Sociedade
Volkswagen está próxima de admitir que colaborou com a ditadura
O apoio da montadora aos órgãos de repressão é investigado há quatro anos pelo Ministério Público e a documentação é farta
A fábrica da Volkswagen em São Bernardo do Campo, primeira unidade a ser construída fora da Alemanha, em 1956, repetiu um triste comportamento do passado da matriz. Aqui como no país de origem, a montadora colaborou ativamente com a tortura e a repressão durante regimes autoritários. E aqui como lá, em algum momento da história foi chamada a assumir a responsabilidade pelos crimes.
Investigada há quase quatro anos, a filial brasileira negocia uma reparação aos danos causados à sociedade e aos trabalhadores. Se o acordo com o Ministério Público for realmente levado a termo – espera-se um desfecho nos próximos dias –, a empresa alemã será a primeira a reconhecer perante a lei sua colaboração com a ditadura.
A fábrica do ABC abrigou um esquema ativo de colaboração com o Dops, órgão de repressão do regime. A direção da companhia, como indicam inúmeros documentos, delatou, capturou e permitiu a prisão de operários considerados subversivos. Segundo as investigações iniciadas durante o funcionamento da Comissão da Verdade em São Bernardo do Campo, o monitoramento de funcionários era coordenado pelo Departamento de Segurança Industrial da empresa, chefiado à época pelo coronel Ademar Rudge. Os próprios seguranças atuavam como espiões.
Um dossiê organizado pelo Instituto Intercâmbio, Informações, Estudos e Pesquisas, ligado ao movimento sindical, foi enviado ao Ministério Público em setembro de 2015. Diante da fartura de evidências, o MP decidiu abrir uma investigação.
Pedido oficial de desculpas
Desde então, procuradores federais, estaduais e do Trabalho negociam extrajudicialmente com a Volkswagen a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta.
Os integrantes do Ministério Público exigem um pedido oficial de desculpas, o pagamento de indenizações individuais e algum tipo de reparação coletiva.
Armada com fuzis, a PM acompanha a movimentação dos grevistas na porta da Volks em 1979 (Foto: Jesus Carlos)
Inegável é o fato de a Volks ter funcionado como uma espécie de “centro de inteligência” da repressão. A companhia, indicam documentos, liderava reuniões de uma entidade que conectava empresas da região do ABC a representantes do Serviço Nacional de Informações, ao Dops e a outros órgãos.
Além dos depoimentos de ex-funcionários, chama a atenção a quantidade de papéis marcados com o símbolo da Volkswagen e a assinatura de dirigentes.
Procurada por CartaCapital, a Volkswagen do Brasil enviou uma nota na qual se limita a declarar ter sido “a primeira empresa do setor automotivo a examinar sua história” durante a ditadura, mas que o estudo encomendado pela empresa “não encontrou evidência de cooperação da alta direção com o regime militar”.
O acordo em negociação com o Ministério Público põe em xeque o comunicado.
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