Sociedade

Combate às fake news passa pela educação digital dos mais velhos

Os idosos têm uma tendência maior a propagar informações equivocadas sem sequer perceber, apontam pesquisas

Por serem disparadas por robôs, as fake news se difundem muito mais rápido do que as verdadeiras notícias e, na sequência, atingem um público maior
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As eleições americanas se aproximam e, desde a ascensão ao poder de Donald Trump, vários países se equipararam para combater a difusão das chamadas fake news. O aparato legislativo pode ter um papel dissuasivo importante, entretanto não basta para impedir que o fenômeno ocorrido em 2016 se repita nos Estados Unidos ou em qualquer outro lugar, avaliam especialistas.

O Brasil foi um dos países que correram para atualizar a legislação e tipificar o crime digital, com penas de multas e prisão. O texto foi adotado em novembro de 2019. Nesta semana, a CPI das Fake News no Senado apura o uso do aparelho do Estado para acessar informações de opositores e divulgar notícias falsas e ataques aos críticos do governo.

Desde a eleição de Trump, favorecida pelo envio em massa de informações erradas sobre sua concorrente democrata, o combate à desinformação virou lei em pelo menos 10 países, como Alemanha, França, Índia, Filipinas, Rússia ou China. “Os códigos criminais existentes são insuficientes para enfrentar a questão. Não podemos ir para um tribunal e levar um ano para resolver a difusão de uma fake news”, observa o pesquisador português João Paulo Meneses, que tem se dedicado ao tema na Universidade do Minho.

O problema da rapidez da divulgação das informações falsas é central, já que, por serem disparadas por robôs, as fake news se difundem muito mais rápido do que as verdadeiras notícias e, na sequência, atingem um público maior. A lei francesa, por exemplo, prevê uma definição judicial em até 48 horas, que pode resultar na obrigação de retirada do conteúdo do ar por mídias sociais como Facebook e Twitter. Pode parecer um prazo curto – mas, na realidade, é tarde demais para evitar os estragos.

Leis mais “simbólicas” do que efetivas

Para o pesquisador Vincent Claveau, do Instituto de Pesquisas em Informática e Sistemas Aleatórios (IRISA, ligado ao respeitado CNRS), a medida é apenas “simbólica”. “Sem contar que o juiz não tem nenhum suporte técnico para tomar essa decisão e avaliar se a notícia é ou não falsa. Não há qualquer tipo de polícia cibernética que vai monitorar a difusão de fake news”, nota.

Outro ponto de contestação é a validade da lei anti-fake news, que só aplicam em período eleitoral e, ainda assim, em um prazo restrito, de até quatro semanas antes da votação. “Acho que essas leis têm mais um caráter dissuasor do que efetivo. Elas foram feitas não tanto para reprimir e tem um papel semelhante ao de um radar de trânsito. Ou seja, para que as pessoas tomem mais cuidado na hora de publicar algo porque, agora, existe uma lei.”

Idosos não aprenderam a lidar com mídias sociais

É por isso que a educação digital pode ser uma ferramenta muito mais eficaz para combater o problema, na visão de Claveau. O pesquisador francês ressalta que os jovens em geral são mais preparados para reconhecer uma notícia falsa, por serem mais familiarizados com o mundo digital e, cada vez mais, receberem formações nas escolas sobre como utilizar as mídias sociais sem riscos.

Já os idosos têm uma tendência maior a propagar informações equivocadas sem sequer perceber, conforme indicaram pesquisas. “E os mais velhos são os que mais votam nas eleições, portanto eles são uma parte considerável desse problema, afinal jamais tiveram formação adequada para lidar com as ferramentas digitais”, frisa o especialista do CNRS.

Liberdade de expressão

Outra barreira importante para a evolução das legislações sobre o tema é a liberdade de expressão. Em países menos democráticos, o combate às notícias falsas tem servido de desculpa para calar opositores. “Singapura é o farol dos observadores dessa questão. Foi o primeiro país a criar uma lei específica, completa, sobre as fake news. E é o primeiro a usá-la – para calar opiniões desfavoráveis ao partido minoritário”, destaca Meneses, que ainda chama a atenção para os casos chinês e russo. “O próprio conceito de fake news é difícil de avaliar. Se comparamos com um jogo de futebol, uns podem achar que foi pênalti, outros não.”

Neste universo de incertezas, Claveau não tem a menor dúvida: o impacto da desinformação digital não só na política, como nas mais diversas áreas, recém começou. “Estamos apenas começando a aprender a conviver com as fake news, que vão durar por mais alguns anos. As deepfakes impõem desafios ainda maiores, ao colocarem em vídeo uma personalidade falando qualquer coisa. As pessoas precisarão aprender a verificar melhor as informações antes de confiar nelas.”

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