Sociedade

Homem na Lua ou carteado? Militares nunca se importaram com a ciência

A versão oficial era que seu Arthur, o ditador de plantão, exausto com os afazeres do Estado dormiu cedo na noite

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Ainda que existam os que continuam acreditando que tudo não passou de uma farsa encenada por Hollywood, há evidências de que a superfície da Lua foi de fato estreada pelo ser humano na noite de 20 para 21 de julho de 1969 – meio século atrás. Os dois astronautas americanos Neil Armstrong e Buzz Aldrin, da nave Apolo 11, deixaram suas pegadas no solo lunar e, resgatados por um terceiro astronauta, Michael Collins, chegaram sãos e salvos à Terra.

O cenário de então, aquecido pela Guerra Fria, transformou em proeza épica da Nasa, no quadro da corrida espacial, a propalada “conquista da Lua”. Logo, logo, o insosso satélite da Terra só voltaria a interessar aos poetas e seresteiros. A máquina de propaganda made in USA tratou de amplificar o evento, se bem que alguma tensão existisse, a ponto de William Safire, ghost writer do presidente Richard Nixon, ter se prevenido com um elogio fúnebre da tripulação da Apolo 11, caso um desastre ocorresse.

A embaixada americana em Brasília juntou-se aos festejos. Abriu suas portas a privilegiados para a transmissão do pouso e da caminhada pelas imagens de melhor definição da CBS ou da NBC. A eufórica jornada foi acompanhada por snacks e abastecida por drinques coloridos, o que fez aumentar a intensidade da apoteose tardia. No que diz respeito ao jovem repórter do Jornal da Tarde, de São Paulo, hoje venerando editor, a atmosfera entusiasmada atiçou um incomum senso de dever profissional e ele saiu da embaixada em busca, naquela era pré-celular, de um telefone possível. Queria saber o que pensava da fabulosa façanha o ditador de plantão, o general Arthur da Costa e Silva.

Autoridades sem texto próprio costumam recorrer a frases ocas para tais ocasiões, mas Costa e Silva não parecia interessado em se irmanar ao coro epifânico de louvor aos conquistadores do espaço. O repórter teimoso percorreu todos os andares do governo atrás de umas aspas. O assessor de imprensa estava indisponível, os auxiliares mais próximos não respondiam ­– até que a voz misericordiosa do ajudante de ordens assomou ao telefone do Palácio da Alvorada. Não, Sua Excelência não assistira ao pouso lunar; recolhera-se mais cedo a seus aposentos. “É oficial essa informação?” “Estou dizendo que sim”, irritou-se o militar. O JT registrou na primeira página.

A urgência jornalística e, ainda, com certeza, o efeito dos coquetéis licorosos produziam, em lugar de um furo, uma gafe. Soube-se depois que, de fato, o presidente-general não dera a mínima para um evento que eletrizava a humanidade. Enquanto Neil Armstrong saltitava na Lua, o bonachão Seu Arthur – como o chamava o colunista  Ibrahim Sued – decidia se descartava o 8 de paus ou o 7 de ouros na sua sempre animada mesa de carteado do Alvorada.

Seu Arthur, o ditador de plantão, tinha outros assuntos a tratar do que ver aquela bobagem da Nasa

Esta história por muito tempo pareceu inverossímil. Os dias atuais testemunham de novo a indigência mental e o provincianismo rastaquera de militares que, num golpe ou noutro, galgam o poder no Brasil – ignorância e caipirice que são igualmente o apanágio daqueles que insistem em acreditar que ditaduras fardadas são o melhor dos mundos.

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