Sociedade

Decisão favorável a Ustra é licença para tortura, diz viúva de Merlino

Angêla Mendes de Almeida acredita que ambiente político atual pode ter influenciado TJ-SP a derrubar condenação de torturador

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A decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo de derrubar a condenação de Carlos Alberto Brilhante Ustra por comandar sessões de tortura que levaram ao assassinato do jornalista Luiz Eduardo Merlino em 1971 causou revolta entre seus familiares.

Ângela Mendes de Almeida, viúva do jornalista assassinado pela ditadura, afirma que a decisão desta quarta-feira 17 é uma espécie de “licença para torturar”. “Eles desqualificaram os testemunhos de vários presos que estiveram próximos de Merlino sob o argumento de que eram presos. É um escândalo. Ao mesmo tempo que desqualificaram a tortura dele, desqualificaram a tortura sofrida por outros militantes na mesma época”, afirmou a CartaCapital pouco após o julgamento no TJ-SP.

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Na sede do DOI-Codi, chefiado por Ustra entre 1969 e 1974, Merlino sofreu intensas sessões de tortura. Segundo ex-companheiros de prisão, o jornalista morreu em decorrência de gangrena em uma das pernas. Os militares teriam proibido os médicos de amputarem a perna gangrenada, o que resultou em sua morte. 

Morto em 2015, Ustra havia sido condenado por danos morais em primeira instância em 2012. Ele foi sentenciado a pagar uma indenização de 100 mil reais aos familiares de Merlino. Nesta quarta-feira 17, os desembargadores da 13ª Câmara Extraordinária Cível decidiram que o pedido está prescrito, pois foi feito em 2010, mais de 20 anos depois da Constituição de 1988, que reconheceu a anistia dos crimes praticados durante a ditadura.  

Ustra já foi, porém, condenado por danos morais pelo mesmo tribunal em outro caso semelhante. Em 2012, o TJ de São Paulo manteve sentença de primeira instância que reconheceu a responsabilidade do ex-coronel pela tortura de César Augusto Teles, Maria Amélia de Almeida Teles e Criméia Alice Schmidt de Almeida. 

Em 2014, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que Ustra poderia ser responsabilizado por danos morais decorrentes de tortura, apesar da Lei da Anistia de 1979. “A decisão surpreende do ponto de vista jurídico, pois o STJ já havia decidido que não há prescrição nesse caso, para não falar nos organismos internacionais”, lembra Ângela.

A nova decisão ocorre em meio a uma disputa presidencial em que o candidato favorito a ocupar o Planalto, Jair Bolsonaro, defende as torturas praticadas por Ustra e já classificou a obra “Verdade Sufocada” como seu “livro de cabeceira”. “A posição do TJ poderia ter sido diferente se não estivéssemos neste momento”, diz Ângela. “É um jogo de hipóteses que nunca serão verificadas, mas acredito que o ambiente atual teve influência nesse veredicto”. 

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