Saúde

Perigosa combinação de inação e erros levará o Brasil a crise humanitária, diz estudo

Pesquisa publicada na revista Science destaca vigilância epidemiológica e os impactos da ausência da coordenação nacional contra a Covid

Foto: CARL DE SOUZA/AFP
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Um estudo que analisa o comportamento da propagação da Covid-19 no Brasil, publicado na prestigiosa revista científica Science na quarta-feira 14, alerta que o País precisa tomar medidas de impedir a maior disseminação do vírus pelos estados se quiser evitar uma “crise humanitária” em seu território.

Apesar de já destacar que o País atingiu o patamar, em março de 2021, de possuir 40% das mortes por Covid-19 registrados no mundo inteiro, a situação tem como piorar.

Com a falta de uma coordenação nacional, destacada no estudo como uma “perigosa combinação de inação e erros, incluindo a promoção de cloroquina mesmo sem evidências”, a doença tem o potencial de agravar ainda mais desigualdades regionais e se espalhar com velocidade e mortalidade mais devastadoras.

O objetivo principal da pesquisa era entender, medir e comparar o padrão de disseminação da Covid-19, em termos de casos e mortes, em uma linha de espaço e tempo. O estudo tem a participação de pesquisadores brasileiros que atuam na Universidade Harvard e Universidade da Flórida, nos Estados Unidos, assim como da Universidade de São Paulo, Uninove e Universidade Municipal de São Caetano do Sul.

Era esperado, destacam os pesquisadores, que o SUS pudesse colocar o País em uma boa posição de combate ao coronavírus logo no início da pandemia.

“Com uma coordenação nacional e por meio de uma vasta rede de agentes comunitários de saúde, ações adaptadas às desigualdades locais (como a distribuição de médicos e leitos de hospital) poderiam ter sido implementadas.”

Disparidades estaduais

O primeiro agrupamento significativo de mortes por Covid-19 em um só lugar foi identificado primeiramente na região de Recife (PE), no dia 18 de maio de 2020.

Nesse meio tempo, a capacidade de testagem por meio de RT-PCR ainda era limitada no País. Dessa forma, pelos dados oficiais, outras regiões começaram a demonstrar incidência de morte maior do que a de casos, incluindo os estados do Amazonas, Ceará e Rio de Janeiro.

Pelos contextos locais, é possível entender como houve disparidade na condução das medidas de contenção do vírus e, consequentemente, no impacto traduzido em vidas perdidas.

Os pesquisadores apontam o Rio de Janeiro como um exemplo onde o “caos político comprometeu uma resposta rápida e efetiva”, já que casos de corrupção envolvendo o governador afastado Wilson Witzel  começaram a ser apurados. As três trocas na chefia da Secretaria Estadual de Saúde entre maio e setembro também ilustram o caso. O Rio possui hoje uma das maiores incidências de casos e óbitos a cada 100 mil habitantes do Brasil.

Em contraste, escrevem, “mesmo com o Ceará próximo de um colapso do sistema hospitalar entre abril e maio e com a circulação silenciosa do vírus cerca de um mês antes, o estado ficou em 6º no ranking de circulação de casos, mas foi o antepenúltimo no concentrado de mortes. Isso sugere que mesmo com uma contínua circulação do vírus, ações locais foram bem sucedidas em evitar fatalidades”.

 

“Crise humanitária evitável”

A conclusão dos pesquisadores aponta que “a rápida disseminação de casos e mortes por Covid-19 no Brasil, com padrões distintos entre estados […] demonstra que não há uma única narrativa para explicar a propagação do vírus”.

A desigualdade de acesso a recursos, as diferenças nas densidades e fluxos urbanos entre capitais e centros urbanos regionais em cada estado, o alinhamento político de governadores e o presidente Jair Bolsonaro em discurso e prática e a falha sistêmica de identificar e isolar casos foram aspectos apontados como alguns dos possíveis responsáveis para a crise.

Com o País vivendo o pior momento da pandemia desde o começo de 2021, as recomendações finais são de promover uma “contenção imediata, com coordenação epidemiológica e de vigilância genômica”, além de realizar um “esforço em vacinar a maior quantidade de pessoas no menor tempo possível” para conter a propagação, especialmente, da variante brasileira P.1, já predominante no Brasil.

“Falhar em evitar esse novo round de propagação irá facilitar o isolamento do Brasil como uma ameaça global à saúde pública, e levar a uma crise humanitária completamente evitável”, concluem.

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