Sociedade

Grupo salafista banido na Alemanha atua no sul do Brasil

Organização “A Religião Verdadeira”, acusada de propagar radicalismo no país europeu, promove distribuição de exemplares do Alcorão em Florianópolis

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O grupo salafista “A Religião Verdadeira” (DWR, na sigla em alemão), que foi alvo de uma megaoperação policial na Alemanha na terça-feira 15 e acabou sendo oficialmente banido por ordem do governo, atua no Brasil desde junho deste ano.

A página do grupo no Facebook mostra que o líder da organização, o palestino naturalizado alemão Ibrahim Abou-Nagie, esteve em julho no País e participou de uma distribuição de exemplares do Alcorão nas ruas de Florianópolis.

O Ministério do Interior alemão afirmou que a DWR, que promove uma versão ultraconservadora do islã, “glorifica o assassinato e o terrorismo” e servia de fachada para o recrutamento de jovens para o grupo extremista “Estado Islâmico” (EI).

A DWR começou a ganhar notoriedade na Alemanha a partir de 2011, quando Abou-Nagie lançou o projeto “Leia!” (“Lies!”, em alemão) para distribuir 25 milhões de cópias do Alcorão no país.

Nos últimos anos, tornou-se comum ver voluntários do grupo (sempre do sexo masculino) distribuindo exemplares nas zonas de pedestres de cidades alemãs ao lado de cartazes que diziam: “Leia! A verdadeira palavra do teu Senhor!”.

Expansão para o Brasil

De acordo com a página brasileira do grupo no Facebook, a estratégia de distribuição na Alemanha foi exportada para Florianópolis. Fotografias mostram voluntários distribuindo exemplares em zona de pedestres da capital catarinense. A estrutura, os cartazes e as camisetas usadas pelos voluntários são exatamente os mesmos dos usados na Alemanha. A única adaptação foi a tradução dos slogans originalmente em alemão.

Fotografias mostram que os primeiros exemplares foram distribuídos no centro da capital na metade julho. A última campanha ocorreu no último sábado (12). Em uma das ações, o próprio Abou-Nagie, de 52 anos, que está com paradeiro desconhecido após as ações policiais desta terça-feira, participou dos esforços de distribuição.

Em um vídeo publicado na página, Nagie fala em alemão sobre a expansão do seu projeto em Florianópolis.

“Estamos começando aqui. É uma cidade muito bonita”, diz. Ele então pergunta para um homem ao seu lado, também alemão, se ele já havia imaginado que estaria no Brasil promovendo o projeto. O homem diz que não. Abou-Nagie então afirma: “Eu também nunca imaginei. Mas essa é a vontade de Alá. (…) Enfrentamos um voo de 17 horas, mas por Alá isso é um prazer.”

Em seguida, um representante brasileiro usa a câmera para falar da organização. “Este é um projeto que teve início na Alemanha e se expandiu para a Europa. É um projeto que teve um retorno muito bom. Cerca de 360 mil pessoas aderiram ao islã após conhecerem a verdade. Estamos agora iniciando aqui em Florianópolis.”

A DW entrou em contato com representantes do projeto “Leia!” no Brasil, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.

Além do Brasil, recentemente a DWR promoveu campanhas de distribuição do Alcorão num total de 15 países, incluindo França, Reino Unido, Suécia e Áustria.

Salafistas na Alemanha

A cena salafista, da qual a DWR faz parte, está em expansão na Alemanha. Segundo dados do governo, o movimento contava com 3.800 membros em 2011. Em julho de 2016, eram 8.900. O número é pequeno em comparação com o total de muçulmanos na Alemanha, que chega a 4 milhões, mas o governo já afirmou estar preocupado com a expansão do movimento e sua ideologia, que promove a sharia (a lei islâmica) e a rejeição aos valores ocidentais. Seguidores do movimento também se juntaram a grupos terroristas na Síria. 

No total, 820 pessoas deixaram a Alemanha para se filiarem a organizações terroristas na Síria desde o início da guerra no país, em 2011. Segundo o Ministério do Interior alemão, a DWR de Abou-Nagie foi responsável por recrutar pelo menos 140 pessoas. 

Em um vídeo publicado na página do grupo, o próprio Abou-Nagie afirma que “A democracia é contra o islã”.  Pregador sem formação teológica, ele chegou à Alemanha nos anos 1980 e se tornou cidadão alemão em 1994. Em 2003, ele afirmou que teve uma revelação e começou a promover a vertente salafista do islã no país. 

Em uma coletiva de imprensa nesta terça-feira 15, o ministro do Interior alemão, Thomas de Maizière, usou palavras duras para descrever a DWR e justificar o seu banimento. “Sob o pretexto de promover o islã, e sob o pretexto de uma distribuição supostamente inofensiva de traduções do Alcorão em zonas de pedestres, mensagens de ódio estavam sendo propagadas e pessoas estavam sendo radicalizadas”, afirmou.

O governo, no entanto, salientou que a ação desta terça-feira não visa proibir a difusão da crença muçulmana ou a distribuição do Alcorão, mas apenas o abuso da religião por ativistas radicais que propagam suas ideologias extremas ou apoiam organizações terroristas.

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