Sociedade

A Apple agradece ao Pikachu

Vendas na App Store batem recordes, impulsionadas pelo fenômeno do Pokémon Go. Receita com aplicativos compensa a queda no ritmo de vendas de iPhones

O Pikachu enche os cofres da Apple
Apoie Siga-nos no

por Mark Sweney

Quando a Apple lançou sua App Store, oito anos atrás, com uma seleção de apenas 500 aplicativos para usuários de iPhone, poucos dos famosos executivos valentões da companhia esperavam que ela se tornasse uma máquina de lucros. O iPhone e o iPod eram sucessos arrasadores e o iPad acabava de chegar: os apps pareciam um fato secundário.

No ano passado, o negócio de apps da Apple faturou, porém, quase 30 bilhões de dólares, com o fenômeno Pokémon Go a liderar as compras e levar as vendas totais nas lojas a 85 bilhões de dólares desde 2008. Os resultados do último trimestre tendem a confirmar sua importância para o grupo tecnológico, com as vendas de iPhone com menos vapor e a unidade de serviços do grupo, que abrigam a App Store e a iTunes, tornando-se cada vez mais importante para a Apple.

Matti Littunen, especialista tecnológico da consultoria Enders Analysis, disse que o iPhone continua a ser a pedra angular da empresa, respondendo por bem mais de 60% das receitas, mas a loja é uma parte chave da estratégia da Apple para ganhar mais fora do hardware.

“O negócio da App Store é de crescente importância para a Apple”, disse Littunen. “Com o declínio das vendas de iPhones, a divisão de serviços tem se tornado mais importante. A Apple precisa fazer o possível para garantir os melhores serviços disponíveis e os melhores desenvolvedores a bordo.”

Não são apenas a Apple e seus investidores que se beneficiam da loja. Os desenvolvedores de apps ficam com a maior parte do faturamento. No ano passado, os 28,6 bilhões de dólares de ganhos pela loja foram divididos entre os desenvolvedores, que levaram para casa 20 bilhões, e a Apple, que embolsou 8,6 bilhões de sua porcentagem de 30%.

Peter Molyneux, conhecido designer de videogames britânico, disse que a chegada da loja da Apple e do serviço rival da Google, o Play, representou uma revolução para os desenvolvedores de jogos e produtos.

Segundo Molyneux, um de seus primeiros sucessos, Fable, levou sete anos para vender 10 milhões de exemplares desde seu lançamento em 2004. O último game produzido por seu estúdio 22cans, The Trail, superou esse total em questão de meses, graças à loja. “Em novembro nós lançamos The Trail e ele ultrapassou 10 milhões de downloads. Mais consumidores tem interagido com um jogo que eu lanço hoje do que com quase todos os jogos que fiz para consoles. O fascinante na economia dos apps é que você cria um game, ou um app, que alcança o mundo inteiro.”

O aumento dos lucros da App Store não mostra sinais de desacelerar. As receitas crescem 40% ao ano, enquanto na China, onde a Google não opera um serviço concorrente, elas aumentaram 90%. Não admira que a Apple tenha agradecido aos desenvolvedores há pouco, enquanto lhes lembrava delicadamente que “nossos produtos”, um ecossistema de telefones, tablets e a própria loja, tornam tudo isso possível.

No primeiro trimestre do ano passado, as vendas do iPhone sofreram seu primeiro declínio, levando alguns analistas a especular que o mundo podia ter atingido o “pico Apple” e a companhia a garantir que sua operação de conteúdo continue a funcionar perfeitamente.

No ano passado, a Apple melhorou suas condições e deu aos desenvolvedores 85% da receita de assinaturas, mas só depois que um assinante usa o app por ao menos um ano. As compras isoladas de apps, como quando um jogador paga para abrir novos níveis ou compra artigos que o ajude a ter sucesso, continuam niveladas em 70/30.

Littunen acredita que a Apple vai relaxar suas políticas ainda mais, depois de embaraços em que o Super Mario Run da Nintendo foi listado como grátis, mas depois cobrou dos jogadores 9,99 dólares após alguns níveis. O Spotify também atraiu críticas por cobrar 3 dólares a mais por uma assinatura pela App Store, para contabilizar a porcentagem cobrada pela Apple.

Apesar desses reveses, os consumidores que usam apps para assinar serviços como Netflix tem se mostrado uma verdadeira máquina de dinheiro, com aumento de 74% no ano e chegando a 2,7 bilhões de dólares em 2016. Isso fez os serviços de assinaturas começarem a aparecer nas listas de maiores faturadores da Apple, que geralmente são dominadas por jogos “freemium”, em que o usuário pode jogar parte do jogo de graça, mas depois tem de pagar para continuar efetivamente.

“Não há dúvida de que as assinaturas de apps estiveram por trás de grande parte dos números impressionantes da App Store”, disse Littunen. “Apps como Netflix, Spotify e Tinder são finalmente capazes de concorrer com games nas tabelas de maior faturamento.”

A Apple também tem feito um grande esforço em apps para empresas, conhecidos como “enterprise apps”. No ano passado, o chefe da Apple, Tim Cook, anunciou um acordo com a Deloitte para desenvolver apps de negócios no dia a dia.

A crescente importância desse setor foi salientada quando a Cisco comprou a AppDynamics, que melhora o desempenho dos apps, em um negócio de 3,7 bilhões de dólares.

Enquanto a Apple não ganha dinheiro diretamente pelo fato de negócios como Uber, Ladbrokes ou HSBC terem apps em seus telefones, ela quer garantir que sejam integradas às estratégias digitais das empresas, conforme os empregados e os consumidores se tornam cada vez mais móveis.

Horace Dedieu, da Asymco, uma consultoria de tecnologia móvel, estima que as companhias geram cerca de 300 bilhões de dólares de negócios ligados a ter um app no ecossistema da Apple.

Mike Anderson, fundador da consultoria Chelsea Apps Factory, sediada em Londres, cita afirmações de analistas de que o próximo sucesso de mais de 1 bilhão de dólares não será um app ao consumidor no estilo Snapchat, mas algo voltado para o mundo empresarial. “Os primeiros clientes que veríamos diriam: ‘Tenho menos de cinco mil libras e uma ideia de que vou ser o próximo Instagram ou WhatsApp’. Esse é um jogo de acertar e errar. Agora vemos as empresas dizerem que precisam ter esse tipo de experiência digital para ter sucesso como empresa. Conforme mais e mais empresas veem exemplos no mercado, você verá um tsunami de demanda no espaço empresarial. Deixou de ser ‘legal ter’ para ser uma ferramenta crítica para o sucesso.”

Anderson, que tem clientes como KPMG, Network Rail e Standard Life, cita o exemplo da casa de apostas Ladbrokes, que passou de 30% de receitas digitais vindas de produtos móveis para 80%.

Enquanto os consumidores tendem a saber quais apps ligados a empresas eles querem, as editoras de jogos estão cada vez mais preocupadas que o espaço saturado da App Store seja bom para os cofres da Apple, mas dificulte para os desenvolvedores. O número de apps na App Store cresceu um quinto no ano passado, para 2,2 milhões, e a Apple controla quais apps ela quer promover na homepage, o que, segundo Molyneux, pode fazer ou destruir um app.

“O lado negativo é que há um número enorme de apps lançados todos os dias. A questão passa a ser de descoberta: esse é o verdadeiro desafio no momento. É aí que os donos de plataformas realmente têm um poder incrível, a vitrine da loja.”

No início deste mês, a Apple exibiu os músculos ao aumentar os preços na App Store do Reino Unido em quase 25% para compensar a depreciação da libra depois da votação do Brexit. Com tal poder, e com um duopólio efetivo no mercado de apps, há motivo de preocupação sobre controle do mercado?

“Não acho que seja mais preocupante do que o predomínio no mercado de varejo, especialmente de games, que se resume a apenas alguns atores principais, como Walmart e Tesco”, disse Molyneux. “Isto é apenas uma versão digital daquilo. Quando você tem um número limitado de atores como porteiros, sempre pode ser um pouco preocupante.”

 Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

 

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo