Sociedade

Acusado de estupro na USP é absolvido em segunda instância

O caso de violência sexual ocorrido em 2012 poderia ter sido o primeiro da universidade a ser punido na Justiça

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Na manhã desta quinta-feira 16, mais uma vez, professoras, alunas e juristas retornaram ao Tribunal de Justiça de São Paulo, na Praça da Sé, para aguardar pelo julgamento da apelação contra a absolvição de Daniel Tarciso de Silva Cardoso. O médico formado em 2015, foi acusado de ter dopado e violentado sexualmente pelo menos seis alunas da Universidade de São Paulo em 2012, quando também era aluno.

Na terceira vez que as partes retornaram ao Tribunal, por três votos a zero, os desembargadores consideraram Daniel inocente e ele foi absolvido em segunda instância. O advogado da vítima, Luiz Eduardo Qreenhalgh, informou que está aguardando o acórdão judicial, decisão proferida em segundo grau de jurisdição de forma colegiada, para entrar com um recurso no STJ a fim de recorrer à decisão. Como o caso corre em sigilo, ele afirmou que não pode dar mais informações.

Segundo Heloísa Buarque de Almeida, da Rede Não Cala, grupo organizado de professoras contra o estupro na universidade, as manifestantes já esperavam o resultado. “Ela está super triste, foi bem difícil aqui”, contou Heloísa, sobre a vítima, que foi convidada a depor oito vezes no mesmo processo pela universidade.

Daniel já havia sido absolvido em primeira instância pelo juiz Klaus Marouelli Arroyo, da 23ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, em 2015, sob a alegação de que não haveria provas suficientes. Entretanto, na época, três vítimas fizeram a denúncia formalmente, mas apenas esse caso foi parar na Justiça. Ele poderia ter sido o primeiro estupro cometido por um estudante da USP, contra uma aluna, a ser punido na Justiça.

Além da absolvição, Daniel não foi expulso da universidade. Sob forte pressão, a Faculdade de Medicina da USP apenas o suspendeu por 180 dias. Depois disso, retornou à USP e concluiu o curso, em 2015.

Na época, a professora Ivete Boulos tentou impedir que Daniel recebesse seu diploma. Mas ela foi afastada e ele se formou. Hoje atua como médico com um registro do Conselho Regional de Medicina emitido em Pernambuco, já que o Conselho de São Paulo, o CREMESP, recusou-se a emiti-lo. Ele declarou que pretende se especializar em Ginecologia e Obstetrícia.

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Caso está inserido num contexto maior 

O caso passa longe de ser pontual, conforme mostrou reportagem de CartaCapital. A professora Heloísa Buarque, afirmou, na ocasião, que a cada ano a Rede Não Cala recebe, pelo menos, dez casos de alunas que sofreram estupro, no campus ou em festas da universidade. Algumas buscam as professoras procurando atendimento. “Só eu já atendi umas 15 meninas nos últimos dois anos. Mas dessas só uma fez denúncia formal na universidade”, conta.

O Jornal do Campus, que circula na USP, mapeou cerca de 130 casos nos últimos cinco anos. Para o mesmo período, as estatísticas da Superintendência de Segurança da USP apontam somente 1 caso no campus da capital.

O problema, de acordo com as alunas e professoras, é que as vítimas enfrentam uma longa burocracia para fazer a denúncia, que muitas vezes, no fim, não levam a nada. “Há uma ausência de resposta adequada às vítimas, que gera a subnotificação”, afirmou Marina Ganzarolli, da Rede Feminista de Juristas.

“Não há um lugar de atendimento adequado para fazer a denúncia, não há sigilo adequado. Eu mesma já atendi vários casos de meninas que me contaram coisas, e que não tinham força e coragem de denunciar, que estavam muito fragilizadas”, explica a professora.

“A gente vê a mesma desvalorização da palavra da mulher que acontece na universidade, acontecendo no judiciário”, afirmou Marina Ganzarolli. “A vitima que denuncia passa por esse tipo de violência que é ver o judiciário desvalorizando seu depoimento.”

Segundo ela, o judiciário tem “um padrão de desacreditar da vítima”, dando mais importância ao depoimento do agressor, numa clara violência de gênero institucionalizada.

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