Em meio ao frio, moradores de rua relatam sofrimento sob a gestão Doria

Equipes da prefeitura têm retirado cobertores e colchões. Reportagem da rádio CBN presenciou limpeza com jatos de água na Praça da Sé

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“Sempre acabam levando os pertences das pessoas. Levam cobertores, levam colchões, levam tudo”, diz Agemiro Primo Passos, 39 anos, que atualmente está em situação de rua em São Paulo.

Apesar da portaria que proíbe equipes de zeladoria e da Guarda Civil Metropolitana (GCM) de retirarem cobertores e objetos pessoais, isso tem sido feito “sistematicamente” pelas equipes da gestão João Doria (PSDB), afirma o padre Júlio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo de Rua. A prefeitura nega.

Com mínima de 7,9 graus, a madrugada desta quarta-feira foi a mais fria do ano na capital paulista, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). A medição foi feita no mirante de Santana, na zona norte, onde o Inmet tem uma estação.

De acordo com Lancellotti, ao menos três pessoas em situação de rua morreram nas duas últimas semanas por conta do frio. Somente na tarde de terça-feira 18, a segunda mais fria em 13 anos (mínima de 10,2 graus), dois homens foram encontrados mortos na região de Pinheiros, na zona oeste.

Reportagem veiculada nesta quarta-feira 19 pela rádio CBN informa que pessoas em situação de rua que dormiam na Praça da Sé, no centro de São Paulo, foram acordadas pela manhã com equipes de limpeza da prefeitura no local. A repórter Camila Olivo relatou que presenciou o momento em que os agentes começaram uma limpeza com água.


“Exatamente às 7h da manhã, o caminhão de limpeza, um caminhão-pipa da prefeitura, passou jogando jatos de água na Praça da Sé e ainda havia muitas pessoas dormindo no chão e nas muretas”, disse a repórter. “É uma prática habitual que continua no inverno”, explicou ela.

A jornalista informou, ainda, que no momento da ação não havia equipes da Assistência Social no local, nem Polícia Miliar ou GCM. Conforme depoimentos, a limpeza acontece também de madrugada e, embora os jatos de água não atinjam as pessoas diretamente, acabam acertando seus pertences.

“Não dá nem tempo de levantar. Quando eles chegam, molham as coisas. Meu cobertor ficou encharcado. Sempre que isso acontece, a gente perde tudo”, disse um morador de rua à CBN.

A prefeitura nega que a limpeza ocorra também às madrugadas. O prefeito regional da Sé, Eduardo Odloak, afirmou à rádio que vai apurar o procedimento e que a orientação é para as equipes abordarem os moradores de rua antes de começar a limpeza.

A prefeitura oferece 11.800 vagas em abrigos e afirma que também distribuirá cobertores. Pesquisa realizada em 2015 pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) apontou que em São Paulo há quase 16 mil pessoas vivendo nas ruas.

Em 2016, a gestão do então prefeito Fernando Haddad (PT) também foi acusada de retirar pertences da população de rua. O petista foi fortemente criticado por dizer que a GCM estava orientada a “não deixar favelizar praças públicas”. Diante da pressão, o protocolo de abordagem da GCM foi alterado.

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