Sociedade

Esperança e persistência: a mensagem dos jovens da Amazônia para o mundo

Jovens ribeirinhos se reuniram para discutir soluções para os problemas em comunidades no coração da Amazônia

Maria Cunha, estudante conhecida como a "Greta da Amazônia" (FOTO: FLORENCE GOISNARD / AFP)
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Dias antes de o novo coronavírus parar o mundo, jovens ribeirinhos se reuniram para discutir soluções para os problemas em comunidades no coração da Amazônia, onde moram, estudam e trabalham. Em uma região castigada por queimadas no ano passado, temas como mudanças climáticas, desenvolvimento sustentável e economia da floresta dominaram os debates.

Organizado pela ONG Fundação Amazonas Sustentável (FAS), o I Congresso da Juventude da Floresta reuniu, entre 13 e 15 de março, 287 jovens de nove municípios na comunidade Bauana, a três horas de lancha de Carauari, distante 788 quilômetros de Manaus.

Da floresta exuberante onde querem permanecer, três destes jovens – Maria, Kélita e Fábio – enviaram para o mundo uma mensagem de esperança e persistência.

A “Greta” da Amazônia

Maria Cunha, 26 anos, mora na comunidade São Raimundo, na Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Uacari, em Carauari. Com 632.949 hectares, a reserva abriga 358 famílias em 30 comunidades ribeirinhas, que vivem do extrativismo e da pesca. Técnica em produção sustentável e agente ambiental voluntária, Maria, que promove ações como coleta de lixo, já visitou São Paulo, mas não cogita deixar a floresta.

Para ela, preservar a Amazônia é trabalhar com suas populações, que há gerações vivem em harmonia com a natureza. “Nós somos os guardiões da floresta. A gente vive aqui e depende dela para praticamente toda nossa subsistência. Se a gente não cuidar das nossas florestas, do que vai viver?”, questiona.

 

As mudanças que ela vê na Amazônia, como o calor, mais intenso do que o normal, e o nível dos rios, preocupam a jovem. “A alimentação está a cada dia mais difícil. Quando a água não sobe, os peixes não aparecem, e a comunidade fica com pouco alimento porque nossa maior (fonte de) subsistência é o peixe”, explica à AFP.

A escassez também afeta os animais silvestres, conta ela, “Eles buscam alimento no quintal da nossa casa porque não encontram mais com tanta rapidez na floresta por causa das queimadas, do desmatamento”, relata Maria. “Sem nossas ações como agentes ambientais voluntários, tudo pode acabar num futuro próximo”, adverte.

A filha pródiga

Aos 13 anos, Kélita do Carmo decidiu ir para a cidade em busca de oportunidades. Deixou Bauana, comunidade rural com casas de palafita às margens do rio Juruá, e foi para Manaus trabalhar como babá. Viveu lá oito meses, mas não se adaptou. Hoje, com 22 anos, quer ser professora e se prepara para começar a faculdade no núcleo educacional próximo à sua comunidade.

“Ultimamente estou valorizando as coisas daqui. Depois que voltei, as lutas dos movimentos sociais trouxeram o curso de Pedagogia do Campo para cá”, conta. O curso, uma parceria entre a FAS e a Universidade do Estado do Amazonas (UEA), é o primeiro de ensino superior na floresta. Foi criado para formar professores caboclos, diante da falta de profissionais nas escolas locais.

Kelita do Carmo assistindo uma das aulas do curso de Pedagogia (Foto: FLORENCE GOISNARD / AFP)

Além das disciplinas regulares, o currículo inclui outras matérias voltadas para a realidade local, como permacultura e agroecologia. Em março, os 45 alunos da primeira turma começaram as aulas, que foram suspensas para evitar a chegada do coronavírus. Para Kélita, a floresta oferece perspectivas: estudo e renda sustentável, com extrativismo e planos de manejo.

Ribeirinho, com orgulho

Vizinho de Kélita, Fábio Gondim, 16 anos, tem a desenvoltura de um adulto no campo. Enquanto aguarda as aulas na mesma faculdade, o rapaz, que pretende ser professor de matemática, ajuda familiares na colheita do açaí e no cultivo de mandioca para produzirem a farinha que consomem e vendem.

Como um atleta, escala em poucos minutos uma palmeira de açaí com cerca de dez metros. “Nunca passou pela minha cabeça sair do Bauana. Não tenho vontade de morar na cidade. Aqui tudo é mais fácil. A alimentação, a renda que a gente extrai da floresta…”, afirma. Preocupada com as mudanças climáticas, sua comunidade se adapta.

“A gente trabalha com farinha (de mandioca) e precisa desmatar um pouco para nosso sustento. Nos últimos anos, tentamos minimizar o desmatamento para não sofrer com o aquecimento global”, explica. O extrativismo de andiroba, murumuru e açaí complementam a renda sem desmatamento.

Ao ser questionado sobre o que diria aos jovens preocupados com a floresta, responde: “Continuem lutando pela Amazônia, porque isso aqui é o que está sustentando o mundo”.

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