Sociedade

Enquanto no mundo avança a semana de 4 dias de trabalho, redução de jornada ’empaca’ no Brasil

Projetos no Congresso, mesmo sem serem tão ‘revolucionários’ como os adotados em outros locais, estão sem avanço prático nos últimos anos

O trabalhador paga a conta (Foto: Camila Domingues/Fotos Públicas)
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Enquanto o “sextou” começa cada vez mais cedo pelo mundo, a redução da jornada de trabalho empaca no Brasil. Projetos que encurtam a carga do trabalhador – mesmo sem serem tão revolucionários como a semana de trabalho de apenas quatro dias que começa a se popularizar – estão parados no Congresso, e o tema não consta nos debates do Executivo.

Entre senadores e deputados o tema é antigo, apesar de nunca ter sido levado para frente. Atualmente existem pelo menos dois projetos em tramitação no Congresso Nacional que propõem a redução da jornada de trabalho. Mas eles não avançam.

O primeiro é de 25 anos atrás, protocolado pelo então deputado Paulo Paim (PT-RS), hoje senador. A proposta era instituir um limite de 6 horas diárias ou trinta horas semanais de trabalho com a garantia de que o salário não seria diminuído. Atualmente, a jornada de trabalho oficial brasileira é de oito horas diárias, ou no máximo 44 horas semanais – patamar em vigor desde a Constituição de 1988, que acabou com a jornada semanal de 48 horas.

Além disso, o projeto de Paim permitiria que essa carga fosse aplicada aos servidores públicos e militares. Na época o parlamentar argumentava que a redução seria uma forma de garantir qualidade de vida para o trabalhador e aumentar o número de empregados.

“Uma jornada de seis horas poderá, sem muito esforço, ser contínua, atendendo interesses dos trabalhadores e empresários. Os empresários poderão utilizar suas instalações durante seis horas, praticamente sem interrupções, otimizando o uso das instalações, da energia e dos insumos”, citou o parlamentar na justificativa da proposta.

Ao longo do tempo, trinta outros projetos foram apensados a este original por conter propostas no mesmo sentido. Inclusive o atual senador Paim apresentou uma proposta com as mesmas características no Senado que também acabou não avançando na tramitação.

Flavio Aldred Ramacciotti, sócio do escritório Chediak Advogados e especialista em direito do trabalho, ressalta que uma mudança na jornada de trabalho seria melhor se fosse feita por conta de uma alteração na cultura empresarial e não por força da lei.

“Entendo que isso deveria ser algo definido por empresa. Se ela entendesse que quer dar qualidade de vida melhor para o trabalhador com uma jornada menor, ou quer pagar um salário proporcionalmente menor”, disse.

Nova proposta

Uma proposta que propõe redução de jornada, mas não foi juntada ao primeiro projeto foi apresentada em 2019 pelo deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) e previa limite de trabalho de oito horas diárias e 36 por semana.

Diferente do projeto do Paim, que previa a validade da lei assim que ela fosse publicada no Diário Oficial, o de Lopes dá um prazo grande para adequação: 10 anos. O deputado justifica que a redução tem potencial de preservar e criar empregos de qualidade.

Segundo o parlamentar, a redução da jornada de trabalho trouxe benefícios ao redor do mundo e é uma oportunidade de “democratizar” o acesso ao trabalho.

“Isso é uma discussão sobre a ética da tecnologia, da inteligência artificial. Ela é um imperativo ao século 21, mas para melhorar a vida das pessoas, o avanço tecnológico a favor do povo e não o povo a favor do avanço da tecnologia”, disse Lopes

O especialista em direito do trabalho da Chediak Advogados lembra que a redução de jornada feita pela Constituição Federal em 1988 aconteceu sem período de transição, mas ressalta que se houver mudança, esse tempo seria positivo.

“De qualquer forma, um período de adaptação é sempre bem-vindo para os negócios conseguirem refazer o planejamento porque isso muda muito na vida das empresas”, afirmou.

Sem avanço

Nenhum dos dois projetos avançou muito em sua tramitação na Câmara dos Deputados. O primeiro está parado na Comissão de Seguridade Social e Família desde 2019 e o segundo aguarda designação do relator na Comissão de Constituição e Justiça também há três anos. Não chegaram perto de serem analisados no plenário, última instância para aprovação de projetos na casa.

Reginaldo Lopes, do PT, disse que a proposta não teve avanços por conta do governo Jair Bolsonaro, que não tem “empatia popular” e é “desconectado com o mundo real”.

“É impossível ter avanço civilizatório, trazer pautas do século 21 para um governo que não tem a mínima capacidade de elaboração e empatia pela realidade”, afirmou.

Lopes ressaltou que não fala pelo programa do ex-presidente Lula, agora candidato à presidência, mas afirmou que, caso eleito, precisará debater novas ideias estruturais.

“É fundamental que o presidente Lula faça mais mudanças estruturais na sociedade brasileira e que essas mudanças sejam do estado brasileiro para além do seu governo, além dos 4 anos”, disse.

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