Saúde

Nas favelas, 56% conseguem se manter apenas por mais uma semana, diz pesquisa

Falta água, comida e acesso a suprimentos dentro das favelas. Mesmo assim, 71% são contra Bolsonaro em relação ao fim do isolamento

(Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)
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Uma pesquisa realizada em favelas de todos os estados brasileiros constatou que 56% dos moradores só conseguiriam ter suprimentos para a casa por mais uma semana – depois disso, seria necessário buscar ajuda ou encontrar formas de trabalho. Mesmo assim, 71% dos entrevistados é contra o fim do isolamento, ideia ainda sustentada pelo presidente Jair Bolsonaro, o que mostra que mesmo os mais prejudicados pela pandemia de coronavírus têm consciência sobre a importância do afastamento social.

O levantamento foi realizado pela DataFavela e pelo Instituto Locomotiva entre os dias 04 e 05 de abril, o que significa que, nesta quarta-feira 08, a maioria dos trabalhadores já está com os recursos de alimentação e higiene no fim. Foram realizadas 1.808 entrevistas em 269 favelas, com uma margem de erro de 2 pontos percentuais para mais ou para menos.

Os dados mostram ainda a grande dificuldade de manter o isolamento dentro das comunidades: 8 em cada 10 moradores têm precisado sair das favelas para encontrar alimentos e itens de higiene, o que “acena para um problema de abastecimento nestas regiões, expondo-os ainda mais ao risco do não-isolamento.”, diz a pesquisa.

Para Celso Athayde, coordenador da Central Única de Favelas (CUFA) e um dos fundadores da DataFavela, a pesquisa expõe a necessidade de transferência de renda o quanto antes para as pessoas que moram nessas regiões. “Não há dúvida que a melhor forma de evitar o risco da contaminação é através da distribuição de renda diretamente aos moradores. Ganha o varejo local, ganha os moradores, ganha a saúde de todos”, diz. No Brasil, diz o levantamento, aproximadamente 13,6 milhões de pessoas moram em favelas.

A realidade dessas milhões de pessoas expõe desafios ainda maiores do que os que mundo inteiro encara. A tarefa de lavar as mãos com água e sabão para conter a propagação do vírus, uma das mais básicas, em tese, entre as recomendações do Ministério da Saúde, encontra barreira nos 47% dos lares que estão sem água nas favelas, conforme demonstrou a pesquisa. O sabão é encontrado com mais facilidade (86%), e o álcool gel ainda não está na mão de 58% dos entrevistados.

Bebê toma banho na favela Alba, zona sul de São Paulo (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

Em relação à saúde, apesar da preocupação consigo mesmo e com os filhos, 90% se dizem muito preocupados com os parentes idosos – justamente um grupo de risco na exposição à covid-19.

Para 53% dos entrevistados, a renda familiar “diminuiu muito” devido ao impacto da covid-19 no Brasil e no mundo. O medo de perder o emprego aflige 65% dos trabalhadores. Se pudessem, a maioria sairia para trabalhar (69%), e 8 em cada 10 desempregados afirmaram que também gostariam de estar procurando emprego caso fosse possível.

No entanto, a vontade de adquirir renda não faz com que a maioria dos moradores seja a favor de quebrar o isolamento proposto pelas autoridades sanitárias neste momento, como sugere, enfaticamente, Jair Bolsonaro. Cerca de 71% dos entrevistados responderam que não concordam com as sugestões do presidente de aplicar um isolamento vertical no País – ou seja, manter apenas idosos e pessoas do grupo de risco em casa, enquanto o resto pode sair da quarentena.

Para Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva, esse ponto deixa claro que os mais afetados pelos efeitos econômicos da pandemia têm ciência da importância do isolamento, e que fazer com que eles escolham entre a saúde pessoal e da família e o acesso à renda não é uma argumentação correta por parte dos governantes. “Não me parece justo ou moralmente ético que o governo ou sociedade exijam que estas pessoas tenham que escolher entre a saúde de sua família e a garantia do pão de cada dia”, analisa Meirelles.

Confira a pesquisa completa.

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