Sociedade

Congresso da UNE terá Glenn Greenwald e ânimo acirrado antigoverno

Prisão de Lula é injusta e políticas de Bolsonaro são contra a nossa geração, diz Marianna Dias

Foco do movimento estudantil será a radicalização da oposição ao governo de Michel Temer e lutar pelas Diretas Já. 'Será uma gestão das ruas', afirma
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Com Brasília agitada diante da votação da reforma da Previdência pelos deputados e das revelações de certas conversas secretas de Sérgio Moro quando juiz, a União Nacional dos Estudantes (UNE) realiza na cidade o seu congresso bienal. Será de 10 a 14 de julho na UnB, a Universidade da Balbúrdia, segundo o ministro da Educação, Abraham Weintraub, tido pela UNE como inimigo e devidamente ignorado na lista de convidados do evento.

Glenn Greenwald, não. O responsável por tirar o sono de Moro será uma das estrelas na UNE. Participará na quinta-feira 11 à tarde de debate organizado na correria, sobre “Poderes, segredos e democracia: A publicação de fatos de interesse público e a informação como direito básico”. Ao mesmo tempo em que Ciro Gomes (PDT), Guilherme Boulos (PSOL) e João Pedro Stédile (MST) vão discutir “O Brasil a preço de banana: entreguismo e destruição da soberania nacional”.

Uma recente pesquisa Datafolha mostra que o mau humor dos estudantes com Moro é bem maior do que o da maioria da população. Para 59% deles, o ex-juiz deveria deixar o posto de ministro da Justiça, enquanto a média geral entre os brasileiros é de 38%.

Na entrevista a seguir, a presidente da UNE, Marianna Dias, que se despedirá do cargo após dois anos de mandato, fala do caso Intercept, do governo Bolsonaro e do evento em Brasília.

CartaCapital: Qual será a marca desse congresso da UNE?

Marianna Dias: A principal é a gente reafirmar o quanto que defender a educação é a responsabilidade dessa geração da UNE. A defesa da universidade é o centro do congresso, principalmente por estar sendo realizado em uma universidade tão atacada, que é a UnB, que estava desde o início naquela lista inicial de universidades em que o governo considera que existe balbúrdia. Vamos reunir os estudantes que estiveram nos protestos [contra os cortes de verba na educação] para que a gente possa reafirmar nossa missão como entidade e criar também uma agenda de lutas no próximo período.

CC: Essa agenda de lutas tem a reforma da Previdência? A reforma está prestes a ser aprovada na Câmara.

MD: Nós vamos fazer uma passeata na Esplanada dos Ministérios no dia 12 [de julho, sexta-feira]. O tema será “Não mate o nosso futuro: educação, emprego e aposentadoria”. A gente sabe o quanto é nociva a reforma da Previdência para o futuro dos jovens, que são os principais membros da UNE. Então, a reforma é sem dúvida nenhuma uma das principais pautas. Assim como as universidades têm sido atacadas, os direitos dos trabalhadores, a aposentadoria têm sido atacados pelo mesmo governo. O mês de agosto será um mês de protesto, nós vamos aprovar no congresso que seja, em agosto tem o dia do estudante [dia 11], é aniversário da UNE…

CC: Por que o convite ao Glenn Greenwald para participar do congresso?

MD: É importante o papel que ele tem cumprido na informação acerca do que tem acontecido nos bastidores da política. A UNE é defensora de que o povo seja informado das coisas que acontecem no País. E ele [Greenwald] já deu provas de que tem conteúdo importante sobre os processos no Judiciário, sobre as investigações de combate à corrupção. É importante ele dizer qual é o método que tem utilizado na divulgação dessas informações e esclarecer por que não é ilegal o que o Intercept tem feito.

CC: Por que entre os estudantes há uma visão mais crítica com o Moro e mais favorável ao Lula do que no conjunto da sociedade, como a gente viu na última pesquisa Datafolha?

MD: A farsa que tem sido desvendada do julgamento combinado [de Lula], da aceleração da condenação [dele], como o Intercept tem divulgado, ajuda na formação da opinião das pessoas, sabe? Foi grotesco o que fizeram na eleição, de tirar o Lula do jogo. Julgamento que interfere na eleição é uma ameaça à democracia. O jovem tem uma percepção mais afinada, uma dificuldade maior de acreditar em fake news, porque está o tempo todo na internet, vendo informação, isso ajuda na visão sobre esse cenário. E porque objetivamente é uma injustiça muito grande, sim, o que tem acontecido com Lula. É o mesmo que aconteceu com o Rafael Braga [catador de lixo condenado após as marchas de junho de 2013], preso com pinho sol na mochila e até hoje está preso, de forma injusta.

CC: Os jovens são mais críticos também em relação ao presidente Bolsonaro. Por quê?

MD: As políticas do governo são prejudiciais à nossa geração de uma forma muito perversa. Os estudantes têm sido atingidos de uma forma muito direta com essa questão das universidades, com desemprego, com a desvalorização do mercado de trabalho. Hoje a situação no Brasil é de estudantes que se formam nas universidades e vão trabalhar no Uber. Aí nós temos um presidente que foi eleito prometendo ser a salvação do Brasil e não conseguiu alterar absolutamente nada desde que entrou. O povo percebe isso, os jovens percebem isso. E também por que nós temos uma geração de jovens no Brasil mais progressistas. Quando Bolsonaro fala que tem que voltar o trabalho infantil, que os jovens que estão nas ruas defendendo a educação são idiotas úteis, quando fala aberrações sobre a sexualidade das pessoas, tudo isso faz os jovens terem uma péssima visão dele.

CC: A imagem dele no exterior colabora para isso?

MD: Claro. Há uma série de vexames que ele têm protagonizado. Visitar o ex-presidente dos Estados Unidos sem ser convidado [George W. Bush em maio], de ir pra reunião do G20 [em junho, no Japão, com os líderes das 20 maiores economias do mundo], grupo das maiores economias do mundo, e não ter prestígio, não ter nenhum tipo de postura acerca do cargo que exerce, tudo isso faz as pessoas terem uma péssima impressão do presidente, e o jovem é completamente antenado, ligados nas redes sociais, têm acesso à informação.

CC: Você falou que os jovens são progressistas. Mas o pensamento conservador e a direita em geral avançaram no Brasil.

MD: Óbvio, não é unanimidade. Mas, pelas pesquisas, no segundo turno da eleição, os jovens rejeitaram Bolsonaro em sua maioria, certo? Os jovens que conquistaram espaço, que conquistaram o direito à expressão, o direito a seus costumes amorosos não podem de forma alguma ter proximidade com o pensamento altamente atrasado do governo de Bolsonaro. Se a gente olhar as manifestações em defesa da educação, era 90% jovem. As manifestações em defesa do governo de Bolsonaro, de Moro, da Lava Jato, era completamente mais velha a faixa etária. [Na manifestação de 26 de maio, pró-Bolsonaro, dois de cada três presentes na Avenida Paulista tinham de 35 a 64 anos, segundo pesquisa]. Temos uma presença de jovens muito mais que repudiam o governo do que apoiam.

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