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O alerta da Ômicron

Enquanto não enfrentarmos a chaga da desigualdade no acesso às vacinas pelo mundo não haverá segurança sanitária para ninguém

Nova variante causa transtornos na África do Sul após bloqueios de voos anunciados por diferentes países. Foto: Phill Magakoe/AFP
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Uma nova variante do Coronavírus, designada Ômicron, foi descoberta por cientistas sul-africanos. Isso bastou para que a África do Sul e seus vizinhos fossem elevados à condição de párias internacionais, vítimas do isolamento sanitário praticado por diversas nações, com graves consequências econômicas e sociais.

Estudos com anticorpos neutralizantes, os chamados testes de neutralização, que vêm sendo feitos por laboratórios sul-africanos e farmacêuticas que produzem os diferentes imunizantes – com soro de humanos vacinados, não vacinados e de animais –, terão os resultados anunciados ao longo de dezembro. Só então saberemos o quão efetivas são as vacinas disponíveis contra mais esta variante do Coronavírus.

As primeiras análises indicam que a Ômicron tem taxa de transmissibilidade mais alta, mas não produz mais casos graves, internações e óbitos. É possível que sua virulência seja semelhante ou até menor que a de outras variantes. Os sintomas são leves, como dores musculares, cansaço e mal-estar, e duram um ou dois dias. Não se verifica a perda de olfato e paladar nem a diminuição dos níveis de oxigênio.

O estado de alerta gerado pela descoberta da Ômicron merece ser discutido a partir de duas questões. A primeira é a situação sanitária atual na Europa. A baixa cobertura vacinal fez explodir o número de casos em muitos países. A Alemanha, por exemplo, apresenta uma taxa diária de casos novos de 791 por milhão de habitantes, o Reino Unido de 633, a União Europeia de 574 e a França de 440. Para efeito de comparação, o Brasil tem hoje taxa de 43 e o Canadá de 75.

Muitos países europeus, assim como os EUA, logo começaram a vacinar suas populações, mas ainda possuem baixa cobertura vacinal. Há enorme resistência de parte da população em tomar o imunizante. Ainda que com menos casos graves e fatais, concentrados entre os não vacinados, as medidas a serem tomadas são impopulares. Portanto, nada como uma nova cepa para justificar a readoção de medidas suspensas ou forçar a população a se vacinar.

A segunda é mais grave: ela diz respeito ao acesso absurdamente desigual às vacinas. Atualmente, 55% da população mundial recebeu ao menos uma dose de vacina. Enquanto países ricos mantêm estoques imensos, muito superiores às necessidades de utilização, os países de baixa renda vacinaram apenas 5,8% de suas populações com uma dose do imunizante. Enquanto não enfrentarmos a chaga da desigualdade no acesso às vacinas, não haverá segurança sanitária e continuaremos temendo o surgimento de novas variantes. Os países ricos precisarão fazer doações significativas para que se encontre uma solução para a saúde global.

É preciso lembrar que as expectativas em torno do impacto da variante Delta na população brasileira não se confirmaram. Isso se deu em razão do avanço da proteção auferida por diferentes vacinas e, provavelmente, pela exposição de muita gente à variável Gama, fruto da irresponsabilidade do governo Bolsonaro.

É preciso estender o exitoso movimento pelo direito à vacina que fizemos no Brasil para que ganhe escala global e garanta vacina para toda a população mundial. Nosso país teve, e sempre terá, a despeito das posições isolacionistas do atual governo, um peso importante nas discussões sobre saúde global. O Brasil sempre foi protagonista e voz ouvida pelos países ricos, que precisam agir de forma solidária e garantir os recursos necessários para a proteção do planeta. Trata-se de uma medida imprescindível e que não pode ser mais retardada.

Tão importante quanto isso é conter o movimento irresponsável de gestores das três esferas de governo, que agem como se a pandemia tivesse acabado. É preciso retomar atividades cotidianas nas escolas, nas universidades e no trabalho, mas com prudência. É preciso exigir o comprovante vacinal, o uso de máscaras em ambientes internos e externos, hábitos adequados de higiene, distanciamento físico, afastamento imediato dos que apresentarem febre e sintomas respiratórios. É fundamental ainda evitar, a qualquer custo, aglomerações, como em estádios, baladas ou as que se programam irresponsavelmente para as festas de fim de ano e para o Carnaval, com ou sem recursos públicos.

Exigir o comprovante vacinal de quem entra no País é uma medida necessária e soberana. O Brasil não pode ser um paraíso para o turismo de negacionistas. É hora, sobretudo, da “vacina para todos” e de nos lembrarmos de que a Covid-19 ainda está por aí. No caso brasileiro, em respeito às mais de 614 mil vítimas fatais, é o mínimo que devemos fazer. •

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1186 DE CARTACAPITAL, EM 2 DE DEZEMBRO DE 2021.

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