Sociedade
Cícero entra
Meu pai mantém o Irineu, eu, como meus irmãos, manteremos Cícero, fortalecendo uma narrativa de gerações
Desde 2010 tenho assinado tudo que produzo no cotidiano como Joseh Silva. A pergunta mais recorrente que me fizeram durante esses anos sobre o meu nome foi: “seu nome tem agá no final mesmo?”. Não. A letra agá acrescentei quando estava tentando montar um e-mail e me foi sugerido, pelo sistema, um com a letra agá. Gostei e aderi.
Assim, assinei textos, fotografias, produções de vídeorreportagens e amadureci. Neste processo, por diversas vezes, refleti sobre a importância de usar o meu nome completo: José Cícero da Silva. O nome do meu pai é Cícero Irineu de Melo. Assinar Cícero depois de José e antes de da Silva é cumprir uma responsabilidade geracional. Este nome tem essência.
Irineu não teve a oportunidade de estudar na idade que deveria. Quando adulto, entre trabalho, família e igreja, tentava frequentar algumas aulas, em uma organização não governamental, através do Movimento da Alfabetização (MOVA), no entanto, estava bem difícil para ele assimilar algumas letras e a impaciência gerou desistências – foram diversas.
A não alfabetização do Irineu não fez com ele congelasse no tempo. A sua sabedoria e esperteza fez com que aguçasse a atenção, que levou ele à diversos lugares. Não sabe interpretar letras, mas lida muito bem com números. Assim decorava os ônibus que transitavam pelos bairros periféricos.
O nome do meu avô por parte de pai é: Irineu Estevão de Melo, homem do agreste, do campo, rude de pouca paciência. Sobreviveu da fauna e da flora. A terra era sua lousa e a enxada era o giz que escrevia a história da vida comum de um homem do agreste, que secou com a seca, com a perda de filhos e netos por conta do distanciamento e da frieza da política pública.
Meu pai mantém o Irineu, eu, como meus irmãos, manteremos Cícero. Fortalecendo uma narrativa de gerações.
Firmado: José Cícero da Silva
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