Sociedade

Alternativas locais para o campo brasileiro

Nem todas as inovações da agricultura saem da pesquisa acadêmica ou dos grandes laboratórios: há muita coisa em pequenas empresas e até nas fazendas

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Em 1776, num dia 4 de julho, os Estados Unidos da América se declarou independente da Inglaterra e a partir daí os países lusófonos, como o Brasil, ganhamos intimidade para os chamar de EUA. Exatos 89 anos depois, o escritor britânico Lewis Carroll, pseudônimo de Charles Dodgson, publicou “Alice no País das Maravilhas”, exercício do que viria a ser a antiga colônia.

Mais de 50 anos atrás, nas reuniões da União Paulista de Estudantes Secundários (UPES), ouvia-se questionar tal apropriação indébita: “Como América? Anexaram os países das Américas do Sul e Central”?

A História mostra que sim. Se não institucionalmente, na forma de invasões armadas ou, indiretamente, dando apoio diplomático, econômico e de armamentos a governos ilegítimos, caudatários dos interesses do império.

Tenho sido repetitivo na coluna ao alertar do processo mundial de concentração no setor de agronegócios que cada vez mais prejudicará os produtores brasileiros, sobretudo de grãos. Os filhos das segunda e terceira gerações rurais na Federação de Corporações e os profissionais formados técnicos ou agrônomos dão de ombros para aquilo que não sai do convencional. Pouco leem que não os folhetins da indústria de sintéticos.

Na coluna de hoje, excluo quem é visto somente com o auxílio da lupa. Eles serão viabilizados apenas por um novo projeto nacional de inserção social e, de onde escrevo, alto do Morro Santa Marta (RJ) não se vislumbra asfalto que pareça céu no chão.

Dirijo-me aos que passam, ano após ano, dependentes de agroquímicos e tóxicos, pagando preços abusivos, comparando produtividade com vizinhos de cerca, sem calcular e tentar reduzir seus custos de insumos, traseiros e olhos esperançosos nos milagres de Chicago.

Precisam fugir das armadilhas causadas por um certo comodismo atávico brasileiro. Nem todas as inovações e tecnologias para a agricultura saem da pesquisa acadêmica ou dos grandes laboratórios de multinacionais. Há muita coisa sendo desenvolvida em pequenas empresas ou mesmo dentro das fazendas.

Amarrados e dominados pelos insumos importados, seus custos ficarão incontroláveis. Não esperem governo e iniciativa privada investindo em produção nacional para substituir importações, como aconteceu entre 1950 e 1980. O País entendeu a globalização como fatores apenas mercantil e financeiro.

Hoje em dia, o mesmo domínio já consolidado “antes das porteiras” segue aos balcões de secos e molhados. A concentração nos demais elos da cadeia se intensificaram com a maior demanda por alimentos processados depois do aumento da renda em países pobres e emergentes.

No Brasil, atualmente, se abre uma empresa ou se desenvolve inovação já pensando em vende-las para uma companhia maior e realizar lucro imediato. Sinais de concentração ocorrem também no segmento de máquinas e equipamentos informatizados. Cinco empresas detêm 2/3 do mercado, sendo líder a John Deere.

Não bastasse esse processo, digamos, horizontal, conglomerados se unem para verticaliza-lo, indo dos insumos às operações de manejo automatizado, distribuição integrada, onde pouco interferem os fazendeiros. Em meio a isso, cascateiam margens e subtraem o poder de decisão do agricultor.

Na outra ponta, embora a diversificação de marcas, nota-se produção e distribuição nos mesmos grandes complexos alimentícios e extensas cadeias de supermercados, que protagonizam a adoção de produtos altamente processados, “prontos para consumo”.

A epidemia de obesidade e suas interferências em várias doenças crônicas, recentemente divulgada pela Organização Mundial de Saúde, tem como origem o poder mercadológico e publicitário que induz consumidores acreditarem esses alimentos como “saudáveis”.

Dificuldades-monstros assim relatadas fazem imaginar como ficará a vida dos pequenos agricultores e trabalhadores rurais. A notícia é de 2011, deve ter havido evolução, mas cientistas britânicos conseguiram fazer um microscópio ótico capaz de enxergar objetos de cerca de 50 nanômetros (um metro dividido em um bilhão de partes). Creio que nem mesmo tal equipamento nos fará enxergar o andar de baixo do agronegócio.

Enquanto isso, prestem atenção num colunista, ao mesmo tempo, defensor e crítico do agronegócio:

  1. Escolham democraticamente governos que invistam para melhorar a logística da agropecuária, incentivem a demanda do mercado interno e a agricultura familiar;
  2. Afastem-se da bancada ruralista e de quem escreve e legisla em nome dela. Desconhecem suas necessidades e defendem apenas interesses políticos e financeiros próprios;
  3. Protejam suas produtividades e seus custos por hectare testando tecnologias naturais menos imediatistas;
  4. Mantenham a legislação do trabalhador rural. Muitas culturas ainda dependem de mão de obra;
  5. Protejam os biomas. Eles serão a maior riqueza do País nas gerações futuras;
  6. Avaliem as desvantagens de ser rico em terra de miseráveis;
  7. Leiam, ouçam, estudem, as raízes da cultura rural brasileira, de onde vocês nasceram. Reproduzam-na a filhos, netos e bisnetos;
  8. Há farta bibliografia sobre famílias rurais endinheiradas que foram à bancarrota por falta de educação, visão global e entendimento social.

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