Sociedade

Marcos Goto, o arquiteto do ouro da ginástica latino-americana

Depois do título em Londres-2012, Arthur Zanetti ficou com a prata nos Jogos do Rio de Janeiro

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Por Rosa Sulleiro

Acaba a prova final das argolas e o ginasta Arthur Zanetti é medalha de prata, para a alegria de Marcos Goto, que acompanhou cada movimento do atleta como faz há 18 anos. Juntos, eles conquistaram o ouro em Londres-2012, o primeiro para a ginástica artística masculina latino-americana.

Este treinador de personalidade forte, negro e baixinho – 1,54 m de altura – prometeu a si mesmo que nada o pararia. A capoeira o levou à ginástica e o trabalho obsessivo fez dele o arquiteto dos melhores resultados para o continente na disciplina.

Levado por um amigo para treinar nos aparelhos da ginástica, nunca mais abandonou o esporte, apesar de já ter 21 anos, o que para esta disciplina duas décadas é uma eternidade.

O ginásio se tornou a sua vida e sua vida em um estudo obsessivo de uma disciplina centenária, que só pode ser decifrada com a ciência. “Eu sou baixinho, sou negro e se quero me destacar em algo tem que ser por meio do trabalho. Você não pode ficar esperando que o mundo venha ajudá-lo. Eu tive que estudar muito e constantemente provar que era capaz”, lembra ele em um dos assentos da Arena Olímpica do Rio.

Sua vida mudou pela segunda vez um dia, em 1999, quando conheceu uma criança de oito anos, tronco forte e agilidade chamada Arthur Zanetti.

Passaram-se quase duas décadas, um ouro olímpico e um título mundial e eles continuam no ginásio do São Caetano do Sul (na periferia de São Paulo), a oficina onde Goto lapidou o campeão e Zanetti embarcou em uma viagem para a elite da ginástica, onde muitas perguntas não são admitidas.

“O atleta está aqui para receber ordens, para ouvir o seu treinador, se peço alguma coisa não tem que responder o que ele acha. Você está trabalhando para ele, eu sempre trabalho para os meus atletas, independentemente de quem seja”, diz com gesto sério.

Nunca foi fácil a convivência na escuridão do ginásio, onde as repetições intermináveis, a dor e o cansaço tornam as relações humanas mais difíceis de manter do equilíbrio sobre as argolas.

De seu centro de treinamento já se foram vários atletas. Mas para este escudeiro discreto e avesso às câmeras e líder obcecado as sombras começam a cansá-lo. “É muito difícil estar em segundo plano porque, como um profissional, você estuda, investe toda a sua vida, deixa de lado a família muitas vezes e tudo é feito para o atleta”, lamenta.

Um sacrifício que para a maioria não leva à glória sonhada durante treinamentos infinitos, ficando relegado às aulas onde começou Goto até encontrar um campeão que ele garante que não procurava. “Arthur é um atleta diferente. Tudo o que ele conquista divide comigo, não é egoísta. Em cada entrevista, diz que o treinador faz parte de seus resultados. Ele me move a continuar a trabalhar com a ginástica”, diz.

Mas a porta de sua oficina de São Caetano recebeu há pouco mais de um mês um velho conhecido. Era Diego Hypólito, que após uma carreira que poderia ser brilhante chegava aos 30 anos para realizar o sonho olímpico, frustrado duas vezes. E deu certo, Diego conquistou a medalha de prata esta semana no solo no Rio-2016.

A situação era bastante delicada, uma vez que seu treinador acabava de ser afastado da seleção por denúncias de abuso sexual. 

Veteranos, Diego e Goto lançaram as bases do seu acordo: disciplina e poucas palavras. “Diego está treinando comigo agora e tornou-se ciente disso. Acredito no trabalho e tinha que ser assim: eu falo e ele faz. Se eu dissesse que teria que mergulhar de cabeça ele o faria”.

E fez. Suas imagens após a prova no solo, chorando com Goto os sacrifícios de uma vida, rodaram o mundo.

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