Sociedade

Terceiro mundo

Os gatos, como os japoneses, não espalham lixos ao seu redor. Por que os brasileiros não?

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Uns tempos atrás, depois de um susto, entendi por que somos chamados de terceiro-mundistas.

Peguei a estrada, como fazia diariamente, e vinha sossegado, sem vontade nenhuma de provar que sou rápido no volante. Pelo retrovisor, percebi que um automóvel se aproximava em alta velocidade, mas já estava acostumado com isso e me mantive na pista da direita para não atrapalhar o tráfego.

Às vezes também tenho pressa e detesto quando alguém faz de tudo para que eu chegue atrasado a meu destino. Meu falecido pai repetia com aquela seriedade com que deitava suas verdades para fora: não se faz aos outros o que não se quer que os outros nos façam. Por falar nisso, os pais de hoje não transmitem mais preceitos morais? Caramba, e onde é que os adolescentes vão aprender seus valores? Aliás, uma sociedade começa a entrar em decadência quando uma simples palavra como “moral” é considerada ridícula pela maioria das pessoas. Vocês se lembram do Império Romano?

Mas voltando a nosso assunto. Assim que fui ultrapassado pelo candidato a Fittipaldi (ninguém mais se lembra dele, portanto pode-se substituir seu nome pelo do Felipe Massa, pode ser? Obrigado), alguém jogou uma lata vazia de cerveja pela janela do bólido que passou a meu lado, quase me arrastando pelo deslocamento do ar, coisa assim de furacão, um tenebroso fenômeno da natureza. Uma lata de cerveja, sem dúvida nenhuma. A velocidade significava uma urgência qualquer? Mais fácil acreditar que era, a velocidade, estimulada pelo álcool. Enfim, a vida de algumas pessoas não vale nada mesmo.

Depois do susto (a latinha chegou a bater no para-brisa do meu carro) veio a luz. Fenômeno que também pode ser chamado de epifania, pelo menos depois do James Joyce. Bem, nós temos o hábito de jogar nosso lixo onde estivermos: no estádio, no salão, no teatro, no parque, na rua. Não escolhemos lugar onde deixar as marcas de nossa passagem. Eu já tive um gato, quando criança. É invejável a delicadeza com que sua patinha dianteira arrasta a terra para cobrir a cova onde esconde seu excremento. Você, leitor eventual e talvez único, entende agora o que pretendo dizer com inveja aos animais?

Lembro-me de uma dessas copas de futebol que acontecem por aí, se não estou enganado, de quatro em quatro anos. A televisão mostrou um grupo de japoneses que torcia, gritava, aplaudia, ou seja, torcia. Eles acabaram aderindo ao esporte das multidões, e isso não faz muito tempo, não. Terminado o jogo, cada um pegou seu saquinho de lixo, que trazia pendurado à cintura, juntou a sujeira que fizera, e, ao irem-se embora, o lugar ocupado estava tão limpo como antes do jogo. E isso me provoca uma reflexão: nem só os gatos, por seu asseio, merecem nossa inveja. E então pensei: se eles, os japoneses, podem, por que não podemos também?

Meu amigo Adamastor, o catastrófico, me diz que não podemos porque a maioria do povo gosta mesmo é do lixo. Tenho minhas dúvidas.

Uns tempos atrás, depois de um susto, entendi por que somos chamados de terceiro-mundistas.

Peguei a estrada, como fazia diariamente, e vinha sossegado, sem vontade nenhuma de provar que sou rápido no volante. Pelo retrovisor, percebi que um automóvel se aproximava em alta velocidade, mas já estava acostumado com isso e me mantive na pista da direita para não atrapalhar o tráfego.

Às vezes também tenho pressa e detesto quando alguém faz de tudo para que eu chegue atrasado a meu destino. Meu falecido pai repetia com aquela seriedade com que deitava suas verdades para fora: não se faz aos outros o que não se quer que os outros nos façam. Por falar nisso, os pais de hoje não transmitem mais preceitos morais? Caramba, e onde é que os adolescentes vão aprender seus valores? Aliás, uma sociedade começa a entrar em decadência quando uma simples palavra como “moral” é considerada ridícula pela maioria das pessoas. Vocês se lembram do Império Romano?

Mas voltando a nosso assunto. Assim que fui ultrapassado pelo candidato a Fittipaldi (ninguém mais se lembra dele, portanto pode-se substituir seu nome pelo do Felipe Massa, pode ser? Obrigado), alguém jogou uma lata vazia de cerveja pela janela do bólido que passou a meu lado, quase me arrastando pelo deslocamento do ar, coisa assim de furacão, um tenebroso fenômeno da natureza. Uma lata de cerveja, sem dúvida nenhuma. A velocidade significava uma urgência qualquer? Mais fácil acreditar que era, a velocidade, estimulada pelo álcool. Enfim, a vida de algumas pessoas não vale nada mesmo.

Depois do susto (a latinha chegou a bater no para-brisa do meu carro) veio a luz. Fenômeno que também pode ser chamado de epifania, pelo menos depois do James Joyce. Bem, nós temos o hábito de jogar nosso lixo onde estivermos: no estádio, no salão, no teatro, no parque, na rua. Não escolhemos lugar onde deixar as marcas de nossa passagem. Eu já tive um gato, quando criança. É invejável a delicadeza com que sua patinha dianteira arrasta a terra para cobrir a cova onde esconde seu excremento. Você, leitor eventual e talvez único, entende agora o que pretendo dizer com inveja aos animais?

Lembro-me de uma dessas copas de futebol que acontecem por aí, se não estou enganado, de quatro em quatro anos. A televisão mostrou um grupo de japoneses que torcia, gritava, aplaudia, ou seja, torcia. Eles acabaram aderindo ao esporte das multidões, e isso não faz muito tempo, não. Terminado o jogo, cada um pegou seu saquinho de lixo, que trazia pendurado à cintura, juntou a sujeira que fizera, e, ao irem-se embora, o lugar ocupado estava tão limpo como antes do jogo. E isso me provoca uma reflexão: nem só os gatos, por seu asseio, merecem nossa inveja. E então pensei: se eles, os japoneses, podem, por que não podemos também?

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