Sociedade

O tempo não para

O Brasil está envelhecendo. Pesquisa recente mostra o despreparo das empresas para lidar com profissionais mais maduros

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O processo é conhecido. Os custos crescem, os competidores avançam, e os acionistas querem resultados. Saída: renovar os quadros. Leia-se: livrar-se dos funcionários mais velhos e caros, contratar jovens efebos, com muita vontade e pequeno salário. Dito e feito. Então, o trabalho emperra, os clientes reclamam, mas a planilha de custos fala mais alto. Assim tem sido: a cada crise, interna ou externa, as empresas rejuvenescem seus quadros. Alguns observadores batizaram o processo de “juniorização”.

Uma empresa “juniorizada” salta aos olhos. Antes, o escritório, silencioso e solene, era dominado por calvícies e cabelos brancos. Seis meses depois, o nível de ruído aumentou, e uma horda juvenil se estabeleceu. Foram-se as regras e procedimentos, substituídos por um frenesi frequentemente confundido com agilidade e produtividade. O mais importante é, porém, que a folha de pagamento foi reduzida. Inferno na Terra, paz no Olimpo corporativo.

Renovar sistematicamente os quadros é um princípio de gestão importante para as empresas. Profissionais mais jovens trazem novas ideias, colocam em xeque processos anacrônicos e ajudam a evitar que a empresa envelheça e perca o contato com as mudanças em seu ambiente de negócios. A renovação, realizada na medida certa, traz efeitos positivos.

A juniorização, por sua vez, quando realizada com o propósito de reduzir custos, compromete a qualidade da gestão e põe em risco o futuro das companhias. Vista como panaceia, evita que a empresa trate de questões mais substantivas, relacionadas ao seu modelo de negócios e às suas práticas de gestão.

Além disso, a juniorização segue na contramão da demografia. O Brasil está envelhecendo. Nas próximas décadas, as empresas terão de lidar com quadros profissionais cada vez mais maduros. Uma pesquisa recente, realizada pela consultoria PwC e a FGV-Eaesp, instituição à qual este escriba está ligado, procurou avaliar como o mundo corporativo se prepara para o fenômeno. Foram ouvidas mais de cem empresas, de diversos segmentos da economia. Algumas conclusões são preocupantes.

Em primeiro lugar, menos de 40% das organizações pesquisadas reconhecem que quadros mais maduros podem constituir alternativa para a escassez de talentos, problema hoje de centenas de corporações brasileiras que estão freando seus planos de crescimento. Consequentemente, não há na maioria das empresas mecanismos para atrair e manter tais quadros.

Em segundo lugar, as companhias reconhecem: profissionais mais maduros possuem competências valiosas, relacionadas à capacidade de realizar diagnósticos e resolver problemas, além de apresentar maior equilíbrio emocional. Paradoxalmente, elas não contam com modelos de gestão de carreira que facilitem os processos pelos quais tais características poderiam ser mais bem exploradas. Além disso, as práticas para os mais velhos transferirem experiência aos mais jovens são pouco desenvolvidas.

Em terceiro lugar, há poucas iniciativas para garantir maior qualidade de vida e para ter quadros mais saudáveis no futuro. Há também poucas ações para acomodar o perfil e as necessidades dos profissionais próximos da aposentadoria.

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Em suma, a maioria das empresas parece não ter ainda tomado consciência de que a evolução da pirâmide demográfica e as mudanças no mercado de trabalho demandarão alterações nas práticas de gestão de carreiras. No centro da questão situa-se uma dificuldade para reconhecer o valor de quadros mais maduros e para administrá-los.

Psicólogos têm desenvolvido escalas para observar e medir a capacidade de indivíduos realizarem raciocínios ponderados e maduros. Tais escalas consideram, entre outros fatores, o desejo de procurar oportunidades para resolver conflitos, a disponibilidade para buscar soluções de compromisso, o reconhecimento dos limites do conhecimento pessoal e de que podem existir diferentes perspectivas para resolver um problema.

Segundo estudos realizados pelo psicólogo social canadense Igor Grossmann, da Universidade de Waterloo, com norte-americanos, indivíduos mais velhos obtêm, em tais escalas, escores mais altos. A sabedoria vem mesmo com a idade. Entretanto, a cultura na qual os indivíduos estão imersos também interfere, acelerando ou, eventualmente, retardando o processo de amadurecimento.

Organizações que apostam na juniorização com o propósito de reduzir custos e ignoram a evolução do nosso perfil demográfico agem contra seus próprios interesses. Além de desperdiçar competências e características da maturidade, podem estar inadvertidamente estimulando uma cultura que inibe o amadurecimento.

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