Sociedade

Na Irlanda, papa expressa “vergonha” por casos de abuso

Francisco afirmou que autoridades eclesiásticas irlandesas “fracassaram” em enfrentar “crimes repugnantes”

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O papa Francisco reconheceu neste sábado 25 em Dublin o fracasso da Igreja Católica irlandesa para enfrentar adequadamente o que chamou de “crimes repugnantes” de membros do clero local.

“Não posso deixar de reconhecer o grave escândalo causado na Irlanda pelos abusos a menores por parte de membros da Igreja encarregados de protegê-los e educá-los”, disse.

Francisco fez tal afirmação durante um discurso às autoridades irlandesas no início de sua visita de dois dias ao país, onde vai participar do Encontro Mundial das Famílias. Esta é a primeira viagem oficial de um papa à Irlanda em 39 anos.

Em seu discurso, Francisco também reconheceu que “o fracasso das autoridades eclesiásticas – bispos, superiores religiosos e sacerdotes – na hora de enfrentar adequadamente esses crimes repugnantes, suscitou justamente indignação e permanece como motivo de sofrimento e vergonha para a comunidade católica”. “Eu mesmo compartilho esses sentimentos”, completou ele.

Desde 2002, cerca de 14.500 pessoas se declararam vítimas de abusos sexuais cometidos por padres na Irlanda. A visita do papa à Irlanda também ocorre logo após a divulgação nos Estados Unidos de um relatório que aponta ao longo de 70 anos mil menores sofreram abuso sexual por parte de 300 sacerdotes. Recentemente, autoridades eclesiásticas do Chile e da Austrália também foram acusadas de acobertar abusos.

No salão de São Patrício no Castelo de Dublin, Francisco disse ainda que o seu antecessor, Bento 16, “não poupou palavras para reconhecer a gravidade da situação e solicitar que fossem tomadas medidas verdadeiramente evangélicas, justas e eficazes” em resposta a esta “traição de confiança”.

Além disso, o papa disse que tal pedido serve ainda para incentivar “os esforços das autoridades eclesiais para remediar os erros passados e adotar normas severas para garantir que os mesmos não voltem a acontecer”.

O papa lembrou que, em sua última carta a todos os católicos sobre os abusos, divulgada antes de sua viagem à Irlanda, “pediu empenho, inclusive um maior empenho, para acabar com este flagelo na Igreja e a qualquer custo moral e de sofrimento”.

No mesmo encontro, o primeiro-ministro irlandês, Leo Varadkar, pediu ao papa que use sua “posição e influência” para tentar fazer “justiça” às vítimas dos abusos cometidos por membros do clero no mundo inteiro.

“As feridas ainda estão abertas e há muito a ser feito para que as vítimas e sobreviventes obtenham justiça, verdade e cura. Santo Padre, peço que use sua posição e influência para conseguir este feito aqui na Irlanda e em todo o mundo”, declarou Leo Varadkar por ocasião da visita do pontífice à Irlanda. “Devemos garantir que as palavras sejam seguidas de ações”, insistiu em seu discurso.”É uma história triste e vergonhosa, uma mancha em nosso Estado, nossa sociedade e na Igreja Católica”, estimou Varadkar.

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Nas últimas décadas, a Igreja Católica irlandesa vem perdendo influência devido aos escândalos de pedofilia e à evolução dos costumes neste país de quase cinco milhões de habitantes.

No censo de 1981, dois anos após a histórica visita de João Paulo 2° à Irlanda, 93% da população do país dizia ser católica. No último censo, em 2016, o número de católicos tinha caído para 78%.

Francisco abordou esse declínio ao final do seu discurso desejando que a Irlanda “não se esqueça das vibrantes melodias da mensagem cristã que a sustentaram no passado e podem seguir fazendo o mesmo no futuro”.

Neste sábado, Francisco ainda vai liderar o Encontro das Famílias no estádio Croke Park de Dublin, onde mais de 80.000 pessoas são esperadas. No domingo (26/08), será a vez de celebrar a missa de encerramento do evento no Parque Phoenix, também na capital irlandesa, onde são esperados meio milhão de fiéis.

Protestos

Após a chegada do papa em Dublin, vários grupos de vítimas dos abusos organizaram protestos neste sábado na capital. Um desses atos ocorreu em frente ao Castelo de Dublin, onde o papa fez o discurso sobre a responsabilidade da Igreja.

O protesto foi organizado pela irlandesa Margaret McGuckin, sobrevivente dos abusos cometidos por religiosas no internato Casa de Nazaré e impulsora de um dos órgãos estatais de investigação de casos históricos de abusos.

“O papa tem agora que dar a cara e fazer algo pelas vítimas. Precisamos que sejam concedidas compensações, necessitamos que a Igreja se responsabilize”, declarou McGuckin à imprensa.

Esse processo deve contemplar também ações para “levar aos tribunais” os “bispos, sacerdotes, freiras e qualquer outra pessoa” envolvida com “o abuso de menores ou na ocultação dos abusos”, ressaltou a ativista.

Em sua opinião, as autoridades devem atuar com “tolerância zero” e impedir que a Igreja “investigue a si mesma”.

Outro grupo de manifestantes desfraldou hoje bandeiras e cartazes de protesto na Dame Street, na rota pela qual o papamóvel percorrerá as ruas de Dublin.

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