Sociedade

Um ano sem lixo

Jovem brasileira trocou saco de pão por sacola de pano, desinfetante por mistura de vinagre e limão e comida industrializada por alimentos frescos

Itens que Cristal leva na bolsa para viajar sem lixo
Apoie Siga-nos no

Por Marcio Pessôa

Há sete meses, a brasileira Cristal Muniz decidiu mudar radicalmente o próprio estilo de vida. A designer gráfica de 24 anos se propôs a reduzir a “quase zero” sua produção de lixo. As palavras-chave da iniciativa são diminuir o consumo, reutilizar e reciclar. Para relatar suas experiências e interagir com interessados no tema, ela criou o blog Um ano sem lixo.

Cristal se inspirou na experiência da blogueira americana Lauren Singer, do blog Trash is for Tossers, e, de início, pensou que nunca conseguiria aplicar a ideia no Brasil. “Para a minha surpresa, havia como fazê-lo. Procurei no Google: ‘loja a granel Florianópolis’ e descobri uma loja de produtos orgânicos que vende de tudo, atrás da minha casa”, conta.

Desde dezembro de 2014, a jovem procura não desperdiçar comida e consumir menos roupas, eletrônicos e móveis, buscando artigos de segunda mão. Para comprar pão, ela usa sempre a mesma sacola de pano, e, para buscar produtos a granel, os mesmos potes de vidro. Ela anda sempre com o mesmo copo e talheres na bolsa e substitui produtos de limpeza convencionais – como sabão em pó, amaciante e desinfetante industrializados – por bicarbonato de sódio, vinagre e sabão de coco.

Até mesmo na intimidade a designer fez uma mudança radical: adotou o coletor menstrual reutilizável de silicone. O copinho maleável, ajustável ao corpo, e higienizável com água e sabão neutro, substitui o poluente absorvente. Cristal também usa cosméticos naturais e escova de dente de bambu, compra xampu em barra e faz condicionador caseiro á base de vinagre.

rotina.jpg Cristal não utiliza sacolas plásticas ou embalagens descartáveis | Crédito: Um ano sem lixo/reprodução

“Vinagre eu uso em tudo, como amaciante, condicionador e desinfetante. O que é mais caro são os sabonetes artesanais, mas eles duram mais”, diz. Ela lembra que costumava gastar 40 reais por mês com produtos de higiene e limpeza, e hoje, gasta apenas cinco reais.

Quanto aos hábitos alimentares, Cristal passou a comprar alimentos mais frescos, deixou de comer itens industrializados e cozinha mais em casa. Com todas as mudanças, além dos benefícios para o bolso e o meio ambiente, a jovem afirma perceber efeitos positivos no próprio corpo.

“Emagreci um pouquinho, porque como menos açúcar. Meu cabelo está melhor. Eu usava muito condicionador para ele ficar hidratado. Agora, com o vinagre, ele está sedoso, não está esturricado. A maquiagem natural também agride menos a pele”, conta.

Para as embalagens que não podem ser evitadas, Cristal colabora com o sistema de coleta seletiva. Ela também tem uma composteira de minhocas, ou minhocário, para colocar o lixo orgânico e a bucha vegetal que usa para lavar a louça.

Interesse nas redes sociais

Sem título.png Cristal passou a consumir alimentos mais frescos | Crédito: Instagram/CristalmunizEm seu post mais recente, a jovem ensina dá a receita de um hidratante 100% natural, com manteiga de karité, óleo de coco, manteiga de cacau e óleo de amêndoas. Ela também já ensinou a preparar um desinfetante com álcool e limão, que pode ser usado para limpar o banheiro ou o chão, por exemplo.

Numa postagem sobre um assunto polêmico, Cristal escreveu sobre o porquê de não comprar roupas “fast fashion” feitas na China. “Vale mais pro bolso e pra consciência ambiental ter menos peças e de qualidade superior, porque elas vão durar mais tempo.”

Mais de 3,8 mil pessoas já curtiram a página do Um ano sem lixo no Facebook. Já o blog tem, em média,12 mil acessos por mês. Cristal acredita que muitas pessoas querem adotar o mesmo estilo de vida, mas não conseguem por vários motivos – desde a falta de produtos e lojas que atendam esse mercado até a ausência de sistema público de reciclagem nas suas cidades.

“Vejo que as pessoas querem mudar, mas não têm opção. Ou, quando têm, a loja a granel vende muito mais caro. É um grande nicho de mercado muito mal explorado, porque praticamente não há produtos de limpeza [naturais] ou escovas com cerdas vegetais para limpar a casa. Tudo tem plástico.”

Cristal mora em Florianópolis – uma das poucas cidades com sistema de coleta seletiva no Brasil – e com oferta generosa de produtos orgânicos e vendidos a granel. Em outras cidades do país, seguir o mesmo estilo de vida pode ser uma tarefa bastante complicada.

“Florianópolis tem coleta seletiva em todos os bairros, pontos de coleta de vidro para reciclagem e feiras de produtos orgânicos. Pessoas de outras cidades me perguntam sobre coisas que aqui são fáceis de serem encontradas, e lá não”, diz a jovem, que pretende seguir com o estilo de vida “sem lixo” pelo menos até o fim deste ano.

ENTENDA MAIS SOBRE: , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo