Política

Após 5 anos sem demarcação, Lula assina a homologação de seis terras indígenas

A homologação de novas terras marca um fim a política anti-indigenista realizada por Michel Temer e Jair Bolsonaro

Lula se reúne com lideranças indígenas. Foto: Alan Azevedo
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assinou nesta sexta-feira 28 a homologação de seis terras indígenas. Os decretos devem ser oficializados ainda nesta manhã durante a cerimônia de encerramento do Acampamento Terra Livre.

A homologação de novas terras marca um fim a política anti-indigenista realizada por Michel Temer e Jair Bolsonaro. Desde 2018, nenhum processo de homologação, demarcação ou identificação de território foi realizado.

As terras indígenas homologadas nesta sexta são:

TI Arara do Rio Amônia (AC);

TI Kariri-Xocó (AL);

TI Rio dos Índios (RS);

TI Tremembé da Barra do Mundaú (CE);

TI Uneiuxi (AM);

TI Avá-Canoeiro (GO).

Durante a transição de governos, o Grupo de Trabalho dos Povos Indígenas havia identificado ao menos 79 Tis pendentes de demarcação, das quais listou 13 que estariam “prontas” para homologação pelo novo governo.

Em março, a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, havia anunciado que as 13 Tis seriam homologadas neste mês de abril, mas na última terça-feira 25 a Articulação dos Povos Indígenas anunciou que o número de homologações a ser anunciado deveria ser menor. A justificativa dada pela entidade é de que o governo precisará rever minuciosamente a documentação de todas as terras pendentes, sinalizando a possibilidade de alteração na papelada durante o governo de Jair Bolsonaro.

Nas redes sociais, o presidente Lula compartilhou a alegria de poder retomar as homologações de territórios indígenas. “A luta por demarcação dos povos indígenas é uma luta por respeito, direitos e proteção da nossa natureza e País”, escreveu o mandatário.

No pronunciamento feito pelo Planalto na manhã desta quinta-feira, além das homologações, consta a  recriação do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) e a criação do Comitê Gestor da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI).

Confira os detalhes das seis terras demarcadas:

  • TI Kariri-Koxó (AL)

O município de Porto Regal de Colégio, a 170 km de Maceió, abriga hoje uma população com mais de 2 mil indígenas viventes. No território há um misto de duas etnias, os Kariri (viventes da região) e os Xokós, que viviam entre Alagoas e Sergipe, mas foram expulsos por coronéis invasores. O acolhimento dos Xokós deu origem ao novo termo utilizado, Kariri-Xokó.

Ambos os grupos enfrentam, desde 1940, a luta pelo reconhecimento da demarcação de terra. Por décadas, a população ficou espremida fora de sua TI e obrigada a sitiar-se próxima à cidade. O período é marcado pela busca de novas formas de sobrevivência, uma vez que foram impedidos de acessarem os rios. Desde 1979 ocupam uma área de apenas 700 hectares, ante aos tradicionais 7.200. O pouco espaço, vale ainda dizer, foi ocupado por luta de retomada forçada.

Desde 2006 os indígenas Kariri-Xokó aguardam legalmente a homologação da TI já demarcada.

  • TI Tremembé da Barra do Mundaú (CE)

O povo Tremembé da Barra do Mundaú, localizados a aproximadamente 55k do município de Itapipoca (CE), disputam na justiça desde 1980 o processo completo da demarcação de suas terras. A primeira homologação parcial deste território ocorreu somente em 2003.

A parte do território homologada nesta sexta-feira corresponde a um processo de demarcação finalizado no ano de 2015. Com ele, aproximadamente 600 indígenas ganham direito a terra.

  • TI Uneiuxi (AM)

Localizada na região noroeste amazônica, que abrange a bacia do Alto do Rio Negro e a fronteira entre o Brasil e a Colômbia, a TI é habitada tradicionalmente por pelo menos 22 etnias – considerando apenas o território brasileiro.

  • TI Arara do Rio Amônia (AC)

Os indígenas viventes na TI Arara do Rio Amônia advém de famílias indígenas de múltiplas etnias, mas que foram desmembradas devido ao histórico de violência no eixo amazônico. A área encontra-se entre o limite de um projeto de Assentamento, sob jurisdição do Incra, do Parque Nacional da Serra Divisor sob jurisdição do ICMBio e da reserva extrativista do Alto Juru, onde ocorre a colheita em seringais. A divisa intensa do território é um dos maiores motivos para a dificuldade na demarcação.

  • TI Avá-Canoeiro (GO)

Marcados pelo massacre dos povos indígenas, o povo Ava-Canoeiro, ou Carijós, é uma das etnias mais ameaçadas e beira a quase-extinção. Atualmente, existem apenas duas famílias, uma em Goiás com nove pessoas e outra no Tocantins com 8 viventes.

Embora não sejam considerados povos isolados, este grupo identifica-se como “sem-contato”. Há a expectativa de que a população seja maior e que perambulem pelas regiões da Mata do Mamão e da Ilha do Bananal, no Tocantins.

O processo de homologação desta terra era um dos mais antigos e dos mais essenciais para a sobrevivência de uma etnia. Os indígenas Ava-Canoeiro aguardam desde 1996 pelo direito a sua terra.

  • TI Rio dos Índios (RS)

Localizada em Vicente Dutra, a terra indígena do Rio dos Índios, que recebe o nome do município, abriga a etnia Kaigang com mais de 500 membros. Em 2018 o local foi palco de intenso protesto pela desintrusão do território – processos de pagamento indenizatório aos ocupantes não indígenas que habitavam a TI.

O processo de demarcação e declaração havia sido finalizado em 2004, mas, desde então, não ouve andamento nos tramites de devolução do território.

Área crítica não foi contemplada

Embora o retorno a demarcação de seis territórios oficialize o compromisso do governo com retomada da pauta indígena, áreas críticas para a sobrevivência de etnias foram deixadas de lado no anúncio desta quinta-feira. Dos 13 territórios que estavam prontos para homologação, destaca-se a TI Pataxó Barra Velha, na Bahia.

A Terra Indígena Barra Velha, demarcada em 1980 com 8.627 hectares, representava uma parcela pequena do território ocupado tradicionalmente pelos Pataxós. Em 2009, a Funai publicou um documento em que corrigia os limites do território, mas, de lá para cá, não houve avanço real na demarcação.

A vitória dos Pataxós na justiça não foi sinônimo de paz para os viventes da região. Em 2013, o movimento ruralista tentou reverter pela primeira vez a demarcação no Supremo Tribunal de Justiça, o que barrou o processo de demarcação das novas terras até 2019, quando a Corte declarou a legitimidade do território. Hoje, em 2023, o avanço dos setores imobiliários, hoteleiros e a prática ilegal de arrendamento dentro do território ainda tiram o sono dos indígenas. O município de Porto Seguro faz vista grossa aos constantes ataques e, segundo lideranças da TI Barra Velha, instigam os fazendeiros ao dizer que as aldeias não geram economia para a região.

Em agosto de 2022, CartaCapital noticiou o cerco realizado por pistoleiros na região. Segundo a denúncia, eles tinham ordens para “meter bala” em qualquer indígena que tentasse atravessar o território próximo às fazendas, impedindo acesso a comida e saúde.

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