Sociedade

Nos ônibus do Rio, ativismo pela legalização das drogas

Angeli, Laerte, André Dahmer, Leandro e Arnaldo Branco estampam desenhos na traseira dos coletivos ironizando a “guerra às drogas”

Campanha utiliza 43 ônibus para informar população carioca
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Há pelo menos 20 dias, quem fica preso no trânsito do Rio de Janeiro encontra uma distração nova e mordaz. Cinco charges provocativas foram estampadas na traseira de 43 ônibus que circulam da sofisticada zona sul ao subúrbio carioca transmitindo o seguinte recado: Da Proibição [das drogas] Nasce o Tráfico.

Esse é o mote de uma campanha idealizada pela socióloga Julita Lemgruber, a primeira mulher a dirigir o sistema penitenciário do Rio de Janeiro (1991-1994). É com a experiência de quem já escapou de um atentado e negociou a rendição de mais de 400 detentos que ela assegura: as cadeias estão superlotadas porque a “guerra às drogas” falhou ao encarcerar pequenos infratores e deixar do lado de fora os traficantes que operam esse mercado bilionário na ilegalidade.

Amiga do cartunista André Dahmer, de Os Malvados, Julita planejava com ele a realização de uma animação que levasse à população carioca uma visão alternativa ao senso comum de que a legalização das drogas irá aumentar seu consumo.

Durante a conversa surgiu outra ideia. Por que não estampar no vidro de trás dos coletivos algumas charges que explicassem as consequências dessa proibição? “É como uma camiseta. Tem grande circulação, muita gente vê. E é possível escolher o local em que essas imagens vão circular”, afirmou Dahmer à reportagem. “Aqui no Rio elas circulam desde as áreas mais carentes até as universidades.”

Angeli “A guerra mata mais do que as drogas”, diz a charge de AngeliA ideia de uma grande campanha surgiu depois que Lemgruber realizou uma pesquisa com 2 mil cariocas e entrevistou 13 “grupos focais”, por escolaridade, faixa-etária e profissão, por exemplo. A conclusão foi que a desinformação no Rio é grande. Como os estudos ainda dependem de nova fase, Lemgruber prefere não revelar os dados. Por enquanto, adianta que um dos maiores temores da população é que o uso da droga aumente após a regulamentação. “Eles acham que vai ter um bando de zumbi pelas ruas atacando as pessoas”, conta ela. “O curioso é que 90% dos entrevistados que não utilizam drogas dizem não pretender fazer isso após a legalização.”

Além de Dahmer (O Globo), Lemgruber convidou Laerte (Folha de S.Paulo), Angeli (Folha de S.Paulo), Arnaldo Branco (O Globo) e Leandro (Extra) para produzir os cartazes. A CartaCapital, Laerte falou da sua dificuldade em realizar trabalhos sob medida. “Eu prefiro trabalhar com humor da forma mais solta possível, mas não recuso o desafio de participar de campanhas que tenham um tema importante, como a legalização das drogas.”

O desenho da cartunista (todas as charges estão no álbum acima) exibe um homem engravatado discursando de dentro de uma caixa registradora onde se lê: “Guerra às Drogas”. “Pensei em tratar o modo como a droga se constitui em um comercio frio, com grana, venda e balanços comerciais. E, claro, tudo na clandestinidade. Ele se opera longe do controle estatal, dos impostos.”

Embora a discussão do tema venha aumentando nos últimos anos, para a cartunista da Folha o assunto ainda é pouco debatido no Brasil. “Ele é eivado de preconceito, prevenções morais. Espero que se fale mais porque é assim que essa questão vai evoluir um pouco.” 

Prevista para acabar no próximo dia 20, a campanha já trouxe resultados, diz a socióloga. “Jovens da favela têm nos procurado para confirmar a percepção de que a proibição é que alimenta o tráfico. Essas são as pessoas que mais sofrem com a desinformação e a lei como está.”

Lemgruber lembra que Portugal descriminalizou o consumo de todas as drogas “e ele não explodiu”. “Essas informações são desconhecidas do carioca. A campanha quer quebrar essa percepção, contribuindo com informação. Queremos dizer que o Estado só pode fiscalizar e ter o poder de interferir se legalizar esse mercado.”

Os realizadores esperam levar o projeto para São Paulo nos próximos meses.

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