Sociedade

Gladiadores modernos

Lá se vão dois mil anos, mas continuamos os mesmos animais sedentos de sangue

Foto: Nagillum/Flickr
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“Indivíduo que nos circos romanos combatia com outros homens ou com feras, para divertimento público.”

Para quem escreve, é sempre bom ter ao lado um bom dicionário. O Aurélio, de que me valia, dava conta do recado. Hoje uso o Houaiss Eletrônico, que veio facilitar nossa vida. Mas então já sabemos quem são os gladiadores: o que faziam e para quê.

A coisa empaca é com o segundo termo do título, porque “moderno”, o que seja, quando e onde, já rendeu toneladas de papel e tinta de discussão. Por exemplo, essa última oração não pode ser considerada moderna porque meu avô já a usava? Não, caro leitor, não vou entrar na discussão do que seja moderno, nem onde ou quando. Moderno, aqui e para o que nos interessa, vem com a acepção de contemporâneo, atual. Algum leitor mais atento e mais crítico dirá: por quê, então, já não usou um desses termos no título? Ora, e que maneira melhor teria o cronista para levantar um assunto que talvez nunca tivesse ocorrido a muitos leitores?

Leia outras crônicas de Menalton Braff

Os gladiadores contemporâneos (viu como dá?) lutam de maneira diferente e não é em uma arena. Ou seja, a arena, hoje, não tem arquibancadas, como naqueles antanhos romanos. Hoje se usa uma casa, com muito lazer, muita cama e um pouco de piscina. As roupas é que continuam semelhantes: quase nenhuma. E a arquibancada, nos dias que correm, é o sofá de sua casa. O público, ah o público, é o mesmo: quer ver sangue, como naqueles velhos tempos, aqueles tempos de Césares. Nem sempre por ferimento de ferro, como costumava ser. De qualquer forma, ou com qualquer espada, o sangue sempre fornece um belo espetáculo para as galerias, que se debruçam felizes sobre o espetáculo da morte, que é dos outros e não a própria.

Há algumas diferenças que não se podem esquecer: os vencidos não saem da atual arena degolados, de maca ou arrastados. Devem sair com algum dinheiro no bolso, ou na bolsa, e mesmo que pouco, é o suficiente para chegar a casa cheios de glória e viver folgadamente por um bom tempo.

Pois meus caros, os gladiadores atuais já vêm perdendo a popularidade. E isso em detrimento dos lucros de seus patrões. Em estudo recente encetado por meu amigo Adamastor, o anão, ele chega a várias conclusões. Uma delas, e a primeira, é que as asneiras não têm sido suficientemente asnáticas para encantar e educar nosso respeitável público. Propõe-se, como solução, que se consulte, lá no além, o Stanislaw Ponte Preta, aquele que organizou o FEBEAPÁ (Festival de besteiras que assola o país). Não que ele dissesse besteiras, mas ninguém como ele sabia onde elas se escondem.

Outra proposta é que o sexo seja menos explícito. Isso causaria um efeito de estranhamento e poderia atrair mais público.

Agora, se o canal de televisão que assola o país quiser mesmo bater todos os recordes (recorde, minha gente, palavra paroxítona, certo?) de público, tem de botar mais um pouco de sangue nas cenas. O público continua o mesmo. Lá se vão dois mil anos, mas continuamos os mesmos animais sedentos de sangue. Como é que até hoje ninguém, entre tantos gênios da televisão, teve a idéia de usar um paredão real, com tiros reais, ou facadas, tudo dependendo da vítima e do dia da semana? Morte por afogamento, por exemplo, jamais. É cruel e não derrama sangue.

Nada melhor do que uma degola ao vivo para alegrar nosso respeitável público.

“Indivíduo que nos circos romanos combatia com outros homens ou com feras, para divertimento público.”

Para quem escreve, é sempre bom ter ao lado um bom dicionário. O Aurélio, de que me valia, dava conta do recado. Hoje uso o Houaiss Eletrônico, que veio facilitar nossa vida. Mas então já sabemos quem são os gladiadores: o que faziam e para quê.

A coisa empaca é com o segundo termo do título, porque “moderno”, o que seja, quando e onde, já rendeu toneladas de papel e tinta de discussão. Por exemplo, essa última oração não pode ser considerada moderna porque meu avô já a usava? Não, caro leitor, não vou entrar na discussão do que seja moderno, nem onde ou quando. Moderno, aqui e para o que nos interessa, vem com a acepção de contemporâneo, atual. Algum leitor mais atento e mais crítico dirá: por quê, então, já não usou um desses termos no título? Ora, e que maneira melhor teria o cronista para levantar um assunto que talvez nunca tivesse ocorrido a muitos leitores?

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Os gladiadores contemporâneos (viu como dá?) lutam de maneira diferente e não é em uma arena. Ou seja, a arena, hoje, não tem arquibancadas, como naqueles antanhos romanos. Hoje se usa uma casa, com muito lazer, muita cama e um pouco de piscina. As roupas é que continuam semelhantes: quase nenhuma. E a arquibancada, nos dias que correm, é o sofá de sua casa. O público, ah o público, é o mesmo: quer ver sangue, como naqueles velhos tempos, aqueles tempos de Césares. Nem sempre por ferimento de ferro, como costumava ser. De qualquer forma, ou com qualquer espada, o sangue sempre fornece um belo espetáculo para as galerias, que se debruçam felizes sobre o espetáculo da morte, que é dos outros e não a própria.

Há algumas diferenças que não se podem esquecer: os vencidos não saem da atual arena degolados, de maca ou arrastados. Devem sair com algum dinheiro no bolso, ou na bolsa, e mesmo que pouco, é o suficiente para chegar a casa cheios de glória e viver folgadamente por um bom tempo.

Pois meus caros, os gladiadores atuais já vêm perdendo a popularidade. E isso em detrimento dos lucros de seus patrões. Em estudo recente encetado por meu amigo Adamastor, o anão, ele chega a várias conclusões. Uma delas, e a primeira, é que as asneiras não têm sido suficientemente asnáticas para encantar e educar nosso respeitável público. Propõe-se, como solução, que se consulte, lá no além, o Stanislaw Ponte Preta, aquele que organizou o FEBEAPÁ (Festival de besteiras que assola o país). Não que ele dissesse besteiras, mas ninguém como ele sabia onde elas se escondem.

Outra proposta é que o sexo seja menos explícito. Isso causaria um efeito de estranhamento e poderia atrair mais público.

Agora, se o canal de televisão que assola o país quiser mesmo bater todos os recordes (recorde, minha gente, palavra paroxítona, certo?) de público, tem de botar mais um pouco de sangue nas cenas. O público continua o mesmo. Lá se vão dois mil anos, mas continuamos os mesmos animais sedentos de sangue. Como é que até hoje ninguém, entre tantos gênios da televisão, teve a idéia de usar um paredão real, com tiros reais, ou facadas, tudo dependendo da vítima e do dia da semana? Morte por afogamento, por exemplo, jamais. É cruel e não derrama sangue.

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