont nous, qui luttons pour nos droits ancestraux. Et maintenant, il vient d’assouplir les règles de port d’arme et la vente d’armes pour les chasseurs. Et les chasseurs n’ont pas de limites, ils entrent dans les territoires autochtones, envahissent nos terres. Alors, je demande à tous, de l’ONU, que vous nous regardiez, voyez ce qui arrive. Ils ouvrent nos territoires à l’industrie minière, à l’exploitation agricole externe en grande échelle et ceci c’est notre mort. C’est une menace urgente et qui est en train de s’appliquer. Et je ne sais pas si nous pouvons compter sur le Parlement brésilien. Nous demandons, dès maintenant, au nom de Tupinamba, de notre culture, de notre peuple, de notre nation, votre appui. L’aide des conseillers de l’ONU ! Vous pouvez faire quelque chose pour nous !

Et dès maintenant nous vous remercions. »

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