Sociedade

A arte de pastorear gatos

Muitas empresas enfrentam dificuldades com o alinhamento e a execução estratégicos. Gerenciar grandes organizações é como pastorear os felinos

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No mundo maravilhoso da gestão empresarial, certos conceitos concorrem ao prêmio de mais falado e menos praticado: planejamento estratégico é um deles. Há 20 anos a prática foi considerada moribunda, vítima das turbulências globalizantes. Sobreviveu como artefato corporativo, com alguma pompa e pouca utilidade. Em muitas empresas, o planejamento estratégico não é mais do que o prosaico orçamento ostentando um nome mais sofisticado.

Mas o mundo empresarial gira e novos conceitos surgem. Na década de 2000, ganhou popularidade entre especialistas o termo “estratégias emergentes”, rótulo para as múltiplas ações e decisões em todos os níveis da organização. Mais do que grandes planos, que raramente viam a luz do dia, é a soma das pequenas ações e decisões o realmente importante e determinante no curso das coisas.

Agora, acompanhando o modismo das mídias sociais, surge o termo “estratégia social”. Matéria publicada recentemente na revista McKinsey Quarterly trata do curioso fenômeno.

O ponto de partida é que a definição da estratégia da empresa frequentemente sofre com o distanciamento entre os planejadores e os executores. Do alto de suas torres, isolados da vida real, diretores de empresa frequentemente perdem a sensibilidade para questões da linha de frente.

Com isso, as estratégias por eles definidas contêm ­lacunas, não são abraçadas pelos executores no meio e na base da pirâmide. Naturalmente, isso pode comprometer o desempenho da empresa. Diante do desafio, a resposta apontada pelos autores Arne Gast e Michele Zanini é trazer para o processo as perspectivas e informações da linha de frente, por meio do uso de tecnologias sociais. Tal condição garante, segundo os autores, o aumento da transparência e da participação, e um processo de escrutínio e exame de ideias.

O artigo traz exemplos de empresas que estão empregando tal modelo. A HLC Technologies, uma provedora de serviços de desenvolvimento de software, cresceu rapidamente. A nova condição levou ao redesenho do processo estratégico. Os diretores da empresa perceberam que não conseguiam mais dar conta do conhecimento detalhado que cada unidade de negócios demandava. A resposta foi um processo com ampla participação dos funcionários e um sistema de aperfeiçoamento por pares. O tradicional workshop de estratégia foi substituído por uma plataforma online para a participação de milhares de colaboradores. A transparência ajudou a melhorar a qualidade das sugestões. O produto foi um trabalho mais prático, com maior chance de ser aplicado.

Um processo similar ocorreu na conhecida 3M. Em 2009, a empresa decidiu aperfeiçoar seu processo de construção da visão do futuro, etapa inicial do planejamento estratégico. Originalmente, o processo era baseado em uma análise de megatendências, conduzida por especialistas. O novo modelo envolveu todo o pessoal de vendas, marketing e pesquisa & desenvolvimento, por meio de uma plataforma eletrônica. Com isso,  participaram do processo 1,2 mil profissionais de mais de 40 países, gerando mais de 700 ideias consolidadas em nove novos mercados a ser explorados pela companhia.

Muitas empresas enfrentam dificuldades com o alinhamento e a execução estratégicos. Gerenciar grandes organizações é como pastorear gatos. Por mais que se esforce para fixar uma direção e comunicá-la, os bichanos raramente resignam-se aos comportamentos previstos.

O resultado frequente é uma “soma zero” que faz com que os movimentos da organização sejam restritos pela inércia. O fenômeno pode ser observado em grandes empresas privadas, inclusive renomadas multinacionais, em organizações públicas, nas quais os gatos são particularmente manhosos e estridentes, e em organizações sociais, nas quais todos os gatos parecem ter opiniões definitivas sobre todos os assuntos.

O aumento do nível de transparência e do nível de participação traz, supostamente, vantagens importantes: enriquece o processo, faz com que os profissionais entendam melhor o seu papel e aumenta o grau de comprometimento com a execução. Entretanto, não é um processo simples nem tranquilo. E pode despertar atitudes resistentes dos mestres planejadores, ciosos da liturgia do poder.

Para executivos no topo da pirâmide, adotar tal modelo de condução estratégica significa utilizar a autoridade pessoal para distribuir poder. Conforme sugerem Gast e Zanini, trata-se de uma mudança relevante de papel, de supertomadores de decisão para arquitetos sociais. O que, obviamente, implica confiar na maturidade e na preparação dos funcionários, especialmente da média gerência.

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No mundo maravilhoso da gestão empresarial, certos conceitos concorrem ao prêmio de mais falado e menos praticado: planejamento estratégico é um deles. Há 20 anos a prática foi considerada moribunda, vítima das turbulências globalizantes. Sobreviveu como artefato corporativo, com alguma pompa e pouca utilidade. Em muitas empresas, o planejamento estratégico não é mais do que o prosaico orçamento ostentando um nome mais sofisticado.

Mas o mundo empresarial gira e novos conceitos surgem. Na década de 2000, ganhou popularidade entre especialistas o termo “estratégias emergentes”, rótulo para as múltiplas ações e decisões em todos os níveis da organização. Mais do que grandes planos, que raramente viam a luz do dia, é a soma das pequenas ações e decisões o realmente importante e determinante no curso das coisas.

Agora, acompanhando o modismo das mídias sociais, surge o termo “estratégia social”. Matéria publicada recentemente na revista McKinsey Quarterly trata do curioso fenômeno.

O ponto de partida é que a definição da estratégia da empresa frequentemente sofre com o distanciamento entre os planejadores e os executores. Do alto de suas torres, isolados da vida real, diretores de empresa frequentemente perdem a sensibilidade para questões da linha de frente.

Com isso, as estratégias por eles definidas contêm ­lacunas, não são abraçadas pelos executores no meio e na base da pirâmide. Naturalmente, isso pode comprometer o desempenho da empresa. Diante do desafio, a resposta apontada pelos autores Arne Gast e Michele Zanini é trazer para o processo as perspectivas e informações da linha de frente, por meio do uso de tecnologias sociais. Tal condição garante, segundo os autores, o aumento da transparência e da participação, e um processo de escrutínio e exame de ideias.

O artigo traz exemplos de empresas que estão empregando tal modelo. A HLC Technologies, uma provedora de serviços de desenvolvimento de software, cresceu rapidamente. A nova condição levou ao redesenho do processo estratégico. Os diretores da empresa perceberam que não conseguiam mais dar conta do conhecimento detalhado que cada unidade de negócios demandava. A resposta foi um processo com ampla participação dos funcionários e um sistema de aperfeiçoamento por pares. O tradicional workshop de estratégia foi substituído por uma plataforma online para a participação de milhares de colaboradores. A transparência ajudou a melhorar a qualidade das sugestões. O produto foi um trabalho mais prático, com maior chance de ser aplicado.

Um processo similar ocorreu na conhecida 3M. Em 2009, a empresa decidiu aperfeiçoar seu processo de construção da visão do futuro, etapa inicial do planejamento estratégico. Originalmente, o processo era baseado em uma análise de megatendências, conduzida por especialistas. O novo modelo envolveu todo o pessoal de vendas, marketing e pesquisa & desenvolvimento, por meio de uma plataforma eletrônica. Com isso,  participaram do processo 1,2 mil profissionais de mais de 40 países, gerando mais de 700 ideias consolidadas em nove novos mercados a ser explorados pela companhia.

Muitas empresas enfrentam dificuldades com o alinhamento e a execução estratégicos. Gerenciar grandes organizações é como pastorear gatos. Por mais que se esforce para fixar uma direção e comunicá-la, os bichanos raramente resignam-se aos comportamentos previstos.

O resultado frequente é uma “soma zero” que faz com que os movimentos da organização sejam restritos pela inércia. O fenômeno pode ser observado em grandes empresas privadas, inclusive renomadas multinacionais, em organizações públicas, nas quais os gatos são particularmente manhosos e estridentes, e em organizações sociais, nas quais todos os gatos parecem ter opiniões definitivas sobre todos os assuntos.

O aumento do nível de transparência e do nível de participação traz, supostamente, vantagens importantes: enriquece o processo, faz com que os profissionais entendam melhor o seu papel e aumenta o grau de comprometimento com a execução. Entretanto, não é um processo simples nem tranquilo. E pode despertar atitudes resistentes dos mestres planejadores, ciosos da liturgia do poder.

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