Sociedade

Projeto convida jovens a refletir sobre ‘lugar de menino e menina’

O projeto Plano de Menino e Plano de Menina procura apresentar outros referenciais de gênero e classe para jovens da periferia

Projeto discute discursos de gênero e classe com jovens da periferia. Créditos: divulgação
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A jornalista Viviane Duarte tem um compromisso com os jovens das periferias. “Orientá-los para serem agentes de transformação, ajudá-los na reconstrução de questões como autoestima, pertencimento, direitos e cidadania.” O pacto surgiu a partir de sua própria trajetória, cercada de desafios e “privilégios”. “Eu sei quantas amigas ‘da quebrada’ ficaram para trás ao longo da minha caminhada por falta de oportunidades.”

Viviane trilhou um caminho pouco comum para jovens periféricos. Nascida na Freguesia do Ó, zona norte da cidade de São Paulo, foi moradora de cortiços em territórios como Jaraguá, ao noroeste, e Franco da Rocha, região metropolitana, e cursou seus estudos em escolas públicas. Alcançou titulação em Jornalismo e especializações em Propaganda e Marketing, o que lhe rendeu um encontro com o mundo corporativo, experiência que ela mesma rompeu depois de 10 anos de atuação.

“Eu comecei a ver como as narrativas das propagandas e das pesquisas de consumo não favoreciam a trajetória de pessoas como eu. Como os discursos ainda invisibilizavam as pessoas, as rotulavam em padrões e estereótipos de gênero e classe, impedindo o rompimento de um lugar estratificado socialmente”, avalia.

Com o intuito de ofertar outras narrativas às juventudes periféricas, a jornalista formata, em 2016, o Plano de Menina, projeto social que surge para apresentar às garotas discursos de empoderamento em diversas áreas. Com o apoio de uma rede de profissionais mulheres, Viviane formata cinco módulos de conteúdo: “Dona do meu mundo”, sobre carreira, empreendedorismo, liderança e educação financeira; “Você não é obrigada”, que discute os direitos das mulheres e cidadania; “Vida Digital”, sobre segurança na internet e uso das mídias; “Lacrando muito com pouco”, que compreende discussões sobre identidade, moda, estilo e customização; e “Close Certo”, que fala sobre auto estima, auto conhecimento e auto cuidado.

Já no ano de lançamento, a iniciativa começou a rodar na Escola Estadual Samuel Wainer, no Grajaú, e na Associação Capão Cidadão e no Cieja, no Capão Redondo, “territórios que apresentavam alto número de violência contra as mulheres”, conta a jornalista. Desde então, a iniciativa se expandiu territorialmente – 10 Estados tem localidades com o projeto ativo – e também passou a considerar os meninos.

A demanda surgiu em 2017, quando o projeto começou a rodar na Etec Pirituba, escola da região norte de São Paulo. “As próprias meninas da escola falaram sobre a necessidade de dialogar com os meninos”, conta Viviane, que deu início em caráter piloto ao Plano de Menino. A iniciativa já acontece com 30 meninos da escola e mais 30 em uma instituição da região do M’Boi Mirim.

“O trabalho é o mesmo, de escuta primeiramente, e de fazê-los entender como o machismo estrutural na sociedade também os afeta em seu desenvolvimento. É preciso romper com esse ciclo que determina o lugar do menino, desde a sexualidade, para que entendam, por exemplo, que eles não são obrigados a consumir pornografia, nem devem olhar os corpos femininos dentro de uma objetificação. Queremos valorizar a auto estima e o autoconhecimento deles. E afastar discursos como “homem não chora”, que os afeta emocional e afetivamente”, esclarece Viviane. Temas como empreendedorismo, liderança, programação e mercado de trabalho entram no hall de formação dos garotos.

A jornalista conta que prevê a ida aos espaços – escolas ou associações – uma vez por semana, agenda possível graças a uma equipe de mais de 250 voluntários que desdobram as atividades na ponta. Cada formação, com duração de quatro horas, reúne técnicas de psicodrama, exercícios, oficinas e planos de ação, para que os jovens exercitem a temática. Viviane conta os familiares dos jovens também estão sendo convidados a participar dos encontros.

“Precisamos resgatar a importância da família nesse processo porque, muitas vezes, o estereótipo é reforçado dentro de casa. Por exemplo, meninos e meninas que não validam sua imagem frente ao espelho porque buscam outros referenciais padrões, ou que naturalizam a violência porque as mães também vítima. É uma reconstrução que envolve a todos”, finaliza.

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