Sociedade
Entre Jesus e Marx
O dominicano Paul Blanquart aliava a devoção aos princípios cristãos e o exercício do espírito crítico
No dia 15 de janeiro de 1970, em Paris, um encontro na mítica sala Mutualité, no Quartier Latin, reuniu intelectuais numa tribuna com uma grande faixa na qual se lia: Solidarité avec le peuple brésilien en lutte. Jean-Paul Sartre, o grande filósofo existencialista, era o mais eminente dos oradores. Atrás da mesa, uma imensa foto de Carlos Marighella ilustrava a reunião. O revolucionário fora executado por Sérgio Paranhos Fleury em 4 de novembro de 1969, em São Paulo, e diversos dominicanos do convento das Perdizes haviam sido encarcerados e torturados por prestar apoio logístico à Ação Libertadora Nacional de Marighella.
No mesmo encontro foi lançada a “Frente Brasileira de Informação” (Front Brésilien d’Information-FBI), dirigida por Miguel Arraes, Violeta Arraes e pelo ex-deputado Márcio Moreira Alves. O primeiro boletim da FBI, intitulado La lutte du peuple brésilien, foi distribuído com os discursos dos participantes, além de informações sobre o Brasil e a luta contra a ditadura e a tortura. Apenas um brasileiro estava na tribuna: Arraes, exilado na Argélia desde o golpe de 1964. Sartre e o também filósofo Michel de Certeau fizeram discursos memoráveis. Eles se dirigiam a franceses e a centenas de exilados brasileiros que lotavam a sala. Como eles, tomaram a palavra Jan Talpe, Pierre Jalée e Jean-Jacques de Félice, além de Arraes. Na tribuna, ao lado dos oradores, o frade dominicano Paul Blanquart, filósofo e marxista, um dos organizadores do encontro. O discurso de Miguel Arraes tinha a marca de Blanquart.
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