Sociedade

Os exemplos que o Brasil pode mirar para se tornar uma potência olímpica

Não há um modelo absoluto, mas EUA, Coréia do Sul, Austrália e países da Europa Ocidental são fontes importantes para o País ser bem sucedido no futuro

Brittney Reese, americana campeã no salto em distância, estudou em universidades públicas do Mississippi. Foto: Adrian Dennis / AFP
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Encerrados os Jogos Olímpicos de Londres, o quadro de medalhas de 2012 mostra uma vitória imponente dos Estados Unidos. São 104 pódios, com 46 ouros, superando com folga a China (88 pódios e 38 ouros), resultado que devolve aos EUA a supremacia olímpica que vinha sendo conquistada desde 1996, quando as ex-repúblicas soviéticas deixaram de competir em conjunto, e foi interrompida em Pequim-2008 – quando a China superou os americanos em ouros (51 a 36), mas não no total de medalhas. Não faltam analistas para dizer que os americanos são o exemplo a ser seguido para o esporte olímpico brasileiro, mas a realidade é um pouco mais complexa. Para isso, precisamos compreender como funciona o esporte de alto rendimento nos EUA e em outras potências.

Os defensores do Estado mínimo adorariam acreditar que a hegemonia norte-americana possa ser entendida como o triunfo de um sistema sem Ministério do Esporte e no qual há pouquíssimo dinheiro do governo federal envolvido, mas as coisas não são bem assim.

Em primeiro lugar, é preciso considerar que os bons resultados esportivos só surgem acompanhados de investimentos bem feitos. No caso do esporte olímpico, a eficiência não é exclusividade do dinheiro privado. Diversas potências olímpicas contam com grandes investimentos estatais. Os casos mais óbvios são os da China e da Rússia, mas não é preciso recorrer aos exemplos extremos do país comunista e da principal herdeira da União Soviética para ver dinheiro público aplicado no esporte. O governo da Coreia do Sul, quinta colocada em Londres (28 medalhas, 13 de ouro), investe pesado no setor. As grandes apostas são três imensos centros de treinamento no qual atletas com mais de 15 anos podem se dedicar em tempo integral ao esporte. Na Alemanha (44 medalhas, 11 de ouro), o esporte de alto nível recebe dinheiro do governo federal, de loterias federais e das Forças Armadas. Na Itália (28 medalhas, 8 de ouro), o Comitê Olímpico recebeu, apenas para o orçamento de 2012, mais de 400 milhões de euros. Na Austrália (35 medalhas, 7 de ouro), os três níveis de governo gastam cerca de 2 bilhões de dólares por ano com esporte, a maior parte construindo e mantendo instalações esportivas públicas, mas também financiando atletas de elite.

Em segundo lugar, cabe ponderar a pequena participação do governo federal dos Estados Unidos no esporte. Isso ocorre porque a Constituição norte-americana é muito clara ao deixar a educação sob a tutela dos governos estaduais. Assim, são os estados (e em menor medida os governos municipais) os responsáveis por construir e manter equipamentos esportivos e, principalmente, subsidiar escolas e universidades públicas. Boa parte desses subsídios é usada para pagar salários de treinadores de alto nível, reduzir as mensalidades e conceder bolsas de estudos para atletas, estratégias usadas para atrair jovens esportistas. Essas instituições públicas, em conjunto com algumas instituições independentes (geralmente ligadas a fundações religiosas) e privadas, são a principal fonte de talentos para o esporte profissional norte-americano. Dos sete campeões olímpicos dos EUA em provas individuais no atletismo em Londres, cinco estudaram em universidades públicas, um em universidade privada e outro em uma instituição independente.

A grande importância do dinheiro público no esporte norte-americano não significa que os investimentos privados são irrelevantes. Tanto pessoas físicas como empresas contribuem muito para o país ser a maior potência olímpica. O esporte e a competição esportiva são conceitos arraigados na sociedade americana. Doadores privados são os responsáveis por sustentar, por exemplo, o Centro Aquático do Norte de Baltimore, onde começou a nadar aos dez anos Michael Phelps, o maior medalhista olímpico de todos os tempos. Mais de 30 empresas são as responsáveis por patrocinar, e sustentar integralmente, o Comitê Olímpico dos EUA.

O que esses exemplos dizem ao Brasil? Como mostrou recente reportagem da revista CartaCapital, o foco do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) hoje em dia são os atletas de elite, aqueles com potencial para subir ao pódio nos Jogos. O COB, e os governos municipais, estaduais e federal, se preocupam muito pouco em estabelecer políticas públicas para popularizar e democratizar a prática esportiva, gerando benefícios para a sociedade e ampliando a base de futuros medalhistas. O  COB pensa a curto prazo. No domingo 12, o superintendente da entidade, Marcus Vinícius Freire, afirmou que um exemplo a ser seguido pelo Brasil é o do Cazaquistão. O governo cazaque investiu, segundo reportagem da Folha de S.Paulo, 20 milhões de dólares no levantamento de peso, no ciclismo e no boxe para tornar o país referência nessas modalidades. Conseguiu 13 medalhas nos Jogos, nove nesses três esportes, sendo seis de ouro. Chegou ao 12º lugar no quadro de medalhas com um investimento rápido, porém sem reflexos positivos para a sociedade.

O Brasil, sede dos Jogos de 2016, tem uma série de bons exemplos para seguir. Pode copiar dos europeus e sul-coreanos a forma correta de tratar os atletas de elite; dos australianos, pode aprender como combinar o investimento no alto rendimento e no esporte como política pública; dos norte-americanos, como atrair a iniciativa privada para o negócio e como engajar a sociedade no incentivo aos jovens atletas. Enquanto o Estado brasileiro, em todos os níveis, continuar negligenciando a educação e, com ela, o esporte, e o COB mantiver seu foco apenas na conquista de medalhas, continuarão abastecendo as críticas daqueles que desejam afastar o Estado de tudo, incluindo do esporte, uma atividade capaz de reduzir a criminalidade, melhorar a saúde da população, unir a sociedade e formar pessoas.

Encerrados os Jogos Olímpicos de Londres, o quadro de medalhas de 2012 mostra uma vitória imponente dos Estados Unidos. São 104 pódios, com 46 ouros, superando com folga a China (88 pódios e 38 ouros), resultado que devolve aos EUA a supremacia olímpica que vinha sendo conquistada desde 1996, quando as ex-repúblicas soviéticas deixaram de competir em conjunto, e foi interrompida em Pequim-2008 – quando a China superou os americanos em ouros (51 a 36), mas não no total de medalhas. Não faltam analistas para dizer que os americanos são o exemplo a ser seguido para o esporte olímpico brasileiro, mas a realidade é um pouco mais complexa. Para isso, precisamos compreender como funciona o esporte de alto rendimento nos EUA e em outras potências.

Os defensores do Estado mínimo adorariam acreditar que a hegemonia norte-americana possa ser entendida como o triunfo de um sistema sem Ministério do Esporte e no qual há pouquíssimo dinheiro do governo federal envolvido, mas as coisas não são bem assim.

Em primeiro lugar, é preciso considerar que os bons resultados esportivos só surgem acompanhados de investimentos bem feitos. No caso do esporte olímpico, a eficiência não é exclusividade do dinheiro privado. Diversas potências olímpicas contam com grandes investimentos estatais. Os casos mais óbvios são os da China e da Rússia, mas não é preciso recorrer aos exemplos extremos do país comunista e da principal herdeira da União Soviética para ver dinheiro público aplicado no esporte. O governo da Coreia do Sul, quinta colocada em Londres (28 medalhas, 13 de ouro), investe pesado no setor. As grandes apostas são três imensos centros de treinamento no qual atletas com mais de 15 anos podem se dedicar em tempo integral ao esporte. Na Alemanha (44 medalhas, 11 de ouro), o esporte de alto nível recebe dinheiro do governo federal, de loterias federais e das Forças Armadas. Na Itália (28 medalhas, 8 de ouro), o Comitê Olímpico recebeu, apenas para o orçamento de 2012, mais de 400 milhões de euros. Na Austrália (35 medalhas, 7 de ouro), os três níveis de governo gastam cerca de 2 bilhões de dólares por ano com esporte, a maior parte construindo e mantendo instalações esportivas públicas, mas também financiando atletas de elite.

Em segundo lugar, cabe ponderar a pequena participação do governo federal dos Estados Unidos no esporte. Isso ocorre porque a Constituição norte-americana é muito clara ao deixar a educação sob a tutela dos governos estaduais. Assim, são os estados (e em menor medida os governos municipais) os responsáveis por construir e manter equipamentos esportivos e, principalmente, subsidiar escolas e universidades públicas. Boa parte desses subsídios é usada para pagar salários de treinadores de alto nível, reduzir as mensalidades e conceder bolsas de estudos para atletas, estratégias usadas para atrair jovens esportistas. Essas instituições públicas, em conjunto com algumas instituições independentes (geralmente ligadas a fundações religiosas) e privadas, são a principal fonte de talentos para o esporte profissional norte-americano. Dos sete campeões olímpicos dos EUA em provas individuais no atletismo em Londres, cinco estudaram em universidades públicas, um em universidade privada e outro em uma instituição independente.

A grande importância do dinheiro público no esporte norte-americano não significa que os investimentos privados são irrelevantes. Tanto pessoas físicas como empresas contribuem muito para o país ser a maior potência olímpica. O esporte e a competição esportiva são conceitos arraigados na sociedade americana. Doadores privados são os responsáveis por sustentar, por exemplo, o Centro Aquático do Norte de Baltimore, onde começou a nadar aos dez anos Michael Phelps, o maior medalhista olímpico de todos os tempos. Mais de 30 empresas são as responsáveis por patrocinar, e sustentar integralmente, o Comitê Olímpico dos EUA.

O que esses exemplos dizem ao Brasil? Como mostrou recente reportagem da revista CartaCapital, o foco do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) hoje em dia são os atletas de elite, aqueles com potencial para subir ao pódio nos Jogos. O COB, e os governos municipais, estaduais e federal, se preocupam muito pouco em estabelecer políticas públicas para popularizar e democratizar a prática esportiva, gerando benefícios para a sociedade e ampliando a base de futuros medalhistas. O  COB pensa a curto prazo. No domingo 12, o superintendente da entidade, Marcus Vinícius Freire, afirmou que um exemplo a ser seguido pelo Brasil é o do Cazaquistão. O governo cazaque investiu, segundo reportagem da Folha de S.Paulo, 20 milhões de dólares no levantamento de peso, no ciclismo e no boxe para tornar o país referência nessas modalidades. Conseguiu 13 medalhas nos Jogos, nove nesses três esportes, sendo seis de ouro. Chegou ao 12º lugar no quadro de medalhas com um investimento rápido, porém sem reflexos positivos para a sociedade.

O Brasil, sede dos Jogos de 2016, tem uma série de bons exemplos para seguir. Pode copiar dos europeus e sul-coreanos a forma correta de tratar os atletas de elite; dos australianos, pode aprender como combinar o investimento no alto rendimento e no esporte como política pública; dos norte-americanos, como atrair a iniciativa privada para o negócio e como engajar a sociedade no incentivo aos jovens atletas. Enquanto o Estado brasileiro, em todos os níveis, continuar negligenciando a educação e, com ela, o esporte, e o COB mantiver seu foco apenas na conquista de medalhas, continuarão abastecendo as críticas daqueles que desejam afastar o Estado de tudo, incluindo do esporte, uma atividade capaz de reduzir a criminalidade, melhorar a saúde da população, unir a sociedade e formar pessoas.

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