Sociedade

Presidente da CNBB tem afinidade antiga com grupos ‘pró-vida’

Dom Walmor Azevedo chamou de ‘crime hediondo’ a interrupção da gravidez infantil fruto de um estupro

Foto: Reprodução/TV Globo Foto: Reprodução/TV Globo
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Diante da comoção provocada pela interrupção da gravidez de uma menina de dez anos estuprada pelo tio, o bispo Dom Walmor Azevedo, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), comparou o procedimento a ‘crime hediondo’ e acusou a médicos e juízes de “decidirem pela morte de uma criança de apenas cinco meses”.

A mensagem, divulgada na segunda-feira 17, virou assunto nas redes sociais. Embora o aborto seja um dogma da Igreja Católica, causou espanto que o presidente da principal organização católica no Brasil, eleito há um ano, tenha se manifestado em termos tão categóricos sobre uma gestação infantil decorrida de estupro, cuja interrupção está prevista em lei.

O levantamento mais amplo sobre aborto legal no Brasil, publicado em 2016, mostrou que mais da metade das mulheres que buscam aborto legal no Brasil são católicas. Em 94% dos casos, o motivo é estupro.

Entre os católicos, contudo, o recado não surpreende. Embora seja tido como um moderado, Walmor nutre antiga simpatia aos chamados movimentos ‘pró-vida’ da igreja, que condenam o aborto em qualquer situação.

“É ilusão pensar que o episcopado é progressista em política e, principalmente, nos costumes”, resume um interlocutor da CNBB ouvido reservadamente por CartaCapital.

Além de enorme pressão dos grupos conservadores, também estão em jogo questões históricas da doutrina católica. No cenário mais progressista, talvez, haveria uma nota falando em direito à vida.

Em 1999, Walmor foi um dos signatários de um manifesto da CNBB contrário à regularização ao aborto em casos de estupro no SUS. No texto, os bispos lamentavam que a ‘prova’ exigida para o estupro fosse uma “simples apresentação de um boletim de ocorrência policial.” Segundo eles, a medida abriria portas para “a falsificação de estupros e o aborto em série”.

Em 2010, em um artigo de próprio punho, ele apontou uma “urgente e permanente necessidade” de retomada de “valores morais e evangélicos”. Naquele mesmo ano, pediu aos fiéis que verificassem se o candidato a presidente era “comprovadamente contra o aborto”

Procurada, a CNBB informou que a posição de Walmor é pessoal, e que não divulgou nota sobre o caso. Outros bispos tem se mostrado alinhados ao presidente da entidade.

Em entrevista divulgada com destaque no site oficial da CNBB, dom Ricardo Hoepers, presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família, também marcou posição a favor da interrupção daquela gestação.

“Por mais que nós compreendamos o trauma do que significa esse filho [para a menina-mãe], nós temos hoje todas as condições com a ciência, a psicologia, toda essa área de medicina que daria condições de acompanhar essa gestação e, claro, quantos pais e mães esperando uma criança? Poderia trazer a alegria, a felicidade para alguma família”.

Segundo os dados mais recentes do Ministério da Saúde, divulgados em 2018, 21.172 meninas com idade entre 10 e 14 anos deram à luz. A maioria, quase 16 mil, eram negras.

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